O Golpe
Miguel Paiva descreve a cena de um hipotético e patético golpe de Jair Bolsona
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Por Miguel Paiva, para o Jornalistas pela Democracia
- Reúnam as tropas. Vamos invadir o Congresso, gritou o presidente no terceiro andar do Alvorada.
- Hoje tem feirinha na frente do Congresso, presidente. Não vai dar.
Respondeu seu ajudante de ordens.
- E que tropas? Estão todos num seminário sobre a vacinação.
- Quem deu esta ordem? Sou contra a vacinação.
A raiva do presidente era evidente.
- Foi o Gen. Mourão.
- Eu já proibi a entrada do Mourão no Palácio do Planalto.
- Ele deu a ordem pelas redes sociais.
- Por isso eu quero redes sociais impressas. Quero controlar. E a polícia, cadê?
- Qual delas. A militar, a civil, a parlamentar?
- A milícia. Essa pelo menos me obedece.
- Mas pra ocupar o Congresso, presidente, vai ser difícil.
- Difícil porquê?
- Pode rolar fogo amigo. O senhor sabe...
- Verdade, nunca se sabe...
O presidente fica pensativo por uma fração de segundo. Quando o pensamento se esgota ele diz.
- Como é que eu vou dar o golpe?
- Tem o povo, presidente. O senhor pode renunciar e voltar nos braços do povo.
- Já ouvi isso em algum lugar. Será que funciona?
- Ué, o senhor não tem o povo nas mãos?
- Tenho claro, mas será que eles vão me dar uma mão e me carregar de volta ao governo? Têm as forças ocultas...
- Presidente, o senhor anda lendo livros de história?
- Eu? Claro que não! Imagina...é intuição mesmo.
- Se o senhor que fechar o congresso precisa de mais do que um cadeado ou um Lira.
- O Lira é do centrão. Não confio. Se vende fácil.
- Mas é o que temos para hoje, presidente.
- Queria um golpe como antigamente. Tanques na rua, apoio americano, apoio da Fiesp, da imprensa....
- Já não se faz mais golpes como antigamente.
- Nem na América latina. Há pouco tempo estava tudo nesse caminho. Agora, a maldita da democracia vem corroendo o poder, estabelecendo a concórdia, determinando os destinos da nação. É um horror.
- Não se aflija, presidente. Vamos dar um jeito. Onde estão seus filhos?
- Devem estar aglomerando em alguma festa, ou na praia ou em Miami.
- Cadê o Onix, o Aras. O Tex, o Jack, o Fux?
- Traduz, filho, traduz.
- Infelizmente vamos ter que adiar o golpe, presidente. Precisamos nos organizar melhor. Precisamos do apoio da imprensa, por exemplo.
- A verdadeira ou a fake?
- Qualquer uma, presidente. Precisamos da opinião do Augusto Nunes, do Alexandre Garcia, da. Ana Paula do Vôlei...
O presidente se levanta irritado.
- Até eu que sou burro e golpista não acredito nessas pessoas. É com elas que vocês acham que eu vou dar um golpe? Chama o Marcos Rogério. Ele, com aquele discurso e com aquela elegância vai saber me aconselhar.
- Mais alguém presidente? O Pazuello, o Queiroga, o Bezerra, o Pacheco?
- Não, mais ninguém.
- Nem o senador Heinze?
-Não, este não, por favor.
-O senhor não queria um golpe como antigamente. Ele é bem antigo. Estilo conservador, superado, teimoso e inútil. Perfeito para um golpe.
- Cancela tudo e liga pra Alemanha. Vou me candidatar a deputado por lá naquele partido que me adora. É isso. Vou viver num país democrático. Lá eles me aceitam como eu sou.
Pano rápido.
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