O perigoso jogo do PDT

"O PDT está diante de um jogo perigoso. Ou decide ser essencial neste momento histórico ou flerta com a deslegitimação e o esquecimento", diz Fernando Horta

Carlos Lupi e Ciro Gomes
Carlos Lupi e Ciro Gomes (Foto: PDT/Divulgação)


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A esta altura do campeonato, 9 em cada 10 analistas vão dizer que a eleição está resolvida. Não que se saiba o vencedor, não é isso. Está resolvida porque é uma disputa entre dois candidatos – apenas – em que nesse momento a disputa é se haverá ou não segundo turno. As pesquisas eleitorais estão praticamente inalteradas há dois anos e o percentual de certeza no voto (pessoas que afirmam não mudar mais o seu voto) chega a quase 80% tanto entre o eleitorado de Lula, quanto no de Bolsonaro. Mesmo as tentativas de ambos os candidatos de romper esta inércia não deram efeito prático.

Pelo lado petista a campanha apostou na exploração do apoio de grandes artistas (como Anitta, Daniela Mercury e etc.) e depois no apoio de “influenciadores digitais” como André Janones e Felipe Neto. Não houve resultado. Do lado bolsonarista, a ruptura da legislação eleitoral com o aumento do “auxílio brasil”, e a manipulação da economia brasileira para apresentar índices menos ruins (e insustentáveis no médio prazo) também não causaram qualquer alteração no cenário eleitoral. 

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Daí que, salvo o imponderável, o que está em jogo, neste momento, é se Lula vence no primeiro turno ou se Bolsonaro passa para o segundo turno. Qualquer alternativa fora dessas duas é devaneio militante e não tem qualquer respaldo analítico sério.

A partir deste cenário, nenhum estrategista político sério pode se pretender pensar a política fora destas linhas. Não acredito que alguém na direção de campanha do PDT (ou mesmo na diretoria política) acredite em ganhar a eleição ou mesmo ir para o segundo turno. Nem mesmo Ciro acredita nisso. Se acreditar devemos pensar no perigo do pensamento mágico na cabeça de um candidato que se pretende presidente da república.

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Trabalhando com fatos o PDT só tem possibilidade de eleição em dois cenários: (1) por um lado, se Bolsonaro (ou Lula) forem abruptamente retirados pela Justiça Eleitoral, invalidando suas chapas. Estamos às portas do 7 de setembro e uma segunda tentativa de golpe por parte de Bolsonaro (a primeira foi no 7 de setembro de 2021) poderia ensejar uma atitude mais dura (e respaldada) por parte da institucionalidade brasileira. A saída de um dos contendentes poderia abrir espaço para Ciro, mas é preciso saber que esta é uma possibilidade remota. Não que Bolsonaro não tenha feito por merecer – inúmeras vezes já – a sua retirada do pleito. O fato é, entretanto, que o custo de se retirar um dos candidatos parece ser insustentável para as instituições.

A outra possibilidade para o PDT (2) no devaneio da vitória de Ciro é uma matemática impossível. Ciro precisaria triplicar o seu total de votos (chegando a algo perto de 27%) e ainda que parte significativa desse total (mais de 7%) vindo de Bolsonaro. Conhecendo a formação ideológica do fascismo, olhando o cenário eleitoral brasileiro nos últimos dois anos e a história de concertação política de Ciro Gomes, é possível afirmar que esta possibilidade é virtualmente impossível. Nem se Ciro Gomes se transformasse num Nelson Mandela da pacificação e do consenso a perda de 7% dos votos de Bolsonaro não se daria.

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Então, afinal, o que quer o PDT?

No jargão da política, o PDT está tentando se “cacifar”. Isso é legítimo e ocorre em todos os níveis da política. Candidatos buscam demonstrar sua força nas urnas (mesmo sem chances de vencer) para poder estabelecer mais poder internamente nos partidos ou para “vender” o seu apoio pelo maior preço possível. É muito comum isso e o melhor exemplo é na política inglesa. Lá dois partidos enormes dominam a maioria dos assentos no legislativo. Trabalhistas e Conservadores disputam o controle do parlamento e a possibilidade de indicação do primeiro-ministro (ou ministra) e nesse processo, muitas vezes, pequenos partidos que conseguiram fazer 10 ou 12 cadeiras acabam tendo um peso gigantesco. O lado que esses partidos nanicos apoiarem formará maioria e, assim, o seu apoio vale muito.

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Não é o caso aqui, para o PDT. Mesmo que Ciro viesse a apoiar Bolsonaro (num eventual segundo turno) as pesquisas mostram que a consolidação de votos em Lula seria suficiente para a vitória. Os votos de Ciro, portanto, não valem tanto assim. Ciro não pode impactar a eleição se não por um momento e através de uma única ação:

Ciro poderia ser a pá de cal no fascismo de Bolsonaro. Basta que ele – ainda no primeiro turno – anunciasse apoio a Lula. A vitória no primeiro turno estaria praticamente certa. Portanto, abre-se uma janela de oportunidade ao PDT nos próximos 15 dias em que suas ações políticas podem valer muito.

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O PDT, porém, tem dois problemas sérios aí. O primeiro dos problemas é que o valor do seu apoio se torna infinitamente menor no segundo turno. Perdendo esta janela de oportunidade, o PDT flerta com a insignificância, pois se as forças de esquerda puderem sozinhas vencer Bolsonaro no segundo turno (como as pesquisas indicam que podem) o apoio do PDT valerá muito pouco. E um partido que vem lutando desde os anos 2000 para se afirmar como uma força nacional poderá ser ferido de morte. Se o PDT fizer por ficar fora da coalizão que se organiza para reconstruir o país nos próximos 4 ou 8 anos, possivelmente nem a história do partido será suficiente para mantê-lo de pé.

O outro problema que o PDT enfrenta é Simone Tebet e o MDB. O crescimento de Tebet (passando 1 para 5%) faz com que o MDB também seja uma alternativa para vitória petista no primeiro turno. Em tese, Lula precisa de algo em 2 e 3% para consolidar sua vitória fora da margem de erro. Tendo 5%, Tebet se cacifa para esta tarefa. Parte substancial do MDB já pressiona Tebet para ir nesse sentido e aí, toda a argumentação acima feita para o PDT pode ser usada para Tebet também. O apoio dela, nesse momento, reveste-se de um valor grande pois pode ser a pá de cal em Bolsonaro.

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E pelos próximos 15 dias, tanto Ciro, quanto Tebet e seus respectivos partidos têm uma decisão a tomar. Quem primeiro fizer aliança com Lula “venderá” sua força política por um valor muito mais alto do que normalmente teria e – ao mesmo tempo – quem não tomar essa decisão caminhará para a insignificância. Lógico que o MDB tem muito mais força que o PDT no Congresso, e o termo “insignificância” para o partido seria tão somente com relação ao executivo. Para o PDT porém, não há um legislativo forte.

Diante desse cenário, Lula e o PT deveriam transformar esse jogo numa espécie de “dilema do prisioneiro”. Como tanto Tebet, quanto Ciro estão diante de uma janela de oportunidade única, Lula deveria pressionar em separado cada um dos partidos e afirmar que o primeiro que oferecer aliança tenha sua decisão recompensada, enquanto o segundo arque com todo o custo do fracasso. Se basta apenas um deles para sacramentar a derrota do fascismo, quem passará para a história como o apoio derradeiro que uniu o Brasil contra o autoritarismo e contra o fascismo genocida de Bolsonaro? Tebet ou Ciro?

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E quem passará para a história como responsável direto pelo prolongamento do processo eleitoral e o aumento da violência (mortes e atentados) e mesmo da chance de um golpe? Tebet ou Ciro?

O PDT está diante de um jogo perigoso. Ou decide ser essencial neste momento histórico ou flerta com a deslegitimação e o esquecimento histórico. Eu sei qual decisão o saudoso Leonel de Moura Brizola tomaria, qual tomará Lupi e Ciro?

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