Kafka num labirinto cinzento
"Um homem preso num prédio misterioso. No filme dinamarquês 'O Penúltimo', a angústia existencial ganha uma forma expressionista e kafkiana"
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"Eu sou apenas o inspetor de águas", repete inutilmente o personagem central de O Penúltimo (Den Næstsidste). Ele chega a um gigantesco edifício no meio do nada para medir o hidrômetro dos moradores. Mas a porta se fecha e o pobre homem se vê trancado num pesadelo kafkiano que pretende simbolizar a triste condição humana. Eis mais um filme dinamarquês a conjugar o insólito com o filosófico.
O edifício é um labirinto cinzento de corredores e recintos vazios que parecem celas. A maioria dos moradores se comporta como uma plateia de autômatos diante do espetáculo da vida alheia. Alguns poucos interagem com o inspetor, a começar por dois gêmeos sinistros que, desde sua chegada, se colocam como sombras a segui-lo impiedosamente. Uma estranha costureira lhe espanca com ferocidade. A fim de ter acesso à chave para sua libertação, o protagonista faz acordos com um suicida atormentado e com uma mulher que lhe propõe casamento em troca da informação preciosa.
A situação do inspetor é tão mais absurda na medida em que seu destino já parece traçado desde a entrada no edifício. A procura obsessiva de uma saída transforma-se assim na sua única razão de viver enquanto o tempo passa estranhamente para uns e não para outros.
Neste primeiro longa de Jonas Kærup Hjort, a angústia existencial ganha uma forma expressionista, inspirada talvez pela biomecânica do teatro de Meyerhold, em que a ação física pretende exprimir estados interiores. Os atores se batem em trabalhos corporais intensos quando não estão congelados em composições simétricas nos cenários minimalistas do misterioso prédio. Os enquadramentos rigorosos e a palheta restrita de cores nos conduzem por uma jornada tão soturna quanto intrigante.
>> O Penúltimo está na plataforma Filmicca.
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