Meia-Noite no Planeta Quarentena: Dylan ataca de novo

Como um tiro ricochetando nas Portas do Céu, Bob Dylan acaba de lançar uma obra-prima que disseca o assassinato de JFK

Cai jornalista que inventava frases de Bob Dylan
Cai jornalista que inventava frases de Bob Dylan (Foto: Divulgação)


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Por Pepe Escobar, para o Asia Times

Tradução de Patricia Zimbres, para o 247

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Que timing espetacular. Como um tiro ricocheteando nas Portas do Céu, enquanto uma pandemia viral faz estragos ferozes e o Planeta Quarentena é o novo normal, Bob Dylan produziu uma estarrecedora obra-prima de 17 minutos, dissecando o assassinato de JFK, ocorrido em 22 de novembro de 1963, lançando-a à meia-noite, horário da Costa Leste dos Estados Unidos. 

Para a geração do baby-boom, para não mencionar os dylanólogos obsessivos, esse é o sucker punch supremo. Incontáveis olhos mergulharão em piscinas para revisitar todas as lembranças que redemoinham em torno "do dia em que estouraram os miolos do rei / Milhares assistiam, ninguém viu nada" (the day they blew out the brains of the king/ Thousands were watching, no one saw a thing).  Mas isso não é tudo: o Dylanmobile nos leva num tour mágico e misterioso dos anos 60 e 70, junto com os Beatles, a Era de Aquário e o Tommy, do The Who.

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Se há algum artefato cultural capaz de disparar um poderoso solavanco por toda uma América perplexa, que tenta se haver com um Beco da Desolação distópico, aqui está ele, obra do verdadeiro e incontestado Excepcionalista americano. Os tempos estão mudando. Sim, estão mesmo.

Há tantas jóias nas letras de Dylan que seria necessário um tratado para rastrear o turbilhão de música, literatura, referências cinematográficas e de miscelânea Americana entrelaçados em cada verso.

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Trata-se, essencialmente, de um mantra encantatório com um arranjo para piano, percussão esparsa e violino. Temos dois narradores: um Kennedy moribundo ("No banco de trás, ao lado de minha mulher / Rumando direto para o além / Tombo para a esquerda, minha cabeça em seu colo / Ó, Deus, me armaram uma cilada (Ridin’ in the backseat next to my wife / Headin’ straight on in to the afterlife / I’m leanin’ to the left, got my head in her lap / Oh Lord, I’ve been led into some kind of a trap") e o próprio Dylan.

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Ou isso pode ser lido como Dylan no papel do duplo de Kennedy, com intervenções ocasionais, como as dos supostos assassinos ("Então estouraram seus miolos ainda no carro / Abatido como um cão em plena luz do dia / Questão de timing, e o timing foi preciso / Você tem dívidas a pagar, e viemos cobrar / Vamos matar você com ódio e sem o menor respeito / Vamos zombar de você, e chocar você e rir na sua cara / Já temos alguém para pôr no seu lugar" ("Then they blew off his head while he was still in the car / Shot down like a dog in broad daylight / Was a matter of timin’ and the timin’ was right / You got unpaid debts we’ve come to collect / We gonna kill you with hatred, without any respect / We’ll mock you and shock you and we’ll grin in your face / We’ve already got someone here to take your place").

A pérola no coração do mantra é nada menos que apocalíptica: "Mataram ele uma vez, mataram ele duas vezes/ Mataram como num sacrifício humano / No dia em que mataram ele alguém me disse: 'Filho, a era do Anticristo está só começando'" ("They killed him once and they killed him twice / Killed him like a human sacrifice / The day that they killed him someone said to me, / ‘Son, The Age of the Antichrist has just only begun'").

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Qualquer palavra adicional para definir a canção seria desnecessária. Onde quer que você esteja no Planeta Quarentena, recoste-se, entre em modo trancado em casa/socialmente distanciado, ligue o som, sintonize e  viaje no tempo.  Haverá sangue nas faixas.

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