O fetichismo da mercadoria

Karl Marx
Karl Marx (Foto: Reprodução)


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Comentando com alguns amigos, revelei que não via sentido nas muitas confusões dos tão auto-proclamados marxistas da “mainstreet” sobre essa particularidade óbvia do capital (descrita com muita objetividade no próprio Capital, volume 1).

No fim, propus a hipótese de que esses auto-proclamados “grandes estudiosos do capital” eram tão somente nomes que ficaram famosos para a veneração de quem nunca havia lido Marx, mas que os usavam para racionalizar suas agendas pós-modernas que afastavam o Marx real e criavam um novo Marx, “o Marx da era da pós-verdade”. 

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Independente do que seja, examinemos esse conceito e vejamos como ele é simples: 

Em primeiro lugar o termo fetichismo não deve ser compreendido no valor semântico das longínquas religiões de origem principalmente africanas, que lançavam suas maldições em um objeto, como uma espécie de ritual vudu. 

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Começar por aí é tentar compreender um termo simples se valendo de mistérios de uma analogia jamais proposta por Marx. 

Fetichismo da mercadoria tem um único sentido: trata-se da mercadoria assumindo um carácter fantasmagórico. Ponto final. 

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Por que Marx faz essa proposição?

Porque até então ele já havia destrinchado o conceito de mercadoria a ponto de o leitor conseguir compreender que a mesma é um produto social que modifica - em um sistema específico de produção, o capitalista - o seu real sentido de valor de uso, igualando toda a massa heterogênea de trabalho humano em uma massa homogênea capaz de ser trocada pela mercadoria na forma dinheiro. 

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Isso gera um fenômeno de alienação daqueles que fazem parte do sistema de produção capitalista, seja o produtor ou o dono do meio de produção. 

Em breve síntese toda mercadoria tem trabalho humano objetivado em seu interior. Aliás, qualquer mercadoria é trabalho humano objetivado. 

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Pelo fato de um objeto, na indústria moderna, passar por uma cadeia gigantesca e arbitrária de múltiplas divisões de trabalho, aquele mesmo objeto final ganha um aparente carácter desconectado de seu significado original. 

Isso não ocorre apenas por causa de sua longa jornada de produção, mas também pelo fato de os produtores estarem alheios ao meio, ao sentido e ao significado da atividade que eles são submetidos, ocasionando esse alheiamento social de todos com aquilo que todos produzimos. 

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Toda vez que trocamos mercadoria dinheiro por um objeto qualquer estamos nos relacionando - sem consciência - com todas as pessoas que produziram o mesmo objeto. 

Um exemplo simples: ao comprarmos uma camisa estamos nos relacionando com todos os seres humanos que produziram essa camisa e reforçando as relações sociais que dela derivou. 

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Caso tenha havido condições desumanas, semi-escravas, trabalho infantil, destruição do meio ambiente, etc, para a produção daquela camisa, estamos fazendo parte ativa dessa cadeia, ao comprá-la. 

Mas não é assim que as pessoas em geral enxergam o mundo das mercadorias. Para a quase totalidade da população uma mercadoria serve apenas para suprir sua necessidade individual de tê-la e ponto final. 

Para comprar mais dessa ou outra mercadoria vai precisar ter dinheiro, o que a impele a fazer parte do sistema produtivo que produz o mesmo processo de alienação e assim por diante. 

Marx chama a relação que temos com as mercadorias de relação fetichista, como se a mercadoria não tivesse trabalho humano objetivado, mas surgisse como passe de mágica e vagasse pelos corpos ou vitrines como se tivessem plena autonomia de existência: por isso denominou esse fenômeno de “fetichismo da mercadoria” ou seja, na produção capitalista a mercadoria assume uma forma fantasmagórica, como se tivesse vontade e vida própria independente de tudo e de todos. 

Que fique claro: esse é o processo final de um modo de produção capitalista que cria esse fenômeno social de alheiamento de todos com o que todos produzem. 

E tem jeito de mudar isso? 

Sim. 

Marx já faz o apontamento que em uma sociedade livre da exploração, autônoma, com homens e mulheres que decidem livremente aquilo que deve produzir, romperíamos com esse fenômeno, pois já não seria mais uma sociedade produtora de mercadorias, mas uma sociedade produtora de objetos que se revelam como frutos do trabalho humano, que não nega a multiplicidade de trabalhos e da riqueza do gênero humano, mas a realiza de forma a garantir as verdadeiras vantagens e os verdadeiros desejos para aqueles que produzem. 

A sociedade capitalista fetichiza a produção e esse é um resultante de sua forma brutal de gerar exploração e alienação. Enquanto houver essa forma de produção não conseguiremos ser livres e enxergar - como sociedade - que somos nós mesmos que criamos o mundo ao nosso redor e que somos responsáveis por tudo e por todos. 

Não por acaso Marx fala desse estágio de libertação do capitalismo como o fim da pré-História da humanidade. A História da humanidade só será SUA efetivamente quando formos livres de tudo o que nos afasta de nossa humanidade, de tudo o que nos faz ser alienados e, por isso, de tudo aquilo que tolhe o potencial de cada um de nós sermos e gerarmos  um novo mundo autêntico vivido por pessoas que conseguirão ser felizes. 

Nos desprenderíamos das múltiplas formas de pobreza, que vai da pobreza rasa e material até as profundezas da pobreza espiritual: quando o Homem já não vê sentido em sua existência, pois a mesma está - ainda que melhor remunerada - sem sabor, sem direção e sem sentido… Pois aqui o indivíduo não vê vida na sua existência, apenas vê a vida no mundo das mercadorias, realizando uma verdadeira manobra deturpadora da sua própria consciência.

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