O dilema Patrimonialismo X Republicanismo no Brasil

Mais problemático ainda é o uso ilegal, descontrolado ou partidarizado do chamado "Poder de Polícia" do Estado Democrático de Direito. Não se pode aceitar a existência de um estado policial e militar dentro do Estado Constitucional, regido pelo ordenamento jurídico da Nação



✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

É rica e variada a ensaística brasileira que trata da herança portuguesa ligada ao Patrimonialismo. Nomes como Sérgio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro, Simon Schwartz, Oliveira Viana e Nestor Duarte constituem uma galeria de estudiosos das instituições políticas brasileiras, com uma profunda ênfase no uso privado, familista dos bens públicos e sua distribuição aos parentes, contraparentes, cupinchas, apaniguados e que tais. Essa tradição analítica foi consideravelmente ampliada com os últimos ensaios de Francisco de Oliveira e o último livro de Faoro sobre o liberalismo no Brasil. Oliveira fala de uma burguesia de Estado, que só acumula capital através de uma relação simbiótica com o Estado e suas políticas de "socialização das perdas". Burguesia cartorial, da corrupção e da sonegação fiscal; dos grandes e pequenos negócios com os agentes públicos. Empresas que criam fundações humanitárias para esconder a face podre dos desvio do dinheiro público através da participação em grandes obras públicas.

Naturalmente que isso só pode ser feito com a cumplicidade dos gestores públicos. Eles são sócios no crime. São beneficiários, de um ou de outro modo. A criminalização dos ilícitos contra o erário público, seus atores, beneficiários e agentes do Poder Público, imputando-lhes a responsabilidade civil e criminal, punindo-os exemplarmente e exigindo a devolução ou o pagamento dos recursos desviados, não deve – entretanto- servir de instrumento de uma vindita ou catarse popular, sobretudo quando identificada com a figura do "vingador público", seja um caçador de marajás ou um simples juiz. Mais problemático ainda é o uso ilegal, descontrolado ou partidarizado do chamado "Poder de Polícia" do Estado Democrático de Direito. Não se pode aceitar a existência de um estado policial e militar dentro do Estado Constitucional, regido pelo ordenamento jurídico da Nação. Isso ocorre quando os Poderes da República não funcionam, não cumprem com suas obrigações. Se o Legislativo legislasse, e o Executivo executasse e o Judiciário garantisse o cumprimento das leis brasileiras, o aparelho militar e policial não teria tanto autonomia. O ativismo policial corresponde à inação dos outros poderes.

E a sociedade civil brasileira? 0 que dizer de seus espasmos participativos? – Aqui entre nós não há propriamente o que se chama de "espaço público" no Brasil, entendido este como o lugar da formação racional da vontade política da sociedade. O que temos entre nós é um "espaço comum" produzido por uma sofisticada engenharia simbólica, destinada a nos fazer crer que pertencemos uma imaginária comunidade nacional, a um mesmo movimento ou causa comum. Pior ainda, por empresas jornalísticas (que são concessão do Poder público) que cuidam especialmente de seus interesses corporativos, sob o manto da inocência e da imparcialidade.

continua após o anúncio

Agora junte os pedaços do quebra-cabeça: herança patrimonialista, burguesia de estado, inação ou inoperância dos Poderes constituídos, instabilidade política social, e autonomia do aparelho policial. Aí vem o messianismo político (a ideia de que "Deus é brasileiro") e que vai enviar um anjo vingador, com suas espada na mão, para nos redimir da ação dos carcomidos, dos corruptos, dos marajás etc. Claro que cada um espera que o messias saia de sua igreja, de seu partido, de seu movimento. Mas do caos, das desorganização institucional, da falta de esperança e confiança nas instituições públicas, pode brotar não o eleito que nos salvará do precipio na undécima hora, mas a besta-fera do apocalipse, e aí não vai ter para ninguém.

continua após o anúncio

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Este artigo não representa a opinião do Brasil 247 e é de responsabilidade do colunista.

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247