No primeiro programa, Pimentel é povo e Anastasia é gestor
Nos primeiros programas de TV, o governador, Fernando Pimentel, se apresenta junto ao povo. Com mais de três minutos de programa, Anastasia surge só. Essa é a principal diferença em relação ao programa de Pimentel, que se resume em seu principal slogan: "Anastasia sempre foi Anastasia"
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Se a campanha nacional se inicia com o impasse da retirada violenta de Lula da eleição, e de como o Partido dos Trabalhadores (PT) vai lidar com a transição necessária de uma campanha em torno do ex-presidente para outra que, efetivamente, peça votos ao seu representante, Fernando Haddad, num cenário pulverizado em que 15% dos votos garantiriam o petista no segundo turno contra o "pule de dez" Jair Bolsonaro, cá em Minas a situação é diferente. Uma eleição plebiscitária opõe o atual governador, Fernando Pimentel (PT) ao ex-governador no mandato anterior ao de Pimentel, Antônio Anastasia (PSDB).
O plebiscito, portanto, se dá, em primeiro lugar, pelo confronto entre dois modelos de gestão: um desenvolvimentista, centralizador de decisões e descentralizador da economia para o fortalecimento das pequenas e médias empresas e agricultura, capitaneado pelo atual governador; outro terceirizador e privatista, aliado à maioria dos prefeitos conservadores num estado com 853 municípios, portanto capilar na tomada de decisões e centralizador na economia, fazendo crescer o empresariado de BH para que, ele sim, passe a ofertar serviços por todo o estado. Em suma, o que está em jogo é a pauta nacional: Minas quer um Estado forte e garantidor de direitos ou um Estado mínimo que entrega o povo à selva do liberalismo cartelizado pelos mais fortes?
Se, por um lado, Pimentel não representa aquele socialista clássico, militante de causas sociais ou sindicais, como o seriam Reginaldo Lopes, Patrus Ananias, Nilmário Miranda, Jô Moraes, tampouco pode ser desconsiderado um político de esquerda, ao se apresentar como um social-democrata em favor do enriquecimento e do empoderamento regional. Em BH, quando prefeito, na linha de seu formador e antecessor, Célio de Castro (PSB), implementou programas de descentralização da economia com instalação de centros de atendimento em saúde, assistência social, esportes e lazer na periferia da capital, além de melhorias estruturais nas escolas. Também trabalhou o plano diretor e deu prosseguimento ao orçamento participativo, projeto de Célio.
Nos primeiros programas de TV, o governador se apresenta junto ao povo. Em cenário fechado, simulando a convenção partidária, ele está num palco central junto com Dilma Rousseff (PT), presidenta legítima deposta no golpe de 2016, e Jô Moraes (PCdoB), candidata a vice-governadora. Em seus discursos, que totalizam quase dois minutos do programa, Pimentel faz sua primeira defesa das dificuldades de gestão que enfrentou, atribuindo-a aos gastos perdulários dos governos tucanos em obras faraônicas como a Cidade Administrativa, que custou bilhões ao Orçamento estadual e ainda gera despesas continuadas, e foi criada com o propósito de agendar a mídia nacional e promover o nome de Aécio Neves. Também critica os projetos de terceirização de serviços e contratações em saúde e educação, que se tornaram uma torneira por onde vazava o dinheiro público para a corrupção privada. Dilma, por sua vez, lembra que "os que estão do outro lado" (sem citar Aécio e Anastasia), foram os que arruinaram as finanças mineiras e a depuseram de seu mandato e colocaram o corrupto Michel Temer no Poder. Enquanto falam Dilma e Pimentel, são mostrados rostos de pessoas as mais variadas, negros, mulheres, idosos, estudantes, trabalhadores. E algumas palavras centrais dos discursos de cada um, como "Golpe", "povo", "Lula", são escritas na tela enquanto falam um dos três protagonistas. A palavra de Jô Moraes é curta e vai na linha dos outros dois.
Com mais de três minutos de programa, Anastasia surge só. Essa é a principal diferença em relação ao programa de Pimentel, que se resume em seu principal slogan: "Anastasia sempre foi Anastasia". Para um recém-iniciado em linguística e análise do discurso esta afirmação não deixa dúvidas: se, por óbvio, ele afirma que sempre foi ele, numa frase absolutamente tautológica, o que ele está tentando dizer? Uma criança de cinco anos vai compreender que "Anastasia não é Aécio", e pode até acreditar. Mas criança de cinco anos não vota. Um ou uma adolescente de 16 já vai entender: ele nega porque sabe que é! E é aí que se delineia um programa incapaz de convencer o eleitor a votar no PSDB e retornar aos tempos da Lei 100, dos Consórcios Intermunicipais, das licitações suspeitas para distribuição e armazenamento de remédios, das obras faraônicas e personalistas. Durante os três minutos, o hoje senador faz uso do chavão mais forte da política atual "eu não sou político, sou gestor", quase uma atualização do novecentista "rouba, mas faz" já usado na surdina por Paulo Maluf em São Paulo, Newton Cardoso em Minas Gerais, Anthony Garotinho no Rio de Janeiro. Ao apresentar seus aliados, não surge nenhum político. Não há um candidato forte a senador ao seu lado (como Aécio tinha Anastasia em 2014, como Anastasia tinha Aécio e Itamar Franco em 2010). A marca de Geraldo Alckmin só aparece no início e no fim da propaganda por obrigação do TSE. Fernando Henrique Cardoso, o último presidente da legenda, segue sua sina de ser um pária nas campanhas eleitorais de seu próprio partido. A única relação com o povo que Anastasia busca mostrar, para que seu programa não fique parecendo uma propaganda de corretora de seguros, são encontros pontuais em casas de pessoas simples, uma conversa ou outra num banco de praça.
Ainda não se tem a medida do quanto Pimentel pode fazer da oportunidade de rebater as críticas que tanto tem sofrido, na mídia e no dia a dia pautado pelas boatarias das redes sociais, para reestabelecer o voto tradicional do PT em Minas, algo em torno de 25%, e buscar a faixa que sempre o elegeu quando concorreu a prefeito ou governador, os 40% flertando com a vitória em primeiro turno. Isto porque, mais que o voto petista, ele sempre teve a confiança de setores da classe média que o veem como moderado, o que o permite levar certos votos que iriam para o "poste" anti-PT. Para isso, como já explicado em artigos anteriores, o governador precisa arregimentar setores que perdeu durante os revezes de sua gestão, dos quais não teve culpa em sua maioria, mas não teve canais para explicar isso à população.
No entanto, a comparação dos programas de Pimentel e Anastasia na TV revela a encalacrada em que se encontra a base tucana, que tem em seu principal líder um proscrito que lança-se a deputado federal num evento a portas fechadas, e o avanço nacional do PT após reconquistar o apoio popular na vanguarda da oposição ao governo Temer e à ditadura jurídico-midiática. Por isso, papel fundamental nesse reagrupamento das forças progressistas mineiras será desempenhado pelo sindicalismo no estado, sobretudo por candidatos e candidatas como Beatriz Cerqueira (PT), líder dos professores no âmbito estadual, e Roberto Cupolillo (Betão, PT), também professor, mas que dialoga com o funcionalismo público e os metalúrgicos da Zona da Mata. Esta coluna ainda pretende discutir esse assunto, conforme permitir a janela de fatos da semana.
A síntese dessa primeira rodada de programas, enfim, é: graças ao papel que desempenhou no golpe de 2016, Anastasia faz campanha sozinho. Pimentel tem aliados, mas ainda falta-lhe o povo. É preciso buscá-lo de volta.
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