O novo ciclo do Brasil é a sua Juventude!

Apenas recentemente o Brasil passou a reconhecer a condição juvenil – e a superação de desafios relacionados a ela – como objeto de políticas públicas



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Para a Organização das Nações Unidas, 12 de agosto é o Dia Internacional da Juventude; no Brasil, são jovens – para efeito das políticas públicas – os cidadãos entre 15 e 29 anos. Cerca de 51 milhões de brasileiros. Nesse segmento, vamos verificar o agravamento de alguns dos mais importantes indicadores de desigualdade social, o que, por si, justifica uma atenção especial do Estado a essa faixa etária. Apenas recentemente, no entanto, o Brasil passou a reconhecer a condição juvenil – e a superação de desafios relacionados a ela – como objeto de políticas públicas. Esse reconhecimento se dá na primeira metade da década passada, com a constituição, em 2003, da primeira Comissão Especial no âmbito da Câmara dos Deputados para discutir o assunto e, posteriormente, em 2005, com a criação da Secretaria Nacional e do Conselho Nacional de Juventude. Antes, a temática existia apenas em experiências pontuais e isoladas em prefeituras. No entanto, após quase uma década de instaurada a Política Nacional de Juventude, pode-se afirmar que o reconhecimento formal não foi capaz de gerar um conjunto de políticas concebidas a partir do "lugar" juventude. Em nenhuma outra área, talvez, seja tão comum confundir-se a orientação conservadora com a visão progressista, no mais das vezes, tomando-se uma em lugar da outra. Lamentavelmente.

Para melhor assimilar uma visão que considero mais avançada sobre o tema – e respeitando o direito de cada um a discordar parcial ou totalmente do conteúdo que apresento –, sugiro gentilmente ao leitor duas preliminares: uma, desapegar-se do chavão tornado paradigma do falso liberalismo brasileiro de que "não se deve dar o peixe, mas ensinar a pescar" e, a outra, que tente se lembrar do que queria ter sido e não pôde ser por falta de oportunidades ou outras vicissitudes. Sobretudo, para o diálogo que proponho, é preciso reconhecer a considerável distância de significado que há entre os verbos "ser" e "ter" e que, quando o objetivo é constituir e instituir políticas públicas que visam o desenvolvimento humano em uma sociedade, é imperativo não confundir o significado de ambos e deixar claro que, numa gradação de valores, o "ser" é superior ao "ter".

Do que quero falar é: por que o Estado brasileiro deveria financiar diretamente, e por meios diversos, as trajetórias de vida de seus jovens com o objetivo de emancipar a toda uma geração; como poderia fazê-lo; o que ganharíamos com isso e o que deixamos de ganhar por não fazê-lo. Acredito que ainda há tempo para melhor aproveitar uma janela histórica de oportunidades chamada "bônus demográfico" instituindo políticas criativas de apoio aos jovens brasileiros e que deem suporte às suas trajetórias de vida. O bônus é resultante de uma mudança radical na estrutura demográfica do país; historicamente, sempre tivemos uma proporção desfavorável entre a quantidade de pessoas que necessitam sacar da renda nacional, sem necessariamente poder contribuir para o aumento dela, e o que os economistas chamam "população em idade ativa", ou seja, pessoas em idade de contribuir com o aumento da renda nacional. Essa situação vive um processo de inversão. Nunca tivemos tantos jovens na composição demográfica do país – e nunca mais teremos, em tese –, o que projeta uma proporção inédita para a População em Idade Ativa (71% do total em 2022). A partir de agora nossa população começa a envelhecer, na média, pelo aumento da expectativa de vida aliado a baixas taxas de fecundidade. É hora, portanto, de fazer maciços investimentos nos jovens que signifiquem a aposta em uma geração de brasileiros.

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É certo que os avanços da última década alcançam os jovens em sua maioria; são eles, afinal, os maiores beneficiários da expansão do ensino técnico e do ensino superior e, também, da situação de pleno emprego. O modelo dos institutos federais fez a qualificação para o mercado de trabalho chegar, por meio do Pronatec, a ambientes e rincões antes impensados. E é claro que o PROUNI, o ENEM e a ampliação das vagas e criação de novas universidades federais alterou completamente a perspectiva sombria que os jovens projetavam para a própria vida nos anos 90. Não obstante, a condição juvenil no Brasil ainda está relacionada a riscos sociais, e espera-se a interrupção por causas externas de cerca de 50 mil trajetórias de vida ao longo de um ano. Reconhecendo os enormes avanços e suas incidências na vida de todos os brasileiros e, portanto, dos jovens, é preciso, porém, reconhecer que a esse ator dedicamos pouco, até aqui, de imaginação, inventividade e prioridade política.

As demandas relacionadas à condição juvenil são múltiplas e os governos tem buscado corresponder a elas com políticas clássicas, em sua maioria necessárias, associadas à educação formal e à formação profissional ou qualificação para o mercado de trabalho; no âmbito da segurança pública avançou-se muito pouco em experiências pontuais, mas a marca ainda é a contenção repressiva de um suposto "potencial de violência" do jovem; no âmbito da participação social e do diálogo institucional temos quase nada a apresentar além da criação de estruturas formais como os conselhos de juventude, em nível nacional ou local.

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Para além das conferências (duas nacionais) e outros espaços formais, o Estado brasileiro jamais mobilizou os seus jovens de forma democrática ou positiva; esse ator social jamais foi reconhecido em sua integralidade. Isso porque as políticas públicas escolhem uma dentre as dimensões possíveis da condição juvenil e pouco ou nada dessas políticas é executado de maneira integrada e sob a coordenação da própria temática; nesse contexto, o jovem é estudante, ou é um indivíduo em busca de inserção no mercado de trabalho, ou é um cidadão em conflito com a lei, ou é um cidadão excluído social e economicamente e carente de políticas sociais. Acaba sendo uma espécie de "não-adulto", mas nunca é o jovem simplesmente – ou mais complexamente, como queira. Acontece que, sem compreender esse ator em sua integralidade, vamos continuar elaborando ofertas de política pública que não dizem respeito à ele, mas à expectativa que é depositada sobre ele.

No mais das vezes, reconhece-se conceitualmente a diversidade das juventudes para negá-la na vida real das ações finalísticas dos governos, relegando a temática a políticas que buscam padronizar e galvanizar um paradigma do "bom" jovem – trabalhador e consciente de suas responsabilidades. E isso é conservador. Não que o jovem não deva ter responsabilidades, não que ele não possa trabalhar – muitos o querem, inclusive –, mas o papel do Estado na integração das novas gerações deveria ser mais do que lembrar isso a ele. Basicamente, deveria ser o de garantir a todos o direito de viver plenamente sua juventude, com experimentações e escolhas, sem que a vivência plena da condição juvenil significasse riscos sociais de qualquer espécie. Estender a todos os jovens o direito de ser jovem deveria ser a missão da temática de juventude no âmbito dos poderes públicos.

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Mas, a dificuldade permanente em lidar com as políticas de juventude no âmbito dos governos tem sido a hegemonia de uma visão conservadora sobre elas, com um agravante: o conservadorismo nesse tema, como já mencionado, não corresponde necessariamente a posições ideológicas à direita ou à esquerda. É comum – e hegemônico no campo da esquerda – o discurso salvacionista no combate ao uso de drogas, por exemplo, ou a concepção de políticas que ampliam a tutela do Estado e da família sobre os jovens, na contramão da aposta no fomento à construção de autonomia e consciência crítica. Por outro lado, a carga de expectativas e responsabilidades depositadas na escola é imensa e crescente, na mesma medida em que ofertamos uma escola cada vez mais castradora e distante da realidade do jovem. Não sendo o bastante, o senso comum do "novo" discurso para a educação no Brasil é a universalização das chamadas escolas em tempo integral; no mais das vezes esse discurso, sendo de fácil entendimento e aceitação, apresenta uma perspectiva assustadora de sociedade em que todos os cidadãos – sobretudo os pobres, presumo – terão, a partir dos cerca de 4 anos de idade, uma jornada diária de dez horas a cumprir em algum estabelecimento educacional que o irá preparar para cumprir, com efeito, a jornada diária no mercado de trabalho até o dia de sua aposentadoria. O que pode ser mais conservador?

Pôr o jovem o dia todo na escola para "tirá-lo das ruas" é uma solução que preza mais a forma que o conteúdo, o inverso da concepção, por exemplo, de "cidade educadora" onde a rua nada mais é que a ligação entre espaços públicos que se integram na missão de garantir a inclusão social, cultural, econômica e política de todos. Da mesma forma, ainda, o discurso conservador se apropria de manifestações – a cultura Hip Hop, os esportes e algumas formas de engajamento social – da juventude e as reduz, também, a "tábuas de salvação".

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O que podemos fazer para oferecer aos jovens políticas públicas avançadas, então? Em primeiro lugar, escolher uma visão de mundo para determinar suas metas e desafios; depois, calibrar a visão de governos sobre esse ator social. Se a definição do que é ser jovem comporta muitas e múltiplas possibilidades, o interesse da ação governamental deve definir-se pela que seja mais importante e mais abrangente dentre elas; em minha opinião, no contexto atual e diante dos desafios que apontam os indicadores sociais, a busca da autonomia deve ser a escolha, dentre as características da condição juvenil no Brasil, para determinar o escopo das ações de política pública para os jovens. A partir disso, a égide sob a qual essas políticas se constituem seriam, então, a da emancipação, distinguindo-se, por isso, da política estatal para crianças e adolescentes, por exemplo, que deve se pautar muito mais pela tutela protetiva.

E o que se pode ofertar aos jovens a partir dessa visão de políticas públicas? A boa literatura sobre o tema no Brasil propõe um modelo que combine ações de articulação entre áreas e esferas de governo com novas ações finalísticas; e dentre as ações finalísticas, os "centros de referência da juventude" tem buscado se firmar, sem tanto sucesso até aqui, como unidades básicas de atendimento aos jovens nos territórios. Será essencial o reconhecimento desses equipamentos para o avanço das políticas de juventude no Brasil. Não se faz política de saúde sem UPAs e sem hospitais, como não se faz política de educação sem estabelecimentos de ensino; por que achamos que se pode estruturar uma oferta ampla de política pública a um segmento de 51 milhões de brasileiros sem referência no território, sem uma unidade básica de atendimento? Impossível, arrisco, deixando claro, espero, que o papel da escola não é o de ser a unidade básica das políticas públicas de juventude, mas sim de educação – uma das dimensões de interesse dos jovens.

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Por meio dos Centros de Referência, portanto, enquanto unidade básica, se pode ofertar um escopo diversificado de ações com interesse nos jovens, mas, sobretudo, se pode garantir aquela que é dimensão fundamental nessa temática: a participação ativa dos beneficiários da política. O Governo Federal poderia promover um programa de financiamento da implantação dessas unidades pelo país, inclusive ofertando modelos com características distintas; parte dessa rede, poderia constituir albergues públicos para a juventude, por exemplo, proporcionando a possibilidade de se estabelecer programas de intercâmbio cultural dentro de um país de dimensões espaciais e culturais tão extensas; um sistema de financiamento estável para a política de juventude garantiria, então, por meio da rede de Centros de Referência, programas de renda associados à elevação do rendimento escolar e permanência na escola, associativismo e empreendedorismo juvenil e convivência para o fortalecimento dos vínculos sociais entre os jovens e entre eles e as suas comunidades.

Já sonhei com uma política de juventude que constituísse "aldeias juvenis" em todo o território nacional; os Centros de Referência da Juventude seriam as "ocaras" – o espaço público de convivência – dessas "aldeias"; uma concepção de política pública que tenha como meta a elevação da qualidade da coesão social entre os jovens brasileiros. E aí chego, enfim, ao que chamo de "financiamento direto" das trajetórias juvenis. Programas que garantissem que do bloqueio de renda não derivassem outros bloqueios às trajetórias de vida, como o da mobilidade ou do acesso à educação e ao espaço público, por exemplo. Sobretudo que não permitissem a derivação para o bloqueio representado pela violência estrutural que aniquila cerca de 50 mil dessas trajetórias em um ano. Diz-se, com razão, que a origem do fenômeno da violência contra os jovens no Brasil não está apenas relacionada à questão da renda, mas ela é um fator de desigualdade que denota a ausência de oportunidades de emancipação para uma parcela significativa destes jovens.

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Já trabalhamos, no combate à miséria e à pobreza extrema, com a concepção de financiamento direto das trajetórias de vida no sentido da emancipação; é a essência dos programas de transferência de renda condicionada à manutenção do ensino formal e da saúde, por exemplo. No DF propusemos, e aprovamos em lei (Lei 5.142/2013), um modelo de atenção estatal aos jovens que inclui os Centros de Juventude como unidade de referência e o Programa Renda Jovem de Cidadania, que consistirá, se implantado, na articulação entre um benefício em pecúnia – pago diretamente aos jovens de baixa renda – condicionado à permanência na escola e avanço no rendimento escolar e combinado a ações de qualificação, convivência e fortalecimento de vínculos sociais.

Muito mais se pode desenvolver e fazer a partir dessa concepção de política para a juventude; e aí, remeto à segunda preliminar que pedi ao leitor que considerasse: o que quis ser e não pôde, quais sonhos não conseguiu realizar por falta de oportunidades ou outras vicissitudes? Na vida de milhões de jovens brasileiros, hoje, os bloqueios de renda, mobilidade e todos aqueles relacionados à desigualdade são as vicissitudes que frustrarão as trajetórias de vida; desfazer hoje esses bloqueios fará de nós, sem sombra de dúvidas, uma sociedade muito mais avançada no futuro. O novo ciclo de desenvolvimento do Brasil é a sua Juventude!

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