Lula livre: juiz resistiu a pressões
Marcelo Auler, do Jornalistas pela Democracia, destaca que o juiz Danilo Pereira Júnior "esclareceu que, diante da decisão do Supremo, ele não teria o que discutir sobre a libertação de Lula". O ex-presidente, diz Auler, se encontrava preso porque "o cumprimento de uma pena privativa de liberdade poderia ocorrer antes mesmo de a sentença transitar em julgado"
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Por Marcelo Auler, em seu blog e para o Jornalistas pela Democracia
Acostumados com a má vontade e até mesmo maldades da juíza substituta Carolina Lebbos, da Vara de Execuções Penais da Justiça Federal de Curitiba, para com o preso político Luiz Inácio Lula da Silva, os advogados do ex-presidente guardavam apreensões ao ingressarem no fórum federal de Curitiba, no início da tarde de sexta-feira (08/11).
Recorde-se que Lebbos, durante os 19 meses de permanência de Lula na Polícia Federal de Curitiba, em vários momentos o prejudicou como ao impedi-lo de ir ao enterro do irmão, ou ao evitar que desse entrevistas. Mais recentemente pretendeu mandá-lo para uma penitenciária em São Paulo, o que acabou impedido por decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Diante de tais recordações, antes de recorrerem ao juízo das Execuções Penais, Cristiano Zanin Teixeira e Valeska Teixeira, casal de advogados que defendem Lula há anos, alertaram ao ex-presidente dos dois cenários possíveis. O melhor seria a libertação ocorrer de imediato, diante da decisão de conhecimento público do Supremo Tribunal Federal. Mas poderiam surgir empecilhos, tais como a exigência da publicação do acórdão, ou mesmo a abertura de vistas do pedido ao Ministério Público Federal, que certamente impediria a saída de imediato.
Na Polícia Federal, talvez por conta do receio de que a demora servisse de chamariz para uma maior mobilização dos militantes e simpatizantes do ex-presidente na Vigília Lula Livre, havia a preocupação em correr com a liberdade do preso.
Após protocolarem, às 11:12hs, pela internet, o pedido de libertação do ex-presidente, Valeska, Cristiano e o advogado curitibano Manoel Caetano Ferreira, que ao longo dos últimos 580 dias visitou o preso político de segunda a sexta-feira, foram a Justiça Federal. Temiam resistências por parte da magistrada.
Acabaram bem surpreendidos. Lebbos estava de férias. Foram recebidos pelo juiz titular da Vara, Danilo Pereira Júnior, que já os esperava. Cristiano e Valeska conheceram o juiz naquele momento. Já Manoel Caetano Ferreira, advogado curitibano que ao longo dos últimos 580 dias visitou Lula diariamente, de segunda a sexta-feira, conhecia-o bem.
A receptividade, porém, aliviou as tensões logo no início do encontro. Prontamente o juiz esclareceu que diante da decisão do Supremo ele não teria o que discutir sobre a libertação de Lula. Anunciou a disposição de soltá-lo, apesar de, pessoalmente, ter entendimento diversos, como fez constar do despacho que assinou em seguida. Nele, registrou:
“À vista do julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade nº 43, 44 e 54 – e ressalvado meu entendimento pessoal acerca da conformidade à Justiça, em sua acepção universal, de tal orientação -, mister concluir pela ausência de fundamento para o prosseguimento da presente execução penal provisória, impondo-se a interrupção do cumprimento da pena privativa de liberdade” (grifo nosso).
No caso de Lula, não havia realmente o que discutir. Como era notório – e ainda assim o juiz decidiu expor na sua decisão -, ele se encontrava preso tão somente pelo antigo entendimento do STF de que o cumprimento de uma pena privativa de liberdade poderia ocorrer antes mesmo de a sentença transitar em julgado. A decisão explicita:
“(…) observa-se que a presente execução iniciou-se exclusivamente em virtude da confirmação da sentença condenatória em segundo grau, não existindo qualquer outro fundamento fático para o início do cumprimento das penas”.
Governador queria impedir Lula na Vigília
Como, na quinta-feira (07/11), o Supremo reformou tal decisão, nada mais cabia ao juiz de primeira instância, a não ser executá-la. Poderiam retardar. No caso, por exemplo, do ex-diretor da Petrobras, Renato Duque, o mesmo juiz decidiu ouvir o Ministério Público Federal, deixando-o preso por mais tempo encarcerado
Pereira Júnior, porém, não escondeu algumas pressões que já sofria. Em especial do governo do Estado do Paraná, cujo governador, Carlos Roberto Massa Júnior, Ratinho Júnior, e seu secretário de segurança, o coronel do Exército Romulo Marinho Soares fizeram chegar ao juiz o desejo de que Lula fosse impedido de visitar, como prometera em diversas entrevistas, a Vigília Lula Livre.
Instalada em um terreno alugado defronte da superintendência do DPF em Curitiba, a Vigília manteve-se de pé durante os 580 dias em que Lula ficou recolhido e isolado em uma sala de quinze metros quadrados, no quarto andar do prédio da PF. Eram militantes e simpatizantes que se revezavam, resistindo às intempéries, em especial no inverno pois estavam no alto de uma colina, onde o vento frio foi companhia constante.
O governo do Estado queria impedir o contato de Lula com os militantes que, na sexta-feira pela manhã, começaram a se juntar à espera do ex-presidente. No início da tarde já eram milhares. Alegava-se risco à segurança da própria população. Mas, certamente, queriam o inevitável: o líder político que resistiu ao isolamento imposto por 19 meses encontrar-se com seus admiradores.
O magistrado não deixou de manifestar sua preocupação com a questão da segurança pública, mas de pronto deixou claro não lhe caber impedir os passos de Lula depois que assinasse o Alvará de Soltura – o 700007758894 foi destinado ao ex-presidente.
Ouviu dos advogados o compromisso de que as regras de segurança seriam acatadas, desde de que decididas em comum acordo ente policiais federais, policiais militares e o capitão Moraes, chefe da segurança pessoal destinada pela União ao ex-presidente da República. Seguranças estes que, durante os 580 dias, se revezaram em Curitiba atendendo às necessidades de Lula e de seus familiares.
Após a saída dos advogados, atendendo até pedido verbal dos mesmos, Pereira Júnior, antes mesmo de assinar sua decisão libertando Lula, só formalizada às 16:11hs, telefonou para o vice superintendente da Polícia Federal, delegado Sérgio Eduardo Busato, que respondia pelo órgão, comunicando que soltaria o ex-presidente.
Este telefonema, que eliminava qualquer dúvida quanto a liberação do preso político naquela sexta-feira, foi por nós noticiado, com exclusividade, no site Brasil247 (*), às 15:53hs, antes mesmo de o juiz oficializar a decisão no seu despacho. Rapidamente a notícia viralizou, sendo reproduzida em diversos sites e listas de conversas no WhatsApp e no Facebook.
Lula, àquela altura, estava sozinho na sua cela. Não tinha mais recebido seus advogados que aguardavam o Alvará de Soltura na superintendência. Juntos estavam a filha Lurian, o neto Thiago, e a noiva, a socióloga Rosângela da Silva, Janja.
A segurança em torno do prédio começou a ser reforçada, inclusive com a presença ostensiva de um pelotão do Batalhão de Choque da Polícia Militar. Na Polícia Federal ainda houve um certo retardo, pois decidira seguir à risca o protocolo checando se não existiria outra ordem de prisão em vigor – preventiva ou temporária – contra o preso a ser libertado. Paralelamente, policiais federais queriam acertar com os advogados o esquema da saída de Lula. Mas estes determinaram que o entendimento fosse direto com o capitão Moraes.
Grades foram colocadas entre o portão principal da Superintendência e a Vigília, abrindo-se um corredor para que Lula percorresse o caminho. A PM queria saber ainda a rota a ser utilizada depois pelos carros que transportariam o ex-presidente. Nenhum detalhe, porém, foi mencionado. Até mesmo o destino dele – a residência de um amigo de 30 anos – era uma informação restrita a pouquíssimas pessoas.
Nesta casa, onde ele passou a noite, apenas na companhia da noiva e dos seguranças, Lula gravou o vídeo que enviou aos políticos latino-americanos reunidos em Buenos Aires, no encontro de Puebla (grupo de líderes políticos e intelectuais progressistas da América Latina), e conversou ao telefone com a ex-presidente Dilma Rousseff, que junto com o ex-chanceler Celso de Amorim, o ex-ministro Aloízio Mercadante e a jurista Carol Proner estavam naquele encontro.
Ali também houve o encontro de Lula com seu velho amigo José Dirceu, também libertado, mas por decisão do juízo estadual da Vara de Execuções Penais, no início da noite de sexta-feira. Na manhã de sábado, Lula saiu dali para o aeroporto, onde em avião fretado, voou para São Bernardo, seu berço político.
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