Manifestações do PIB

É um erro grave acreditar que a corrupção terá fim, sem que se realize uma profunda reforma política no ordenamento nacional. A bem da verdade, a Presidenta Dilma tentou realizá-la, em meados de 2013, quando propôs um plebiscito autorizativo de uma constituinte exclusiva sobre reforma política



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Mesmo não atingindo os números de participação almejados pelos organizadores, não vejo como desconsiderar que a manifestação de oposição ao governo de domingo ficou um pouco menos incoerente depois que, em São Paulo, manifestantes isolados, por sua conta, resolveram alijar do bloco canarinha figuras como Aécio, Alckmin, dentre outras.

Apesar disso, os atos de anteontem continuam longe de se configurarem como legítima festa popular, já que é de conhecimento amplo que as ações patrocinadas neste emblemático treze de março foram financiadas, em todo Brasil, pelos grandes grupos empresariais nacionais, quiçá até internacionais. Em Fortaleza, por exemplo, no horário da concentração antigovernista, amontoavam-se na área nobre da cidade, ônibus e mais ônibus que haviam sido fretados para levar público ao evento.

Ainda no meio da semana, estas mesmas corporações patronais anunciavam, em jornais de grande circulação, chamamentos para o "patriótico ato cívico", que, a julgar pela infraestrutura envolvendo até exibição de paraquedismo, certamente custou fortuna. Não há o que discutir sobre a legitimidade dessa pirotecnia democrática, pois é lógico que o empresariado nacional tem o direito de lutar pelo que considera mais justo e seguro para seus interesses.

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Sabemos que se a economia do país não vai mal como anuncia a Rede Globo, também não caminha às mil maravilhas (o que nem poderia ser diferente já que, além do cenário negativo internacional, o governo sofre, há mais de três anos, com um boicote político sistemático, iniciado ainda na época da Copa das Confederações). Mas é claro que os empresários podem, e até devem, mover seus protestos quando se sentirem ameaçados ou prejudicados em seus interesses.

O problema é que na essência dessas manifestações há uma justificativa de crise ética, emoldurada por uma necessidade de combater-se a corrupção, que não pode ser atribuída apenas ao PT, à Presidenta Dilma e ao ex-presidente Lula, já que não pertence ao núcleo da governança, mas à estrutura criada pelo próprio sistema político para manter a governabilidade do país. Essa justificativa só ganha crédito amplificado devido à politização inflamada da Justiça e à manipulação da sociedade, "midiatizada" pelos grandes meios de comunicação. Ignorar isso tem sido grave incoerência de movimentos como os de domingo.

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Como se satisfazer com a justificativa de luta pelo fim da corrupção, apenas sustentada na retirada a fórceps da presidência de uma mandatária legitimamente eleita, e, por outro lado, na prisão injusta de um ex-presidente apenas para inviabilizar, a qualquer custo, sua eventual candidatura? Não se acaba com a corrupção assim, mas é isso o que a marcha canarinha em curso vem pretendendo fazer. Não se discute qualquer pauta sobre reforma política, mas, tão-somente, o impeachment de Dilma e a prisão de Lula.

Para os grandes grupos econômicos que não sofrem as consequências diretas da corrupção, ao contrário, delas costumam locupletar-se (porque se há alguém dentro do governo se vendendo, é porque há alguém fora da estrutura comprando-lhe), não há problema a marcha assumir conotação tão apequenada. Curioso é ver, no script, gente de classe média dizendo-se cansada, corroborando com a legitimação da situação, servindo como massa de manobra para a simples troca de comando de poder, mesmo nada tendo a ganhar com a corrupção, pelo contrário, apenas perdendo com a continuidade de um Estado corrompido.

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E se há uma coisa que ninguém pode negar é que a Presidenta Dilma tem sido rigorosa no enfrentamento à corrupção, não só pelas leis que tem feito aprovar, como pelas medidas administrativas que tem tomado, inclusive o afastamento imediato de suspeitos e a não intervenção nos órgãos. Há os que entendem tal situação, mas engrossam o coro das manifestações porque defendem um olhar econômico mais liberal para o país.

Há, por outro lado, os transvertidos de patriota que pensam que as coisas no Brasil irão melhorar imediatamente após a saída do PT, sem sequer imaginarem que as coisas não só podem não melhorar em nada, como podem, ainda, piorar. O que dá gás ao atual movimento pela alternância de poder não é o combate à corrupção, mas a luta de classes. A trocar-se a presidenta Dilma por quem quer que seja dentre as alternativas constitucionais possíveis será péssimo para a classe média, e pior ainda para o povo pobre, que terá, adiante, uma agenda econômica neoliberal para confrontar.

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É um erro grave acreditar que a corrupção terá fim, sem que se realize uma profunda reforma política no ordenamento nacional. A bem da verdade, a Presidenta Dilma tentou realizá-la, em meados de 2013, quando propôs um plebiscito autorizativo de uma constituinte exclusiva sobre reforma política. Contudo, prontamente os meios de comunicação, conjuntamente com o parlamento (desinteressado em frustrar os próprios interesses), trataram de convocar seus juristas conservadores para justificar a impossibilidade da proposta. Por fim, para sepultar as iniciativas do governo, recrutaram Eduardo Cunha, e aí está o resultado.

A propósito, outra incoerência abissal em eventos como os de domingo persiste na permissão que a onda verde-amarela concede a quem defende a guinada do país ao extremismo fascista de extrema-direita. Jamais uma manifestação poderá dizer-se popular acolhendo, em seu ninho, quem só sabe atacar contumazmente as minorias. Irmanar-se na luta ao lado de um Bolsonaro, de alguém que ignora os pressupostos constitucionais básicos, as liberdades fundamentais de outrem, deveria ser motivo de vergonha, tanto para a classe média, como para o alto empresariado. Infelizmente, não tem sido regra nas manifestações do PIB.

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