O golpe contra o Bolsa Família

"Vamos lutar para que o bolsa família volte e não existam mais pessoas abandonadas no Brasil. Só por isso já terá valido a pena que o Lula volte e governe para todos, mas sobretudo para os mais necessitados", escreve o sociólogo Emir Sader

(Foto: ABr)


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Por Emir Sader

Quando o Lula disse – e começou a colocar em prática – que ia governar para todos, mas especialmente para os mais necessitados, começava uma nova era na vida do Brasil e nas próprias vidas. Não tropeçaríamos mais nas pessoas, nas crianças, nas famílias, dormindo e vivendo nas ruas, como regra – a cena mais dura de viver no país mais desigual do continente mais desigual do mundo.

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O Bolsa Família passou a ser o símbolo de que ninguém mais ficaria abandonado no país. Que os governos passariam a olhar e cuidar dos mais necessitados. Que governar – como diz o próprio Lula – é cuidar das pessoas. Uma definição que causaria horror aos sofisticados cientistas políticos, mas que representa algo muito concreto para as centenas de milhões de pobres do Brasil.

Era a ideia de que os governos não se ocupariam apenas do que se passa em Brasília, no Congresso, na Bolsa de Valores e em Washington. Que passariam a medir seu sucesso pela diminuição da pobreza, da fome, da miséria e das desigualdades, e não pelo apoio que teriam dos meios de comunicação e das entidades empresariais.
 

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Era a ideia de que o abandono é a pior coisa que pode acontecer com uma pessoa e com as pessoas. Que ninguém olhe para tua fome, para teu frio dormindo na rua, que atravessem a rua para não tropeçar em você, que tem na calçada seu leito e sua casa. Que finjam que não veem que são famílias, crianças e idosos, que estão sentados ou deitados nas praças, que deveriam ser feitas para o passeio e o lazer e não para o refúgio dos abandonados.

Que o auxílio aos mais necessitados não dependeria do ânimo do presidente de turno, das relações com o Centrão, que não seria adiado de dezembro para março, como se não soubessem que são 90 dias e 90 noites a mais de fome e de desamparo para milhões de pessoas. Como se a conveniência advinda das pesquisas é que comandasse o auxílio ou o não auxílio. Como se o teto de gastos pudesse cobrir os abandonados quando chove nas praças e nas ruas. Como se discutir se 40 ou 220 significasse agradar o Paulo Guedes e deixar ao desamparo do leite de todas as manhãs a milhões de crianças pobres.
 

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Achávamos que tinha acabado o sofrimento dos milhões de abandonados nas ruas, que a maioria continuaria a predominar, votando em governos que privilegiavam o Bolsa Família e não a Bolsa de Valores. Mas tiraram a Dilma por um golpe – que tanto arrependidos ainda tem dificuldade de aceitar que foi um golpe -, para acabar com aquelas ilusões de milhões de abandonados e de nós também, de que não haveria mais gente desesperada, dormindo com fome, molhando-se na chuva nas calçadas.
 

Foi um golpe contra o bolsa família, a favor dos especuladores da Faria Lima e não dos abandonados que dormem nas calçadas da Faria Lima. Foi um golpe contra a democracia, contra as políticas sociais, contra o Lula e o PT, contra o Bolsa Família. As Bolsas de Valores surgiram junto com a fome e o abandono dos milhões de desabrigados.
 

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Pode voltar algum auxílio, dependendo das pesquisas e do estado de ânimo – e dos interesses – do Centrão. Valerá até as eleições, se o genocida conseguir se reeleger. A Bolsa de Valores aplaudirá, o Bolsa Família cairá no esquecimento e os abandonados seguirão mais abandonados que nunca. Serão escondidos pela ação das polícias – enquanto não existem cachorros que os espantem -, pelo discurso dos governantes, pela esquiva do olhar seletivo da televisão e das fotos dos jornais.
 

O Lula vai voltar? Talvez. O bolsa família vai voltar para ficar? Até que os salários e os empregos sejam decentes, não os mil reais que os trabalhos precários nem sequer pagam, mas um salário que permita que as pessoas tenham uma casa minimamente digna para morar com sua família, comida para todos, todos os dias, trabalho com carteira assinada.
 

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Vamos lutar para que o bolsa família volte e não existam mais pessoas abandonadas no Brasil. Só por isso já terá valido a pena que o Lula volte e governe para todos, mas sobretudo para os mais necessitados.

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