Lava Jato adota direito penal do inimigo
"A decisão de Gilmar Mendes de impedir a transferência de Sergio Cabral para um presídio federal é um alento aos que defendem o debate livre e democrático no âmbito da Lava Jato. O ministro tem tido a salutar tarefa de quebrar o pensamento único dominante entre juízes e procuradores da operação. Para o bem das instituições, Gilmar confronta toda e qualquer deliberação punitiva fundada em perseguições ou motivações pessoais. Ainda que suas posições contrariem o senso comum justiceiro", diz o colunista Ricardo Bruno, ao comentar a decisão do juiz Marcelo Bretas, barrada por Gilmar
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A decisão de Gilmar Mendes de impedir a transferência de Sergio Cabral para um presídio federal é um alento aos que defendem o debate livre e democrático no âmbito da Lava Jato. O ministro tem tido a salutar tarefa de quebrar o pensamento único dominante entre juízes e procuradores da operação. Para o bem das instituições, Gilmar confronta toda e qualquer deliberação punitiva fundada em perseguições ou motivações pessoais. Ainda que suas posições contrariem o senso comum justiceiro.
Cabral foi insolente, reconheça-se, mas o que disse nada tem de ameaça. Foram informações já publicadas nos jornais - de domínio público, portanto. Transformá-las em ameaça à família do magistrado é um exagero próprio de quem perdeu os limites do bom senso. O degredo a que o ex-governador estava sendo submetido, como punição adicional aos 72 anos de reclusão, é absolutamente desarrazoado. Juízes e procuradores da Lava Jato precisam entender que prestam relevante serviço à sociedade brasileira ao combater a corrupção. Mas só podem fazê-lo nos limites da lei. Não se deve admitir um milímetro de transgressão, ainda que o propósito seja nobre.
A Lava Jato peca exatamente por entender que, se é para combater a corrupção, pode tudo. Não é bem assim. Nosso código penal nem de longe permite a adoção dos princípios da teoria do direito penal do inimigo. De inspiração fascista, a teoria, de autoria do jurista alemão Gunter Jakobs, propõe a redução de direitos e de proteções penais as pessoas declaradas inimigas da sociedade. Assim, haveria duas castas absolutamente distintas: os cidadãos, a quem todos os direitos estariam garantidos, e o inimigos da sociedade, aos quais se reduziriam as proteções legais. Este não é nosso código penal. A Constituição brasileira em seu artigo 5º refuta qualquer discriminação. “Todos são iguais perante a lei”, determina, embora alguns juízes e procuradores da Lava Jato deem mostras de que não concordem integralmente como este postulado universal.
O maior perigo da Lava jato não é condenar A ou B injustamente, embora isto seja deplorável. Tampouco fragilizar a economia nacional, com a insolvência das maiores corporações empresariais do País. O lado nefasto da operação é a sorrateira e crescente adoção desta teoria esdruxula e arbitrária ao exercício do direito. Moro ao afirmar que vivemos tempos excepcionais nada mais fez do que referendar esta distorção. Gunter Jakobs também dizia que diante de determinados perigos deve-se utilizar qualquer meio disponível para combater o inimigo. Bretas ao condenar Cabral ao desterro num presídio federal, sem motivos sólidos, também incorpora a visão de que contra os inimigos da sociedade vale tudo. Não vale. Para todos, vale a lei.
Bretas parece que esqueceu disto. Resultado: foi desautorizado a bem do direito e da democracia.
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