Lembremos os nossos 13 anos de democracia utópica
O colunista Gustavo Conde traça um breve cenário do que foi a relação do PT com a imprensa em seus 13 anos de governo; Conde afirma que hoje fica bastante evidente que o PT se recusou a comprar a imprensa e mergulhar em um projeto de poder; ele diz: o PT assumiu o risco de governar e foi punido por isso
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A prisão de Lula provocou grandes mudanças no regime de sentidos que opera na mídia tradicional. Enquanto Lula foi preso, a imprensa se libertou. Ela se libertou da obrigação de massacrar Lula 24 horas por dia. Como Lula ocupava quase a totalidade matérias do jornalismo político, criou-se um vácuo.
Esse vácuo é ocupado agora, em parte, pela clássica pauta de crítica ao poder, função primeira do jornalismo que costuma se perder no frenesi da publicidade oficial.
Eu poderia dizer que o PT errou em não concentrar a suculenta receita publicitária que tinha em suas mãos para domesticar o jornalismo e, consequentemente, para se perpetuar no poder. Mas aí seu estaria sendo o falso esquerdista arrependido e sufocado no próprio ressentimento que restou na periferia do colunismo de grife.
O PT ser massacrado pela imprensa desde sempre é a comprovação de sua opção pela democracia, não pelo poder pura e simplesmente. Poucos entendem isso, poucos se dão ao trabalho de tentar entender isso. Mas a opinião, afinal, deveria ser baseada também em fatos - e o fato concreto é que o PT não quis comprar a imprensa como seus antecessores.
O PT mexeu nesse vespeiro e ganhou a notória fobia dos canais de comunicação e de parte considerável de seus funcionários, jornalistas trabalhadores, que têm o seu salário obviamente vinculado à receita global da empresa de mídia. Daí a começar a demonizar o governo que retém verbas publicitárias para investir em infra-estrutura é um passo elementar. Como diria a mais batida das citações pseudo-inteligentes, “é a economia, estúpido!”.
Admira realmente que esse período tenha durado 13 anos. Nós vivemos uma utopia que jamais será repetida. Foi um tempo em que o conceito abstrato e difuso de democracia valeu como nunca antes na história dos países soberanos mergulhados na desigualdade e no viralatismo. É sem precedentes.
A imprensa nesse período foi obrigada a lidar com uma pauta indigesta ao seu regime semântico: a pauta do nacionalismo e do crescimento. Jornalista detesta crescimento, detesta boa notícia. Foi difícil e eu sei que vocês lembram.
Fez a contragosto e diante de uma imensa dificuldade em produzir catástrofes sedutoras. As tragédias da TAM e da Gol àquele momento foram as pautas redentoras – lamentavelmente - para um jornalismo que batia cabeça atrás de notícia.
A imprensa, nesse período de explosão democrática, agonizou conceitual e financeiramente, pois a publicidade dos governos Lula e Dilma foram capilarizadas para todo o país (para todos os pequenos veículos independentes espalhados pelo território nacional e também para as mídias alternativas).
Essa realidade hostil ao pensamento colonizado da nossa imprensa só foi arrefecida com o parto de uma bestialidade político-jornalística: o mensalão. A partir dali, a fantasia voltou a dar as cartas (e o leitor adora uma fantasia).
A imprensa tradicional, portanto, meus caros leitores do 247, estava “presa” nessa máquina de linchamento desde 2005 e, finalmente após seu fetiche doentio ser realizado – a prisão de Lula – ela pode se libertar e voltar a cobrir alguns fenômenos verdadeiramente factuais do nosso horizonte político.
Exemplos: ela começa a prospectar pela primeira vez na sua história a corrupção da nossa elite político-financeira: o PSDB. Isso é inédito. Ela começa mesmo a provocar essas vacas sagradas da nossa justiça política, com muita narrativa transversa e adjetivos sutis.
O dinheiro do PSDB também mingou - vamos dizer assim para sermos educados - porque o país entrou em convulsão econômica. Por que vocês acham que Geraldo Alckmin afunda cada vez mais nas pesquisas? O arrego acabou – e como diz o Capitão Fábio em Tropa de Elite, quando acaba o arrego, acaba o amor.
Em tempo: Lula foi craque até nisso. Sabia que sua prisão iria embolar todo o meio de campo aqui fora. De lá, ele assiste a tudo protegido (não pode mais ser preso: já está; isso pertence às sutilezas semânticas das narrativas em processo), pronto para voltar e tumultuar tudo de novo, seja como uma ideia, seja como presidente eleito, seja como Nobel da Paz, seja como o cabra iluminado que é.
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