Lições de uma vitória espetacular no Peru

"A longa espera pela confirmação da eleição de Pedro Castillo mostra que as forças antidemocráticas permanecem ativas no Continente," escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Pedro Castillo
Pedro Castillo (Foto: REUTERS/Francisco Vigo)


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Por Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Um mês e 12 dias depois de ganhar as eleições presidenciais nas urnas, o candidato Pedro Castillo teve a vitória reconhecida e caminha para tomar posse como novo  presidente do Peru. A decisão deve ser comemorada, mas é preciso reconhecer um fato grave. 

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Ainda que magra, por uma diferença na casa dos 40.000 votos, ou 50,2% dos sufrágios, a absurda espera pelo reconhecimento oficial do resultado é uma advertência sobre a sobrevivência de forças golpistas no Peru, em particular, e na América do Sul, em geral.

País que em 1962 deu início a um ciclo de golpes militares da América do Sul, que dois anos depois incluiria o 31 de março de 64 que derrubou João Goulart no Brasil, nas últimas semanas o Peru assistiu a cenas preocupantes do ponto de vista da democracia.

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Ameaçada de ser conduzida para a cadeia por corrupção caso não fosse capaz de proteger-se pela imunidade assegurada por um mandato presidencial, a candidata de extrema-direita Keiko Fujimori foi capaz de articular várias iniciativas para tentar impedir a posse de Castillo.

Foi assim que ocorreram duas manifestações de militares, da ativa e da reserva, tentando bloquear a posse do candidato  vitorioso.

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Para completar, numa tentativa de evitar o anúncio formal dos resultados, um alto membro da justiça eleitoral renunciou ao cargo, iniciativa que interrompeu a contagem final de votos, atrasando e tumultuando o processo.

O reconhecimento da vitória de Castillo veio na sequência de dois episódios significativos. Em entrevista ao El País, o economista Pedro Franke, consultor da campanha de Carrillo, anunciou um novo curso na orientação econômica do novo governo, agora em versão mais palatável para o empresariado.

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"Não haverá estatizações, expropriações nem controle de preços. Nos colocamos um pouco mais a favor do mercado”, anunciou Franke, alto funcionário dos governos Alejandro Toledo (2001-2006) e Ollanta Humala (2011-2016).

Uma semana depois, o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, deixava claro que o governo de Joe Biden fizera uma opção. Price classificou as eleições peruanas como "justas, livres e pacíficas".

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O porta-voz ainda disse que as eleições peruanas "serviram como modelo de democracia na região".

Ressaltando "a profunda amizade entre os dois países", expressou o desejo de "prosseguir nesta colaboração, com o candidato devidamente eleito pelo povo peruano".

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Capaz de sair-se vencedor numa candidatura sem igual como expressão da população pobre e marginalizada do país, a confirmação da vitória representa uma vitória espetacular de Pedro Castillo e da democracia peruana.

É necessário  lembrar, contudo, que o mesmo Departamento de Estado que hoje fala em reconhecer a vontade das urnas  chegou a dar apoio ao governo Morales Bermudez, um dos patrocinadores da Operação Condor, que nos anos 1970 perseguia e assassinava militantes políticos. (Em 2016, o próprio Bermudez foi julgado e condenado pela Justiça italiana, pela prisão e morte de 25 cidadãos que residiam no país).

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Deposto com apoio do governo Bill Clinton, o presidente-ditador Alberto Fujimori não teria assumido o governo do país por 10 anos, entre 1990 e 2000, sem apoio da mesma Casa Branca.

A experiência ensina que a partir de agora há um outro processo em curso.  

Aquele professor de chapelão que encantou o mundo no combate pelos direitos das parcelas mais exploradas enfrentará um desafio com a mesma grandeza, ou quem sabe até maior -- proteger interesses e necessidades de um povo que, vencendo obstáculos de toda ordem, obteve uma vitória política com poucos paralelos na História. 

Há grandes motivos para uma festa. Mas não faltam razões para se preocupar.

Alguma dúvida?

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