O Nordeste do Bolsonaro é o do anti-Lula, da miséria e da sede
Bolsonaro intenta trazer este mundo traumático para o nordestino. A região é resistente. Enfrenta seca, venceu a fome (que trazem de volta), vai para a luta... O sertanejo é, antes de tudo um forte, já disse Euclides de Cunha. E, nesta resistência, não aceitará assim tão facilmente a mediocridade e o subjugo
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De domingo para cá, o Nordeste se tornou destaque na mídia conservadora. Não foi estimulada pelas notícias de um passado recente, em que a região crescia a índices chineses e a esperança brilhava no rosto do nordestino que carregava sonhos dos mais diversos. Não foi estimulada por notícias de uma região -- antes subjugada por coronéis e presidentes que simplesmente viravam as costas -- que saía do mapa da fome, via filho de agricultor se tornar doutor. Não é do mundo do Lula que eles estavam falando. Era do mundo anti-Lula com Bolsonaro, de um retorno há 50 anos.
O Globo trouxe a seguinte manchete em seu site: "Para ganhar terreno no Nordeste, generais querem que Bolsonaro turbine caminhões-pipa". Na edição impressa do domingo (18), sugere um "pacote de investimentos no reduto lulista", acenando principalmente para a manutenção do Bolsa Família. E esta questão foi abordada pelo jornalista Merval Pereira em sua coluna intitulada "Pr0jeto Nordeste", dois dias depois. A princípio, dá para perceber que eles não olham para o Nordeste como quem morre de amores ou acreditam no seu potencial. Parecem que sentem pena destes "coitados".
Bem, vamos começar pelas matérias de O Globo. "Turbinar caminhões-pipa" lembra muito o que o Bolsonaro afirmou sobre trazer o Brasil de 50 anos de volta. Quem mora no Nordeste, sabe que um dos seus maiores problemas é a seca -- sobretudo na região do semi-árido --, sempre levada com pouco caso e como valorizada moeda eleitoral pelos políticos.
Carro-pipa dá uma falsa sensação de problema resolvido. No outro dia vai precisar de outro carro-pipa. E assim o político vai construindo seu capital eleitoral às custas das pessoas sedentas. Os coronéis do Nordeste foram forjados assim, desde as capitanias hereditárias. Lula e Dilma quebraram o ciclo, com o programa de cisternas e a transposição do rio São Francisco, uma obra que, embora adiantada, o golpe paralisou fortemente.
"Turbinar carros-pipa" expõe como os generais veem o Nordeste e da altura de qual patamar. Subestimam a inteligência do nordestino ao achar que só quer comida e bebida. Não, não. Quer diversão, arte e vida digna, parafraseando os Titãs. Não sentem saudades das chamadas frentes de Emergência de décadas (os nordestinos recebiam cestas básicas para trabalhos braçais à beira das rodovias esburacadas), dos carro-pipas salvadores que surgem como oásis proporcionado por políticos bondosos e sorridentes. Essa é a visão do inferno deste governo que está por vir.
Na mesma esteira, vale citar a forma simplista, enviesada e estereotipada de como Merval Pereira vê o Nordeste. Embrulha o estômago ao tratar a região como se a única relação de Lula com o Nordeste se devesse ao Bolsa Família e não ao retorno da dignidade em todos os âmbitos. Há algo de muito digno também no Bolsa Família, encarada como assistencialismo político por Merval, que come todo dia, a quem tem dificuldade de entender que se trata de um direito humano básico, independente da pensamento capitalista mais atroz: o de se alimentar.
Comer é um direito humano. Para os reacionários, é uma dádiva do capitalismo que só premia com comida aquele que trabalha. Ou seja, se não tiver no sistema, tem de morrer de fome mesmo. Entrar neste sistema perverso não é uma questão de escolha. E se não é por escolha, que se mude esta situação. Riqueza e pobreza não são algo dado.
Há 50 anos, para onde Bolsonaro almeja nos levar, era comum testemunharmos famílias de famintos batendo as portas e um noticiário que relatava constantemente a fome no Nordeste, sem que ninguém tomasse uma providência. A fome chegou a ser uma indústria rentável para grupos políticos oligárquicos que ainda hoje rastejam.
Estes grupos lutaram e seguem lutando incansavelmente contra governos progressistas e contra programas que distribuem renda e contribuem para que esta máquina sórdida que se alimenta da miséria que só engordou a elite, volte a funcionar.
Portanto, o "reduto lulista" que Merval e o Globo delimitam, tem Bolsa Família, é verdade. Saíram do mapa da fome, o que é maravilhoso. E, com isso, os nordestinos também tiveram a oportunidade de comprar sua casa, chegar ao nível superior, ter direito ao trabalho e dar um basta na diáspora tão comum para o Sudeste do país em busca de dias melhores.
Isso me fez recordar da criação da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), em 2008, pelo então presidente Lula, em Mossoró (RN). Na época, a brigada de opositores e áulicos ligados à direita oligárquica que comandava o RN desinformava as pessoas ao dizer que Lula vinha inaugurar um muro e não uma universidade.
Era evidente que faltou uma visão de dois dedos à frente do nariz para perceber que naquele momento, uma antiga escola com dois cursos superiores, passariam, de cara, para mais de 20, além de mestrado e doutorado. A quantidade dos poucos e privilegiados alunos que tinham acesso á antiga Escola Superior de Agricultura de Mossoró (ESAM), hoje não representam nem a metade dos docentes. É só um exemplo pequeno para alguns, mas gigantesco para quem mora no Nordeste. Um avanço incrível que Merval dentro de uma sala refrigerada jamais perceberia.
Bolsonaro intenta trazer este mundo traumático para o nordestino. A região é resistente. Enfrenta seca, venceu a fome (que trazem de volta), vai para a luta... O sertanejo é, antes de tudo um forte, já disse Euclides de Cunha. E, nesta resistência, não aceitará assim tão facilmente a mediocridade e o subjugo.
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