Os efeitos políticos de novos protestos de rua em 2014
Quem seria o principal prejudicado pela reedição da catarse de junho, só que em pleno ano eleitoral? Quem governa, claro
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Estamos a menos de um mês do ano eleitoral de 2014 e, até aqui, ainda não houve uma discussão profunda sobre o que pode ocorrer caso os interesses políticos e econômicos que levaram centenas de milhares de pessoas às ruas de todo o país em junho último consigam reeditar, naquele mesmo ano eleitoral, uma catarse que resultou em nada.
E o que é pior – ou melhor, para alguns – é que já existe um mote para levantar um novo movimento de massas análogo ao deste ano: a Copa do Mundo.
Em junho, sob o mote de impedir pequenas altas no preço das passagens de ônibus, metrô e trens de subúrbio – altas literalmente irrisórias, mas que induziram muitos a crer que seriam um castigo insuportável para a população –, conseguiu-se manipular a opinião pública a um ponto tão impressionante que parecia que estava sendo reeditada, por aqui, a “Primavera Árabe” – ou seja, a luta dos povos árabes para se libertarem de ditaduras longevas e cruéis.
Agora imaginemos quanto se pode fazer com uma matéria-prima como a Copa…
De fato, o país está gastando muito com a Copa. Mas é isso o que se tem que fazer para ganhar: há que gastar para, depois, obter o retorno – em turismo, em movimentação da economia e, ainda, deixando, após o evento, toda estrutura edificada para recebê-lo.
Contudo, em um país em que ainda vicejam tantos dramas sociais, em um país no qual falta dinheiro para Saúde, para Educação, para saneamento básico etc., é simples demonizar um evento como o que o país sediará em 2014 – ainda que o grosso dos gastos esteja a cargo do setor privado e que eles sejam precursores de lucro que o país irá auferir por tê-los feito.
Todas as estratégias políticas dos candidatos aos mais diversos cargos no Executivo e no Legislativo estão sendo traçadas sob um quadro de normalidade democrática. Desde a redemocratização do país, jamais tivemos uma eleição em que massas imensas foram às ruas protestar.
Quem seria o principal prejudicado pela reedição da catarse de junho, só que em pleno ano eleitoral? Quem governa, claro. Mas não só. Além de novos protestos poderem se tornar fatais para governadores e para a presidente da República, os candidatos ao Legislativo e seus partidos também serão afetados.
Nesse aspecto, uma carta de leitor publicada na quarta-feira em um dos jornais alinhados com a oposição ao governo Dilma Rousseff (a Folha de São Paulo) repete uma constatação que já se fez nesta página.
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O Datafolha acaba de mostrar que Dilma sobe em todos os cenários e que a oposição encolhe. Chego à triste conclusão que aquelas manifestações de junho aconteceram no ano errado. Deveriam ter eclodido em 2014, às vésperas das eleições, quando o governo não teria tempo hábil para reagir.
Ronaldo Gomes Ferraz (Rio de Janeiro, RJ)
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Alguns argumentarão que governantes de todos os partidos foram afetados pelos protestos de junho, mas não é bem assim. Em primeiro lugar, a perda de popularidade que afetou, por exemplo, Dilma, Geraldo Alckmin e Fernando Haddad – só para ficarmos nos governantes mais importantes do país – atingiu muito mais aos petistas do que ao tucano.
Matéria da Folha de São Paulo sobre pesquisa Datafolha publicada em 1º de julho deste ano mostra que o prejuízo de imagem que os protestos do mês anterior causaram aos partidos da base aliada do governo Dilma e à titular desse governo foi bem maior do que os prejuízos que sofreram políticos da oposição demo-tucana.
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FOLHA DE SÃO PAULO
1º de julho de 2013
Após protestos, aprovação de Dilma, Alckmin e Haddad cai
Presidente perde 27 pontos, Governador perde 14 e prefeito, 16; Cabral e Paes também são afetados
Índice dos que acham gestão paulistana ruim ou péssima sobe de 21% para 40% em três semanas, diz Datafolha
DE SÃO PAULO
Não foi apenas a popularidade da presidente Dilma Rousseff que acabou corroída pela onda de protestos que tomou o país.
O movimento abalou os índices de aprovação dos governadores dos dois maiores Estados do país: Geraldo Alckmin (PSDB), de São Paulo, e Sérgio Cabral (PMDB), do Rio; e ainda dos prefeitos das duas maiores cidades: Fernando Haddad (PT), o titular da capital paulista, e Eduardo Paes (PMDB), da capital fluminense.
Todos os dados são da pesquisa Datafolha finalizada na sexta-feira passada.
A aprovação de Alckmin caiu 14 pontos no intervalo de três semanas –Dilma perdeu 27 pontos no mesmo período. Os 52% de avaliação positiva do tucano em 7 de junho, pouco antes do início dos protestos, foram reduzidos para 38% na pesquisa recente.
Na semana do auge dos protestos, Alckmin foi criticado pelo comportamento da Polícia Militar, que num primeiro momento agiu com violência durante passeatas e depois, diante das críticas, teria reduzido o rigor no combate ao vandalismo.
O Estado também administra tarifas dos trens e do metrô, que também subiram, mas, mediante a pressão das ruas, acabaram tendo o reajuste cancelado.
Abalo ainda maior foi sentido por Haddad, cuja administração tem só seis meses.
Seu índice de aprovação caiu 16 pontos em três semanas, de 34% para 18%. A reprovação do petista (soma dos julgamentos ruim e péssimo) subiu de 21% para 40%.
Haddad se expôs no enfrentamento ao Movimento Passe Livre. No início, disse que não havia margem para negociação. Insistia no argumento de que as passagens de ônibus haviam subido abaixo da inflação. No fim, cedeu.
Na série histórica, a rejeição de Haddad é equivalente às de Jânio Quadros (43%), Marta Suplicy (42%) e Paulo Maluf (41%), quando se trata do mesmo período de gestão.
A aprovação também é parecida com as de outros ex-prefeitos. Em junho de 1986, Jânio tinha 16%. Em 1989, Luiza Erundina marcou os mesmos 16%. Maluf, o prefeito seguinte, fez 20%. Em junho de 2007, Celso Pitta tinha 19%. Quatro anos depois, Marta alcançou 20%. José Serra obteve 30% em julho de 2005.
O único que destoa é Gilberto Kassab, que antecedeu Haddad, com 46%.
Ao longo dos dias de protesto, os paulistanos foram ficando menos críticos com Alckmin e Haddad.
Em 18 de junho, 51% avaliavam o desempenho de Alckmin diante dos protestos como ruim ou péssimo. Esse índice caiu para 39% dia 21 de junho. E voltou a cair na última pesquisa, para 33%.
Com Haddad ocorreu o mesmo, mas em intensidade menor. A má avaliação de seu comportamento era compartilhada por 55%. Caiu para 50%. E depois para 44%.
RIO
Depois de atingir o pico de sua popularidade na série do Datafolha no Estado do Rio, em novembro de 2010, o governador Sérgio Cabral despencou 30 pontos.
No levantamento de sexta-feira, após seis anos e meio de mandato, ele obteve 25% de ótimo e bom, a menor pontuação da série. A soma de ruim e péssimo é maior, 36%.
Cabral foi alvo dos manifestantes, que acamparam na frente de seu apartamento.
A imagem do prefeito do Rio, Eduardo Paes, sai igualmente lesada.
Desde agosto de 2012, seu índice de aprovação caiu de 50% para 30%. A desaprovação fez a trajetória inversa. Subiu de 12% para 33%.
(RICARDO MENDONÇA)
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Note, leitor, que hoje, enquanto Dilma recuperou apenas parte da aprovação, segundo o último Datafolha, Alckmin, que caiu muito menos do que ela durante os protestos, já se refez quase totalmente. E Fernando Haddad nem se recuperou.
O mais interessante é que os protestos de junho foram tonificados pela truculência da polícia militar comandada por Alckmin. Antes de um verdadeiro massacre de manifestantes na avenida Paulista em meados de junho, o Movimento Passe Livre reunira um protesto até considerável, mas restrito quase que só a São Paulo e que não assustava ninguém.
Aquela violência policial fez o movimento se espraiar, levando mais de um milhão de pessoas às ruas de todas as partes do país. O que se poderia esperar, portanto, é que Alckmin e seu partido sofressem mais com aqueles protestos do que os seus adversários, mas foi o contrário. O partido que passou a ser hostilizado nas ruas foi, precipuamente, o PT.
Daí se pode imaginar a quem interessa que, ano que vem, sejam reeditados aqueles movimentos de massa sob a desculpa da Copa do Mundo, mas, obviamente, visando o processo eleitoral.
Quem teve o domínio do fato dos protestos de junho deste ano foram o PSOL e o PSTU sob a batuta de Plínio de Arruda Sampaio (PSOL) e de José Serra (PSDB), sendo que o tucano, após a pesquisa que mostrou a monumental queda de Dilma na pesquisa citada acima, foi levado, em triunfo, ao programa Roda Viva para ser ovacionado por sua jogada “genial” – ou diabólica, como preferirão alguns.
Não é segredo para ninguém que os partidos de oposição que situam-se à esquerda do governo Dilma preferem mil vezes um Aécio Neves ou um José Serra ou um Eduardo Campos no Palácio do Planalto a uma Dilma. Esses partidos dificilmente colherão um benefício pessoal, mas consumarão a vendeta antilulista e antipetista que há anos os move politicamente.
Contudo, tampouco se pode desconsiderar que há, sim, gente boa, idealista e decente tanto no PSOL quanto no PSTU ou em qualquer partido de oposição à esquerda. Assim, para não dizerem que não propus nada, aqui, e para evitar que as eleições sejam alvo de uma trapaça como um movimento eleitoreiro que pode eclodir, indico esse caminho.
Recentemente, fiquei encantado com a postura do deputado Jean Wyllys, do PSOL. Durante o linchamento de José Genoino e de seus companheiros nas redes sociais, de uma forma impressionantemente corajosa ele se opôs ao que estavam fazendo sobretudo seus próprios correligionários. Há, sim, gente séria nesses partidos de esquerda.
Tais partidos, porém, por falta de visão ou por má fé mesmo consideram que não há diferença entre o PT e o PSDB e, assim, tanto faz um quanto o outro no poder. E se conseguirem desencadear novos protestos, um PSOL poderia passar de 3 deputados e um senador no Congresso para, quem sabe, 6 deputados e 2 senadores, se tanto.
O que proponho, pois, é uma aproximação de lideranças petistas com as lideranças lúcidas da oposição à esquerda para convencê-la a parar de fazer o jogo de uma direita que, se retomar o poder, será nefasta também para movimentos sociais que agem em consonância com esses partidos, pois a volta da direita demo-tucana ao poder seria uma catástrofe.
Fica, aqui, o aviso – com antecedência mais do que suficiente: desencadear protestos em 2014 sob desculpa de combater a Copa do Mundo e “gastos” que já terão sido feitos só irá beneficiar a direita. PSOL e PSTU – e os petistas e esquerdistas em geral que apoiaram os protestos de junho – têm que pensar o Brasil acima de suas idiossincrasias.
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