O Governo e a gestão pública chinesa

Grandes empreendimentos como a ponte Hong Kong - Shenzhen - Macau e a usina hidrelétrica de Três Gargantas permitem, sim, a ocorrência de desastres não previstos no sistema de segurança do Governo chinês. Para esse tipo de emergência, a China conta com planos que envolvem seus bancos e fundos de investimentos



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Lidar com desastres naturais e calamidades públicas é uma tarefa das mais difíceis para todo país, sobretudo aqueles em desenvolvimento, que baseiam suas economias na forte extração de recursos naturais e, por isso mesmo, afiguram-se mais sujeitos a todo tipo de desastre, acidental ou por negligência humana. No caso do Brasil, a história recente dos desastres de Mariana, em 2015, e Brumadinho, em 2019, em que duas barragens de rejeitos de minérios cederam, matando centenas de pessoas e destruindo o Rio Doce, no leste do estado de Minas Gerais, deixa latente a necessidade urgente de se estabelecer uma política de prevenção e segurança para a exploração de minérios. Na China, que também sofre com este tipo de problema, uma complexa rede de coordenação de órgãos e fundos públicos permite o enfrentamento a grandes tragédias, principalmente aquelas causadas por desastres naturais. Da mesma forma, torna possível o cumprimento de metas e desafios para o desenvolvimento do país, envolvendo a confluência de todos os setores públicos na atenção aos interesses estratégicos nacionais.

É necessário, primeiro, ressaltar que fatos como o ocorrido em janeiro, em Brumadinho, não são tão incidentes no país asiático, visto a imensa rede de empresas do ramo de construção civil e extração de riquezas minerais chinesas envolver, em sua maioria, empresas estatais e de capital misto amplamente supervisionadas pelo Governo. Ainda assim, no entanto, grandes empreendimentos como a ponte Hong Kong - Shenzhen - Macau e a usina hidrelétrica de Três Gargantas permitem, sim, a ocorrência de desastres não previstos no sistema de segurança do Governo chinês. Para esse tipo de emergência, a China conta com planos que envolvem seus bancos e fundos de investimentos para uso do capital em mãos do estado para atender à população quando necessário.

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Toda a estratégia de manejo de recursos estatais e fundos público-privados para atendimento às necessidades da população em situações de emergência é resultado das políticas estabelecidas em 2013, no XIX Congresso do Partido Comunista Chinês, o qual aperfeiçoou o vínculo entre as instituições do Estado e os planos de atenção emergenciais à população chinesa. Recentes fatos como as inundações em Hubei, no final de junho, e em Guangdong, em julho, hoje são solucionados por meio da coordenação de teorias, rotas e diretrizes, para elaboração e execução da Constituição e as leis, utilizando todas as ferramentas disponíveis em mãos do Estado para atender a necessidades das camadas populares. Isso resulta na aplicação efetiva não só de órgãos diretamente subordinados à autoridade presidencial, como as Forças Armadas, mas igualmente aos mais diversos recursos humanos e financeiros direta ou indiretamente ligados ao Governo, como fundos e capitais de empresas com participação estatal.

Daí advém a capacidade da China em mobilizar rapidamente recursos não apenas para situações emergenciais, mas igualmente para o esforço desenvolvimentista que visa, por exemplo, à construção de estradas, ferrovias, portos e aeroportos, usinas elétricas, redes de transmissão de dados e de energia, etc. Tendo por base as premissas do XIX Congresso do Partido Comunista, o Governo pode gerenciar todos os recursos ao seu dispor para enfrentar desafios nacionais, sejam eles em situações difíceis ou vislumbrando planos para o futuro. 

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No Brasil, tais diretrizes talvez sejam inaplicáveis no médio prazo, dada a corrupção endêmica que assola a gestão pública e as relações público-privadas no país, uma vez que, por exemplo, a livre disposição de todos os recursos federais nas mãos da cúpula de Governo poderia resultar no desvio de verbas, ou ainda no acordo entre gestores privados e públicos para aplicação de parte do orçamento da União ou de um estado em determinado empreendimento, como a construção de um aeroporto, para atender a interesses políticos e econômicos de agentes privados próximos ao Governo. 

Se a utilização das verbas públicas para cumprir com interesses estratégicos nacionais ou para solução de problemas emergenciais é atravessada pelos mesmos problemas que ocorreriam no Brasil, sem os órgãos de regulação que muitas vezes embargam obras de interesse nacional por anos nos Tribunais de Contas brasileiros, ou sem a necessidade de aprovação de determinadas formas de manejar os recursos públicos pelo Congresso Nacional, causa problemas da ordem da corrupção na China, não se sabe ao certo. 

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O país é, de fato, um dos que menos registra casos de corrupção no mundo. Os chineses atribuem esse sucesso ao rigor com que o Estado atua em casos de suspeita ou comprovação de desvios éticos (que podem sequer configurar crimes) na Administração pública, indo do afastamento imediato do cidadão suspeito até a pena de morte em caso de grandes escândalos de corrupção (o que, diga-se, está na contramão das diretrizes internacionais de direitos humanos, que condenam a aplicação de pena capital para qualquer crime). Outra opinião sustenta que os baixos índices de corrupção na China estariam amparados, na verdade, na ausência de oposição parlamentar e eleitoral, bem como nas restrições a atividade da imprensa, que resultariam na pouca efetividade dos mecanismos internos de controle e divulgação das contas públicas.

Uma síntese positiva em favor da potência asiática, no entanto, é o fato de que o desenvolvimento e o enriquecimento da população, que envolve não apenas salário e poder de compra, mas qualidade de vida, com acesso a segurança, saúde, educação e lazer, crescem em níveis exponenciais desde os anos 1990. Caso a má gestão pública fosse um problema chinês, como o é na América Latina e mesmo em países europeus como a Grécia e a Itália, possivelmente a China incorreria nos mesmos problemas sociais que esses países. Atualmente, a China, como qualquer país emergente, enfrenta suas questões internas e combate pobreza e problemas urbanos, mas encontra-se à frente de outros emergentes, como Brasil, Índia e África do Sul, em questões sociais. Em grande parte, devido ao poder do Estado em gerir recursos públicos em favor dos interesses nacionais.

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