O templo não é dinheiro

Nunca ouvi dizer que se precisasse de um templo suntuoso para a devoção religiosa. Onde se reunirem em nome de Jesus, ele estará junto dos fiéis



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A reforma protestante conduzida por Martinho Lutero ajudou muito, segundo o sociólogo Max Weber, a consolidar e difundir a chamada "ética puritana do trabalho" e assim a dar força ao Capitalismo moderno. A valorização do indivíduo, da subjetividade humana através do livre exame das escrituras, o trabalho cotidiano, a frugalidade, a disciplina, a abstemia, tudo isso contribuiu muito para o advento desse regime econômico conhecido pelo nome de Capitalismo. Hoje surgiu uma variante dessa visão de mundo: o autoemprego e o empreendedorismo: ser patrão de si mesmo, ter o seu próprio negócio. 

Mas a variante mais fértil e fecunda foi aquela de abrir uma pequena igreja, com um círculo restrito de fiéis e, depois, alargando o círculo, com a promessa da prosperidade material do crente, sob as bênçãos de Deus, e o pagamento do dízimo. "Presente de Deus", como dizem os carros importados dos irmãos da Igreja Universal, provavelmente a empresa religiosa mais bem sucedida no mundo e no Brasil. Ocorre que com a pandemia, o STF deu\respeitou a plena autonomia dos estados e municípios para fecharem ou suspenderem aquelas atividades econômicas e sociais julgadas como "não-essenciais", entre elas: os cultos e ofícios religiosos.

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Foi o quanto bastou para que o segmento econômico da atividade religiosa ajuizasse uma ação junto a suprema corte pedindo a abertura das igrejas em meio à pandemia. 0s argumentos jurídicos e sanitários do procurador-chefe da União a favor da abertura dos templos são curiosos: primeiro diz que a fé salva vidas. Segundo, que o Estado é laico, mas os cidadãos são religiosos. Portanto... Ora, se o Estado brasileiro é uma República presidencialista laica e não teocrática, ele tem obrigação de salvar, não é a alma, dos brasileiros, é a VIDA de cada um de nós. Porque sem vida, não há fé nem culto religioso nenhum. Segundo, a fé pode até salvar a alma do crente, mas combater o vírus da pandemia, não vai. Até o chefão da Igreja Universal se vacinou nos Estados Unidos. E os pastores que não se vacinaram ou negaram o risco da doença se contaminaram e alguns morreram. 

Logo, o compromisso do estado brasileiro é com a preservação da vida de cada um neste mundo, não a sobrevivência da alma no outro mundo. Mas há aqui as implicações financeiras ligadas ao "sustento" do pastor e sua família. Afinal, a Igreja é um negócio, tem suas contas para pagar. E a receita sai do bolso dos fiéis, através do pagamento do dízimo. Se os templos da hipocrisia e do farisaísmo fecharem, de onde virão os recursos para financiar a atividade sacro comercial? - A BAND cancelou o show da fé, do bispo R,R. Soares, que - ao vivo - distribuía boletos para os irmãos pagarem pelo banco o seu dízimo. Provavelmente, faltou dinheiro para pagar o aluguel do horário nobre da TV paulistana. 

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Nunca ouvi dizer que se precisasse de um templo suntuoso para a devoção religiosa. Onde se reunirem em nome de Jesus, ele estará junto dos fiéis. Orar não é uma atividade que se faça necessariamente em público, com estardalhaço, como faziam os fariseus nos templos, para dar exemplo de crentes virtuosos. Orar é exorcizar, purificar, expulsar os demônios que atormentam a vida do cristão. É uma atividade individual, sincera e silenciosa através da qual fazemos uma "catarse" dos nossos males, sofrimentos e tristezas. É um exercício terapêutico, liberatório, que purga as emoções e afetos, e nos alivia o peito. 

Só os fariseus vão a um templo ensaiar o drama do arrependimento e do perdão. Sob as bênçãos de um mistificador e falsário, que fala em nome de Deus, que promete riqueza e saúde, a troco de tudo o que o fiel puder entregar. Se Cristo voltasse outra vez - antes do Juízo Final - aplicaria um sova reparadora e exemplar nesses vendilhões da fé, e as pessoas poderia praticar a sua devoção de forma sincera e barata. Mas em vez de Cristo, veio a besta-fera, o Belzebu, o satanás - travestido de Messias, junto dos falsos profetas e fariseus, mandando as pessoas para morte, e justificando a morte pelo princípio da "seleção natural".

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