Lula, Alckmin e o cenário de 2022

"Se Lula for eleito terá que governar com uma coalizão, pois será difícil a centro-esquerda conquistar a maioria no Congresso", analisa Aldo Fornazieri

(Foto: Ricardo Stuckert | ABR)


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O meu desejo é que Lula formasse uma chapa como Boulos de vice. Mas, além de não ter relevância junto aos partidos, o meu desejo pouco tem a ver com a realidade política e eleitoral. O problema de muitas análises e formulações de representantes das esquerdas é esse: projetam como o correto e o verdadeiro aquilo que, sem consideração da realidade, coincide com seus desejos e ilusões. Não que seja proibido ter desejos e lutar por eles, mas é necessário submetê-los ao crivo da realidade, da pertinência, da ocasião, da razoabilidade e da viabilidade. 

No debate da possível chapa Lula e Alckmin é conveniente evitar algumas coisas: não se deve nem acrescentar e nem diminuir defeitos e virtudes do ex-governador, pois ele é um político de conduta e de modo de proceder conhecidos; não se deve também apelar para o apoio que ele deu ao impeachment da Dilma, pois o PT já anulou esta interdição ao fazer alianças com partidos que apoiaram o impeachment. É improdutivo, ainda, brandir o argumento de que o ex-governador integrou o PSDB: O PT já fez alianças com os partidos do centrão e aceitou por duas eleições Michel Temer como vice de Dilma. Convenhamos: Temer já tinha muitos desabonos, muitos dos quais Alckmin não tem. 

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Parecem existir apenas dois critérios que poderiam interditar a aceitação de Alckmin como vice: 1) o critério do compromisso com a democracia, da recusa ao fascismo e à extrema-direita; 2) uma divergência programática insanável com o programa defendido por Lula, o PT e os partidos da coalização. Parece que os dois critérios não são impeditivos da constituição da chapa. Ademais, Alckmin não representa apenas a si mesmo, mas o PSB e, possivelmente, setores do PSD que simpatizam com a candidatura Lula. Se o PT quiser fazer a aliança e terá que pagar o preço da força hegemônica com concessões.

A discussão precisa ser posta no plano político e eleitoral. Aqui, algumas considerações precisam ser feitas. As eleições de 2022 se definirão num campo político e eleitoral de centro-direita. Lula já tem os votos de esquerda e não há como ampliar nessa banda. Precisa ampliar rumo ao centro e terá que buscar composições e articulações nesse espaço. 

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É preciso considerar também que se Lula chega forte nas eleições, este não é o caso do PT e das esquerdas em geral, que não fizeram grandes mobilizações de massas e tiveram a bandeira do impeachment de Bolsonaro derrotada. Há pouco acúmulo de mobilização e organização no campo popular e esta é uma condicionante da candidatura Lula. 

Mas aqui é preciso evitar a idiotice da objetividade ou dos números das pesquisas. Uma pesquisa, por exemplo, mostra que Alckmin pouco ou nada acrescentaria a Lula eleitoralmente. Tomar essa pesquisa pelo valor de face é uma idiotice. Os números das pesquisas dizem pouco nesse momento. Devem servir apenas como uma das referências. 

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Ocorre que os representantes do centro e da direita e todos os moralistas sem moral, o udenismo espalhado nas mídias, nos mercados e no empresariado, tentam brandir o argumento da necessidade de evitar os polos extremados da direita e da esquerda – Lula e Bolsonaro. Isto pode ter impacto eleitoral na campanha. Uma composição com um vice de centro anula esse argumento.  

É preciso considerar que as eleições serão disputadas com radicalidade, com artilharia pesada contra Lula, com uso de todas as armas lícitas e ilícitas. É preciso evitar a arrogância ou a ingenuidade de que Lula já está eleito. A tendência é a de que se componha um cenário com vários candidatos de centro. A tese da unidade da terceira via é falaciosa. Os pretendentes sabem que é difícil evitar um segundo turno entre Lula e Bolsonaro, mas que não é impossível. O presidente tem muitas vulnerabilidades.

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Além disso, eles não olham apenas para 2022, onde se vislumbra o favoritismo de Lula. Eles olham também para 2026, quando Lula, possivelmente, não seria candidato, mesmo vencendo no próximo ano. Quem conseguir projetar seu nome nacionalmente entraria com alguma vantagem em 2026. Não tem sentido imaginar qualquer composição entre Dória e Moro. Dória tem também a tarefa de lutar para manter vivo o PSDB e dar-lhe uma nova significação. Um partido que aceita ser vice não projeta poder e liderança. Simone Tebet também pode imprimir um novo sentido ao MDB. Além disso, seria salutar para a política brasileira se uma mulher disputasse a presidência. 

A candidatura de Ciro Gomes, depois de seus erros de estratégia ao querer ocupar um espaço de centro-direita, luta para se reposicionar e tentar sobreviver. As pretensões de Rodrigo Pacheco parecem ter se afogado na sua conduta tíbia, na sua personalidade política frágil, ao se submeter aos desígnios de Arthur Lina nos episódios do orçamento secreto e da PEC dos precatórios. 

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Se Lula for eleito terá que governar com uma coalizão, integrando setores do centro, pois será difícil a centro-esquerda conquistar a maioria no Congresso. Bolsonaro não governou porque não tinha uma coalizão majoritária no Congresso. Em 2021 o centrão formou essa coalizão, não para garantir a governabilidade, mas para aprisionar Bolsonaro aos seus interesses. 

Num país com tantas pluralidades e com tantos partidos é impossível governar sem uma coalizão presidencial majoritária. Mas o presidencialismo de coalizão tem degenerado em fisiologismo, corrupção e crises. Lula teria que reforma-lo: formar a coalização de forma transparente e pública, com um documento de explicite os critérios e os compromissos. A coalizão majoritária deveria ser menos elástica e mais compacta, evitando as arcas de Noé onde cabem todos os bichos. 

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Um possível governo Lula enfrentaria enormes desafios: a reconstrução do Brasil da destruição bolsonarista, a fome e o desemprego, reformas progressistas para reduzir as desigualdades, combate à sonegação, corrupção e privilégios e o início de um novo modelo de desenvolvimento governado pela égide da revolução ambiental. 

Os avanços de um novo governo Lula com alianças ao centro dependeriam menos dos partidos e do Congresso e mais da organização autônoma dos movimentos sociais e de sua capacidade de mobilização. O PSOL e os parlamentares combativos dos partidos de esquerda e centro-esquerda poderiam formar um bloco progressista para ser a voz dos movimentos sociais no Congresso e junto ao governo. Lula vem afirmando que quer fazer mais do que fez quando foi presidente 

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Não existirão avanços significativos se os movimentos sociais e os setores excluídos não se organizarem e não lutarem por suas pautas e reivindicações. A organização e as lutas populares precisam ser o contraponto às pressões conservadoras das elites predatórias e no Congresso. Organização autônoma, pressão e mobilização, esta é a lição que os movimentos sociais precisam extrair dos limites dos governos do PT.

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