O panopticum da cidade universitária

Para usar a expressão do filósofo alemão Frederico Nietzsche: os filisteus só cuidam de sua carreira, dos êxitos e sucessos profissionais, do "curriculum Lattes" (o que não morde) e de mais nada. São corporativistas. Preocupam-se acima de tudo em galgar a hierarquia acadêmica, através de pequenos e grandes acordos



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O grupo de amigos, apoiadores, colegas e alunos responsável pelas iniciativas de apoio e solidariedade a minha pessoa, em razão do processo do governador Paulo Henrique Saraiva Câmara, fez uma pequena reunião de balanço sobre a mobilização, dentro e fora da UFPE, que resultou na audiência pública, ampliada, do dia 11 de novembro, no Fórum Joana Bezerra. Como era de se esperar, a avaliação do movimento foi muito positiva, transformando um simples pedido de interpelação judicial num fato político amplamente divulgado nas redes sociais e na imprensa.

Foi quase um consenso o reconhecimento de que o "flashmob", convocado pelo # "SOMOSTODOSZAIDAN", teve uma influência decisiva sobre o comportamento dos atores, na realização da audiência e seus resultados, a ponto de levar o Juiz, Francisco Galindo, a se dirigir à audiência pública explicando passo-a-passo o que se passava no recinto. As imagens dessa bonita mobilização foram postadas nas redes sociais e estão disponíveis para serem vistas, bem como vídeos sobre a fala do magistrado e outros participantes.

O principal ponto de discussão foi o silêncio e a omissão dos dirigentes da UFPE, apesar dos pedidos da comissão que foi a Reitoria da UFPE (existe imagens dessa comissão e de depoimentos de seus integrantes) solicitar um posicionamento da instituição em relação à defesa da liberdade de expressão. A despeito das promessas e da encenação, nenhum pronunciamento foi feito ou publicizado pelos responsáveis pela administração universitária. Idêntico silêncio foi o adotado pelo sindicato dos docentes (ADUFEPE), pela diretoria do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) e pelo meu departamento.

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Essa triste constatação me levou a crer que os métodos empregados pelo reitor e seus colaboradores (e serventuários) na última eleição – o clientelismo, o fisiologismo, o troca-a-troca de cargos, núcleos de pesquisas, nomeações por voto, terminaria por minar moralmente a comunidade acadêmica, quando fosse necessário obter dela uma manifestação pública contra o arbítrio e a violência cometida contra os cidadãos e cidadãos.

Mas o que esperar de professores, coordenadores, diretores e pró-reitores sempre dispostos a apoiar a entrada da polícia (federal e militar) no Campus Universitário, para perseguir os alunos ou a privatização da gestão universitária? – Para usar a expressão do filósofo alemão Frederico Nietzsche: os filisteus só cuidam de sua carreira, dos êxitos e sucessos profissionais, do "curriculum Lattes" (o que não morde) e de mais nada. São corporativistas. Preocupam-se acima de tudo em galgar a hierarquia acadêmica, através de pequenos e grandes acordos.

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O resto pode vir abaixo. Estudantes se jogam do alto dos institutos, o lixo se acumula na porta dos centros, alunos são perseguidos por professores, outros são assaltados e estuprados, e o reitor só se preocupa com a instalação de câmaras, com a presença da polícia, com a criminalização do movimento estudantil, de passar a perna na Comissão de Direitos Humanos, da UFPE, em nomear os amigos e aliados para cargos de direção e de órgãos suplementares da UFPE e em exigir fidelidade absoluta ao Chefe de seus auxiliares imediatos.

O que esperar desses dirigentes? – Naturalmente essa comunidade está minada do ponto de vista moral e político.  Aos amigos, tudo. Aos adversários, "as adversidades federais de Pernambuco" (título de livro recente sobre a carreira acadêmica na UFPE). Os amigos e apoiadores do nosso movimento, entre eles a querida amiga e ex-aluna Liana Lins, me perguntaram se gostaria de estar presente na reunião da reitoria, que trataria do caso. – Eu respondi com sinceridade, que não.

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Não tenho disposição para ver uma ex-pró-reitora (hoje convertida em oficial de gabinete do reitor) e o próprio gestor, depois de tudo quanto sofri na mão dessas pessoas. Seria uma humilhação. O mesma questão se colocou em relação à ADUFEPE: por que não pedir ao atual diretor da Associação dos Docentes que fizesse sua obrigação de proteger a liberdade de opinião de um de seus associados? – Não. Eu não iria lembrar ao reitor ou ao diretor da ADUFEPE quais eram suas obrigações, no exercício de seus mandatos. Se iriam usá-los patrimonialisticamente para se vingar das críticas dirigidas a um e a outro, problema deles. Estavam comprometendo o cargo e a instituição.

Se fosse um estudioso e entusiasta das reflexões de Michel Foucault, diria que se montou no Engenho do Meio uma espécie de "panopticum", com os olhos do poder espalhados no campus universitário. E que os professores tornaram "cidadãos disciplinarizados", introjetaram a autoridade do "big brother". São como os operários de "Tempos Modernos" ou de "Metropolis", seres destituídos de autonomia, senso crítico e interesse público. Pessoas capazes de assinarem pedidos de criminalização de seus alunos e invasão policial ao Campus, mas incapazes de levantar o dedo para a defesa das liberdades públicas.

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