O Boer e a fome do Seu Zé

(Foto: Reprodução/YouTube/Estância Vale Encantado)


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Administrações da cidade de Paulo Afonso no Sertão da Bahia precisariam ser estudadas, visto que já tomaram algumas decisões que, no mínimo, são estravagantes.

Aqui já teve um projeto de criação de Jacaré do Papo Amarelo e criação de Avestruz, tudo “vendido” pelo marketing da prefeitura como sendo a “solução” para criadores da zona rural. Mas o que mais chegou perto de dar certo foi o projeto de criação do bode Boer.

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O prefeito da época mandou comprar algumas matrizes que serviriam como procriadores e assim, distribuir a alguns criadores escolhidos a dedo. Parte da imprensa vivia a falar das benesses que seria o cruzamento dos Boers com as cabras sertanejas. Diziam que nasceriam cabras mais fortes e com mais carne. Eu fiquei me perguntando se isto não levaria a extinção do nosso “pé duro” que alimenta a população a centenas de anos.

Mas como todo projeto inusitado o resultado na maioria das vezes dá errado. E os que foram testados em Paulo Afonso não foi diferente, deu tudo errado. Nada prosperou.

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As matrizes de jacaré se quer chegaram a cidade. Os avestruzes serviram de alimento para as famílias que receberam os casais. Foi um desastre total e não se tem notícias de que algum “produtor” tenha conseguido êxito.

Já os Boes, estes as histórias são mais interessantes.

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Criadores tiveram dificuldades em manter as criações em suas terras. É que, diferente do bode sertanejo, as matizes precisam se alimentar com ração de qualidade. Para quem tem criação que vive solta pela caatinga comendo de tudo, ter um luxento, não daria mesmo certo.

Com o fracasso do projeto, a prefeitura recolheu algumas matrizes, e entre elas o Boer escolhido para ser aquele que cruzaria com o maior número possível. Era o de maior porte físico. Dizem que quem o via, ficava impressionado com o tamanho.

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Pois, um dia de segunda-feira, quando os trabalhadores do Parque de Exposição chegaram para trabalhar e foram alimentar os animais, deram pela ausência do famoso Boer. Foi um quiproquó arretado. Todos com receio de informar ao secretário sobre o sumiço, mas tiveram que fazer e foram todos a delegacia comunicar a situação.

Delegado informado, colocou uma equipe nas ruas para investigar o roubo do Boer. Não demorou muito e no mesmo dia chega a viatura com Seu Zé, morador de uma localidade ao lado do parque de exposição. Pessoa simples, desceu da viatura com o rosto envergonhado pela situação.

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Os policiais, se quer, colocaram algemas no homem.

Já dentro da sala com o delegado, que olhava para aquela pessoa e não via nele um “ladrão”. Perguntou: Seu Zé, porque o senhor roubou aquele Boer?

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Com a cabeça baixa, o homem respondeu: Doutor eu não roubei, eu peguei o bode que encontrei primeiro.

O senhor sabe que cometeu um crime?

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Respondeu: Não delegado. Se o senhor e os seus filhos estivessem chorando de fome em sua casa, o quê o senhor faria para parar o choro e a fome deles?

O delegado ficou parado e sem reação diante daquela pergunta. Passaram-se alguns segundos de silêncio que mais pareciam intermináveis.

Mas o senhor pegou o principal reprodutor, o mais caro, o mais bonito. Porque então não pegou outro lá? Indagou o delegado.

Doutor, eu não sabia disso e a fome não escolhe valor, ela existe e eram os meus filhos que estavam chorando.

O quê o senhor fez com toda a carne?

- Peguei o que precisava para dar comida em casa e o restante eu distribui com os vizinhos que também passam fome. Sem mais palavras, o delegado tomou a sua decisão diante daquele homem.

- Seu Zé, vou lhe pedir um favor. O senhor não faça mais uma coisa dessa. Eu vou falar com o prefeito, mas se acontecer novamente, terei que o prender.

- O senhor tem a minha palavra que nunca mais farei isso.

E foi assim, ou mais ou menos assim, que a história circulou pela cidade e ainda hoje pessoas contam a história do Boer que matou a fome do Seu Zé e sua família.

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