O apagão tecnológico do general G. Dias

"G. Dias é um legítimo 'filhote da ditadura', ou seja, formado por agentes repressores'', escreve a jornalista Denise Assis

Gonçalves Dias e invasão na Praça dos Três Poderes
Gonçalves Dias e invasão na Praça dos Três Poderes (Foto: gonçalves-dias-8-de-janeiro-invasao)


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O declarante Marcos Edson Gonçalves Dias, ou, o general G. Dias (seu nome de guerra), acredita que houve “um apagão de inteligência”. Ninguém tem dúvida. Principalmente a dele. 

G. Dias entrou no Exército em 1969, na Escola Preparatória de Cadetes do Exército. No auge da ditadura e seus horrores. Todo o seu início de carreira foi forjado por instrutores que, se não praticaram a repressão e seus “efeitos colaterais” – a tortura -, sabiam de tudo o que se passava nos corredores cinzas das dependências onde os militantes contra o regime eram moídos no pau, muitos até a morte. Os primeiros cinco anos de sua formação foram os piores do sistema dos militares no poder. A resistência foi dizimada nesse período. E ninguém sai ileso de uma experiência como essa. G. Dias é um legítimo “filhote da ditadura”, ou seja, formado por agentes repressores.

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O general integra a “família militar”, e como tal não trairia “os seus”. É também um sujeito antigo, de hábitos analógicos e habituado a receber relatórios com cinco carimbos, para assinar embaixo um “ciente”, com devolução de uma via. Por isto, não considerou os alertas oriundos da Abin, via whatsApp, sobre o acirramento dos ânimos nos acampamentos em frente ao Comando Militar, e a chegada de ônibus aos borbotões, a Brasília, desde o dia 6 de janeiro, com ameaças de invasões dos prédios públicos. 

Disse-o com todas as letras, no depoimento oficial concedido à Polícia Federal, no dia 21 de abril de 2023, data símbolo para a democracia que ele deveria ter defendido. Mas, tal como Barbosa, o nosso goleiro da Copa de 1950, que falhou no segundo gol do Uruguai, em pleno Maracanã - e passou a vida remoendo aquele momento -, G. Dias vai repassar mil vezes a sua chegada ao Planalto naquele domingo.

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Ao longo de 20 anos servindo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, aprendeu a conjugar o verbo “conciliar”. No final do ano de 2022, logo após a vitória de Lula para um terceiro mandato, porém, elevou a um nível radical essa prática, quando trabalhou, juntamente com o ministro José Múcio, pela não existência de um grupo de transição na área de Defesa, onde apostavam estar, desde que cumprissem a agenda importa pelo Alto Comando: levar ao novo governo uma pauta de reivindicações. Nesta pauta cabiam desde a exigência de não tocar no famigerado e ambíguo Artigo 142, da Constituição, até a manutenção, na íntegra, do sistema de previdência recém-instituído, e mais o bendito currículo das Escolas Militares, onde pretendem continuar ensinando que em 1964 o “bravo” Exército Brasileiro varreu do país a “ameaça comunista”. O que quer que isso signifique, pois eles não vão além da página 2, sobre o tema. 

A “missão” de G. Dias e do “emissário” e “escolhido” da caserna, José Múcio, para o cargo de ministro da Defesa, foi revelada em um programa do grupo Prerrogativas, no dia 17 de janeiro, de 2023, quando ainda se tentava adivinhar que nomes estavam na cabeça do presidente recém-eleito, para compor o seu ministério. Com o cumprimento de tal tarefa, Múcio e G. Dias eram certezas. Múcio para a Defesa e ele para estar próximo de Lula, na estrutura de Segurança, seu assunto.

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Com o redesenho da área, coube-lhe ser ministro do Gabinete Institucional da Presidência da República (GSI), onde deveria antecipar cenários do entorno do presidente e do governo, traçar estratégias de segurança, se antecipar aos fatos que por ventura se constituíssem ameaça para o seu chefe, seu governo e o país. 

No dia 21, sexta-feira, depois de “se desligar” do cargo, em função de imagens manipuladas, que vieram a público pelo canal CNN, com a nítida intenção de colocar em dúvida, inclusive a sua fidelidade ao presidente, indagado sobre o sistema do qual deveria cuidar, declarou que houve “um apagão” geral do sistema “pela falta de informações para a tomada de decisões”. Disse, também, que não chegou até ele “qualquer relatório de inteligência”. 

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O general as recebeu, por whatsApp. Foram várias as mensagens entre os dias 2 e 7 de janeiro, enviadas pela Abin, mas ele “não as considerou relevantes” e declarou que essas mensagens não podem ser vistas “tecnicamente” como “um relatório de inteligência para produção de conhecimento para assessorar a decisão do gestor”. 

Declarou que às 14h50 solicitou reforço de efetivo do Comando Militar do Planalto – CMP. E, mais: caso o nível de criticidade fosse alto, conseguiria utilizar todo o efetivo do CMP acrescidas outras tropas, como ocorreu na posse presidencial. G. Dias estava no coração do golpe, mas não o viu. O chefe da inteligência não conseguiu avaliar a gravidade do que se passava no entorno. Era o homem errado, no lugar errado. Contou ter temido por sua vida, mas circulou desarmado entre os terroristas. Disse que estava fazendo um “gerenciamento de crise”, quando não conseguiu debelar a sua própria. 

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Ao receber um telefonema para adiar a prisão dos golpistas, permitindo a fuga em massa dos integrantes do acampamento em frente ao quartel, repassou a decisão para o chefe que deveria defender. 

G. Dias viu ao seu redor um clima de confraternização, quase de churrasco de domingo, entre os seus comandados e os que tocavam o terror, mas permitiu que aflorasse nele o espírito da família militar: primeiro os seus. Como o goleiro Barbosa, deixou de fazer a defesa decisiva. Enquanto no Maraca estava em jogo o nosso brio, naquele domingo o que corria risco era a nossa democracia. G. Dias o desconsiderou, porque as ameaças chegaram por zap. 

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