Os cúmplices do genocídio e o avanço da ditadura
"Na prática, todos que se omitiram em 2018 ou apertaram 17 nas urnas são cúmplices da atual tragédia que será lembrada com horror e vergonha pelas gerações futuras", escreve a colunista Carla Teixeira, citando ainda o Congresso, as Forças Armadas, a mídia e outros corresponsáveis
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Por Carla Teixeira
Após doze meses de pandemia, quase 300 mil mortes e o iminente colapso do sistema de saúde em todo o país, qualquer agente público que se recuse a apontar culpados confessa parte da responsabilidade que possui diante da tragédia que vivemos. O caos sanitário agrava a crise econômica e social, anunciando dias violentos. Acuado e com o índice de popularidade em queda, o presidente ameaça a República com golpes e ataca todos os seus críticos e opositores utilizando a Lei de Segurança Nacional - entulho autoritário que nunca fomos capazes de tirar do meio da sala, apesar da Constituição Cidadã de 1988. Cientistas, professores e artistas, de blogueiros a políticos, passando por youtubers e cidadãos comuns, todos que ousaram dizer o óbvio sobre a atuação do governo na condução da pandemia foram perseguidos pelas polícias e outras instituições do Estado transformadas em milícias por Jair Bolsonaro, o genocida.
Desde o início da pandemia, a prática adotada pelo governo foi a de promover a imunidade coletiva por contágio, sob o argumento que a redução da atividade econômica causaria prejuízo maior do que as mortes e sequelas causadas pela peste. Como demonstrou a recente pesquisa realizada pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário da USP em parceria com a Conectas Direitos Humanos, houve uma estratégia de propagação da Covid-19 no Brasil, implementada sob a liderança do presidente da República. Além do papel central exercido por Bolsonaro, diversas instituições, entidades e figuras políticas são coautores do morticínio em curso, senão por ação, por omissão.
As Forças Armadas são as principais sócias do genocídio e mais uma vez fizeram jus à sua atuação histórica que jamais hesitou em matar brasileiros para conservar a desigualdade e manter seus privilégios. Milhares de militares sem qualquer expertise ocupam postos no governo, com destaque para o general do Exército, Eduardo Pazuello, que a frente do Ministério da Saúde conduz, sob a rédea curta do capitão, o espalhamento da doença responsável pelo inédito morticínio que certamente causaria espécie ao patrono e também assassino, Duque de Caxias. A utilização da estrutura das Forças para a compra, produção e distribuição de medicamentos sem eficácia para o tratamento de infecção por Covid-19 se soma aos recentes escândalos de corrupção que revelaram compras superfaturadas de leite condensado, chiclete, vinho, pizza e refrigerante. Isso tudo sem contar o apoio político dado por militares da ativa e da reserva às ameaças de golpe militar diuturnamente esbravejadas pelo néscio apavorado do Alvorada.
O Congresso Nacional também possui participação destacada no atual holocausto. O Centrão vendeu-se por bilhões em emendas parlamentares e selou apoio ao capitão em sua bravata de destruir o país. Muitos ali argumentam que é mais pertinente cuidar do caos sanitário para depois cuidar da confronto político provocado por Bolsonaro, se negando a enxergar que o presidente é uma fonte permanente de desagregação em meio à crise e não haverá como enfrenta-la sem enfrenta-lo. Traídos após a indicação não consumada para o Ministério da Saúde, parlamentares cochicham sobre impeachment como cães que latem sem morder. Em geral, o parlamento segue apoiando o governo nas pautas neoliberais, mantém-se inerte diante da alta dos preços dos alimentos e será responsável por propagar a fome e ampliar as mortes após ter aprovado um valor irrisório para o auxílio emergencial que jamais permitirá às pessoas ficarem em casa e se protegerem do vírus.
Coparticipante, a grande mídia abriu espaço em seus jornais para os comentários negacionistas do presidente da República e sua trupe, oferecendo status de questão de interesse público a temas que geravam desinformação e confusão na população. Em suas narrativas, a mídia corporativa manteve uma aparência de oposição ao governo, mas não se colocou efetivamente a favor do impeachment devido aos interesses dos seus proprietários em torno da agenda neoliberal que o ministro Guedes - em permanente estado psicótico - segue achando e anunciando que irá cumprir. Como o “Centrão”, os grupos da grande mídia são rebentos da ditadura militar e mantém a orientação política que coloca seus interesses pessoais acima de qualquer dever cívico e democrático inerente ao bom jornalismo. Aqui fica o registro de mais uma contribuição desses monopólios midiáticos para o atraso civilizatório e o retrocesso social do país.
O mercado financeiro também é responsável, assim como os latifundiários e muitos grandes empresários bolsonaristas que se recusaram (e se recusam) a seguir as medidas de contenção do vírus. Estes atuaram politicamente para a normalização das atividades econômicas em meio à maior crise sanitária da história do Brasil Independente. Durante a pandemia, lucraram mais de 100 bilhões de reais enquanto crescia o desemprego, a miséria e a fome. Após o agravamento do caos levar à falta de leitos em hospitais de luxo em todo o país, foi lançada a “Carta dos Sensatos”, sentença assinada por centenas de economistas, banqueiros e empresários exigindo medidas do governo no combate à pandemia. Os donos do capital já perceberam a nau sem rumo que embarcaram e parecem não querer estar associados aos desatinos de um governo que mata pessoas (questão secundária para muitos deles), mas principalmente prejudica a economia.
Há muitos outros cúmplices e corresponsáveis pelo holocausto em curso: o Judiciário - utilizado pelos golpistas de 2016 para inviabilizar a participação de Lula nas eleições, pavimentando o caminho para a ascensão do capetão genocida que hoje comanda este inferno de pandemia -, muitas vezes proferiu decisões contrárias às recomendações científicas e permanece inerte diante das seguidas investidas do Executivo contra os outros Poderes e Instituições da República; a Procuradoria Geral da República, que se recusa a abrir ações para apurar o papel desempenhado pelo presidente em todos os evidentes e documentados crimes cometidos na condução da pandemia; o Conselho Federal de Medicina, que apoiou o Ministério da Saúde na divulgação e legitimação de medicamentos sem eficácia contra a Covid-19; os advogados bolsonaristas que formaram milícia digital para perseguir judicialmente os críticos do governo nas redes sociais. Na prática, todos que se omitiram em 2018 ou apertaram 17 nas urnas são cúmplices da atual tragédia que será lembrada com horror e vergonha pelas gerações futuras.
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