Obrigado, Nirlando!

"Perdemos um ser humano da melhor qualidade que deixou grandes textos e grandes exemplos", escreve o jornalista Alex Solnik, referindo-se a morte do jornalista Nirlando Beirão

(Foto: Brasil 247)


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Por Alex Solnik, para o Jornalistas pela Democracia| 

A redação da revista Isto É funcionava, em 1977, numa sala do sexto andar do edifício situado à avenida Paulista no. 2006, em São Paulo, e se compunha, basicamente de uma mesa comprida de madeira de lei em torno da qual se agrupavam umas oito poltronas confortáveis, uma das quais ocupada por Nirlando Beirão. 

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   Eu nunca tinha conhecido ninguém com esse nome e acho que nunca mais vou conhecer. Nem uma pessoa com seu perfil, ao mesmo tempo aristocrático, corintiano, simpático, sensível, bonito, bom caráter e ótimo texto. 

   Nunca fui do seu círculo de amigos íntimos, sabia das histórias dele por amigos comuns, mas passei muitos anos vendo minhas reportagens sendo penteadas por sua caneta mágica que os tornava legíveis. Nunca pude agradecer pessoalmente, por isso aproveito para agradecer agora. 

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   O Nirlando era aquele cara que todo mundo gostaria de ser, querido nas altas rodas sociais, que frequentava com desenvoltura, cobiçado pelas mulheres mais cobiçadas, um talento para escrever que intimidava os colegas, como estou intimidado agora, pensando em como ele pentearia esse texto a respeito dele. 

   A calma era sua maior virtude. Nunca o vi exaltado e olha que participei ao lado dele de centenas de reuniões de pauta comandadas por Mino Carta e o pau comia. Mino soltava os cachorros, muitos de nós ficávamos alvoroçados, menos Nirlando, que conservava a fleugma, um dos vários substantivos que o descrevem: fleugma, allure, classe, elegância, savoir faire, fair play. 

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   Nunca ouvi um comentário desabonador a seu respeito em mais de 40 anos num mundo em que as fofocas correm como chuva na ladeira. Nunca. Nunca passou a perna em alguém, nunca pisou em cima, nunca humilhou. Nunca o vi tratar alguém com desrespeito, mesmo em conversa de botequim. 

   Foi quase sócio de uma revista, mas desistiu na última hora. Sempre foi um trabalhador da imprensa; patrão, nunca. 

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   Me lembro de uma ocasião em que contou sua aflição ao escrever o livro em parceria com a Adriane Galisteu,  ficava inseguro quando ela devolvia os textos todos riscados a caneta, achava que não ia dar certo, que ela ia desistir, até que achou o caminho. Acho que o livro se chamava assim: “No caminho das borboletas”. 

   Um dia, eu soube que ele tinha contraído aquela doença maldita, a mesma do general Villasboas e que não saía mais de casa. 

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   Tempos depois, não sei exatamente quantos, alguém me contou que Mino Carta, com quem conviveu por quase 50 anos, desde o Jornal da Tarde, tinha montado uma redação na casa dele para que ele pudesse continuar escrevendo e editando na "Carta Capital", com sua habitual aguda observação e fina ironia. Ele dava o seu recado, mas não passava do ponto. 

   Mais adiante ainda fiquei sabendo que ele não conseguia mais falar. 

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   Não por acaso seu nome era um gerúndio e o sobrenome, aumentativo. 

   Perdemos um ser humano da melhor qualidade que deixou grandes textos e grandes exemplos.

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   Obrigado, Nirlando.

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