O neoliberalismo e a privatização dos direitos

Companhias interessadas na privatização dos serviços de água, saneamento e higiene têm foco no lucro e não no ‘direito social’ ao acesso à água e ao saneamento

(Foto: Sabesp)


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 “O acesso à água é um direito vital para a dignidade de todos os seres humanos”  (Audrey Azoulay)

Na qualidade de membro de conselho de administração da SANASA S.A., nos últimos seis anos, aprendi muita coisa; a convivência com os servidores da companhia renovou a minha fé nas estruturas públicas e seus agentes, pois conheci trabalhadores com enorme consciência da sua missão e com enorme comprometimento. 

Por isso, quando o governador Tarcísio de Freitas, ainda candidato, retomou o tema da privatização da SABESP, na contramão do que ocorre no mundo, fiquei preocupado, mostrando desconhecimento de que estudos de ‘custo–benefício’ demonstraram que os serviços de água, saneamento e higiene (Water, Sanitation and Hygiene – WASH, na sigla em inglês) fornecem bons retornos sociais e econômicos quando comparados a seus custos.

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Ademais, as companhias interessadas na privatização dos serviços de água, saneamento e higiene têm foco no lucro e não no ‘direito social’ ao acesso à água e ao saneamento, que é reconhecido internacionalmente como um ‘direito humano’ e esses não podem ser privatizados, ainda mais quando mais de 2 bilhões de pessoas não dispõem dos serviços mais básicos.

E não é só. No mundo todo os serviços de água e afastamento de esgoto sem o controle do Estado foi um retumbante fracasso. De acordo com o Transnational Institute – TNI - organismo internacional de pesquisa e financiamento que há mais de 40 anos atua ao lado de movimentos sociais, sindicais e acadêmicos -, há em todo o mundo 835 casos de retomada do controle sobre serviços públicos por governos locais, dos quais 267 na gestão da água. No período de 2000 a 2017 – com número de “reestatização” a remunicipalização dos serviços de saneamento ocorreu sobretudo na França, onde há 106 casos. 

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O TNI destaca ainda que a visão municipalista, cada vez mais forte em todo o mundo, proporciona janela de oportunidades para cidadãos e os trabalhadores recuperar o controle democrático corroído pela lógica das privatizações ao longo das últimas décadas na Europa. Não precisamos passar por isso.

A ONU aprovou uma resolução que reconhece “o direito à água potável segura e limpa e ao saneamento como um direito humano” e, em 2015, o direito humano ao saneamento foi reconhecido de forma explícita como um direito distinto.

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Esses direitos obrigam os estados a agirem rumo à obtenção do acesso universal à água e ao saneamento para todos, sem discriminação, ao mesmo tempo em que devem dar prioridade às pessoas mais necessitadas.

Os governos não podem, portanto, transformar um direito humano em mercadoria, sob nenhum argumento. Mas não é fácil defender os direitos sociais e humanos, pois, a ideologia neoliberal é hábil na instrumentalização da linguagem, o que faz para esconder o que é: ideologia do capitalismo. 

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E o Brasil foi apropriado em 2016 pela ideologia neoliberal – a mesma ideologia derrotada na constituinte de 1986 a 1988 e nas eleições de 2002, 2006, 2010, 2014, assistimos o aumento do espaço para o privado e a diminuição da esfera pública. 

E, apesar da vitória de Lula em 2022, há muito a ser realizado para recolocar-se a locomotiva nos trilhos. 

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Sendo assim, existe uma ideia colocada na cabeça dos brasileiros, que direitos sociais são concessões ou dádivas, quando, na verdade, são conquistas civilizatórias. Contudo, com o aumento da participação do privado, os direitos sociais estão sendo ‘vendidos’. Estamos vivendo e testemunhando a privatização dos direitos sociais.

Por essas e outras, não podemos nos cansar de falar em ‘sociedade democrática’, pois, ‘democracia’ é conceito que pressupõe legitimidade de conflitos e soberania política aos cidadãos; é atividade criadora dos cidadãos e aparece em sua essência quando existe igualdade, liberdade e fraterna participação.

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Se a sociedade brasileira foi constituída pelo pensamento do colonizado, aquele que pensamento de que ‘uns mandam e outros obedecem’, é chegado o momento de ruptura e superação desse pensamento, pois, somos mais que um povo cordato, pacífico, trabalhador, somos um povo forjado na violência, na opressão e no servilismo.  

Tento usar esse espaço para mostrar a urgência de uma luta por sermos livre da lógica do servilismo, que tudo escraviza e tudo destrói. 

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Os direitos sociais não são “serviços” do Estado, que podem ser vendidos e comprados; o Estado não é uma “empresa” dirigida por um “gestor” asséptico e imune a ideologia; os Direitos Socais são o coração da democracia.

Quando educação, a saúde, o trabalho, o saneamento, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, deixarem de ser direitos sociais, como querem os militantes da ideologia neoliberal, viveremos a barbárie. 

 Essas são as reflexões.

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