Lula, dono de seus dias e de suas escolhas

Lula está a levar o rochedo para o alto da montanha e ele sabe que essa é a solução e o sentido, pois nessa ação está o reconhecimento do protagonismo do povo numa democracia que se pretende justa e generosa, uma democracia verdadeira que negará sempre a democracia liberal (uma democracia dos proprietários)

Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante evento em Santana do Livramento, Rio Grande do Sul 19/03/2018 REUTERS/Diego Vara
Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante evento em Santana do Livramento, Rio Grande do Sul 19/03/2018 REUTERS/Diego Vara (Foto: Pedro Maciel)


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A Política a essência da vida humana, razão pela qual a dignidade da Política é a própria dignidade do ser humano e a palavra é instrumento de evitar a violência.

Não perco de vista a manifestação de Partidos socialdemocratas de 91 países, os quais se solidarizaram com Lula após sua condenação; emitiram à época uma nota afirmando que Lula foi condenado em um processo extremamente polêmico de primeira instância por corrupção passiva, seriam as acusações, a argumentação e a motivação da sentença altamente questionáveis, porque ninguém pode ser condenado unicamente com base em denúncias e sem provas.

A sentença, segundo os lideres socialdemocratas de todo o mundo, deve ser compreendida no contexto da polarização que vivemos por aqui e por uma politização indesejada do Poder Judiciário brasileiro, sobre o que temos escrito desde 2008.

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Além disso, as dúvidas quanto à imparcialidade do juiz Sérgio Moro lançaram e mantém a sentença na vala da insegurança e da nulidade potencial. Os críticos do Juiz da Lava-Jato dizem que ele não atua como um juiz, mas como um acusador que usa os meios de comunicação para criar um clima favorável à condenação, ou seja, não se poderia falar em um juízo justo.

A sentença poderia ser examinada pela segunda instância, mas não foi. 

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Não foi porque é inconcebível (e inacreditável) que um Desembargador leia mais de 200 mil páginas tão rapidamente. Sendo assim os desembargadores do TRF da 4ª Região tornaram-se igualmente suspeitos, pois não analisaram o recurso, estavam lá para validar o “paradoxo moro” que fundamenta a decisão de 1ª Instância.

Fato é que, desde antes de o recurso chegar a Porto Alegre, tornou-se evidente - pelas declarações do Presidente daquele órgão - que a sentença seria mantida, que não haveria correção de rota por lá... 

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Ou seja, forças terríveis buscaram impedir uma nova candidatura presencial de Lula, criminalizá-lo e encarcerá-lo, desmoralizando toda a esquerda. A prisão de Lula é a prisão de todos nós.

E registremos: em havendo falha na prestação jurisdicional (ou fraude) está afetado o nosso processo eleitoral e a nossa raquítica democracia.

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Então pergunto: diante disso tudo por que Lula se manteve validando essa fraude judicial?

Lula vitima de Lawfare, travestida de devido processo legal? Se for isso todo o esforço de seus advogados é inútil. Se concordarmos com isso tudo por que ele seguiu por esse caminho? Por que validou um simulacro de processo?

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Bem, Getulio, diante de injustiça que lhe impunham os canalhas de então, se suicidou, tornou-se mártir e mito e seu ato heroico atrasou em dez anos o golpe militar de 1964. 

Mas o que pretendeu Lula oferecendo-se à imolação? Lula deixou de ser ele próprio e passou a ser todos nós, ou pelo menos todos aqueles que desejam que a Política como o caminho para o bem comum e não dos interesses individuais; Lula representa a dignidade da Política e a humanização da interação humana, representa a defesa da liberdade, a defesa da diversidade e da pluralidade.

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Ele tem o direito de deixar-se prender?

Isso tudo nos remete ao mito de Sísifo. Relembrando: os deuses condenaram Sísifo a rolar um rochedo incessantemente até o alto de uma montanha, de onde a pedra invariavelmente caía de novo em razão de seu próprio peso. 

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Os deuses tinham pensado, com as suas razões, que não existiria punição mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança. 

Mas Sísifo, o herói absurdo segundo Camus, surpreende os deuses, tanto por suas paixões, como por seu tormento e desprezou os deuses, ignorou a sua finitude e as exercitou a paixão pela vida transformando seu suplício indescritível em significado, sentido, exemplo e esperança.

Lula demonstra, com alegria, que o caminho é comungar com a sociedade (as caravanas ao Nordeste, a Minas gerais e ao Sul representam essa fundamental comunhão).

Lula está a levar o rochedo para o alto da montanha e ele sabe que essa é a solução e o sentido, pois nessa ação está o reconhecimento do protagonismo do povo numa democracia que se pretende justa e generosa, uma democracia verdadeira que negará sempre a democracia liberal (uma democracia dos proprietários).

Lula que é perseguido pelos "deuses-vassalos", tutores de interesses ocultos, fatos que serão revelados pelo Tempo.

Ele não está a validar a fraude judicial, mas está a dar sentido transcendente a tudo isso, há, pois sentido nas suas ações e no seu discurso.

Lula também vê a pedra [democracia] desabar para esse mundo inferior de onde será preciso reerguê-la até o alto da montanha e ele vai levá-la para o alto e o fará tantas vezes quantas a sua finitude permita, pois esse é o sentido de sua vida e deve ser o sentido das nossas vidas, afinal a ação Política é o essencial da vida humana e a dignidade da Política, assim como a palavra, ou interação humana, é instrumento de evitar a violência.

Como Sisifo, esta a viver a alegria silenciosa dos justos, dos livres e dos defensores da liberdade, da verdade e da democracia, talvez Lula tenha consciência do seu destino e que ele [o destino] lhe pertence.

É isso, Lula é dono de seus dias, das suas escolhas e do seu destino.

Pedro Benedito Maciel Neto, 54, advogado, sócio da MACIEL NETO ADVOCACIA, autor de “Reflexões sobre o Estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007 – pedromaciel@macielneto.adv.br 

 

 

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