Jogo de falácias de Guedes no depoimento no Senado

Paulo Guedes acha que temos de promover o equilíbrio fiscal, aí incluído o equilíbrio da Previdência Social, para viabilizar a retomada do crescimento econômico. A única forma de promover a retomada do crescimento econômico com a eliminação do desequilíbrio fiscal é a ampliação do gasto público. A colocação de Guedes não passa de uma quimera endereçada aos trouxas

Jogo de falácias de Guedes no depoimento no Senado
Jogo de falácias de Guedes no depoimento no Senado (Foto: Fabio Pozzebom - ABR)


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Paulo Guedes acha que temos de promover o equilíbrio fiscal, aí incluído o equilíbrio da Previdência Social, para viabilizar a retomada do crescimento econômico. Eu sustento, ao contrário, que a única forma de promover a retomada do crescimento econômico com a eliminação do desequilíbrio fiscal é a ampliação do gasto público. A colocação de Guedes não passa de uma quimera endereçada aos trouxas. Falando de desequilíbrios recorrentes na história econômica brasileira, ele omite a essência do problema, ou seja, os custos da dívida pública externa e dos reiterados ajustes internos forçando o aumento da taxa de juros.

A classe dominante e as elites governamentais do país tem imposto à sociedade brasileira custos financeiros intoleráveis, justificados explicitamente por razões ideológicas, mas, no fundo, devidos a pressões do capital financeiro que divide com o grande capital os ganhos extraordinários de juros sem paralelo no mundo. Isso Guedes não inclui na contabilidade dos déficits fiscais. Inclui, sim, a Previdência. E a razão é simples: com truculência fiscal, pode-se reduzir os recursos previdenciários. Já a conta financeira é sagrada.

Duas iniciativas resolveriam estruturalmente o problema fiscal. Primeiro, um programa consistente de retomada da economia financiado por gastos deficitários, na linha do que defenderam Keynes, seu grande divulgador Abba Lerner, eu próprio e um dos pais do Plano Cruzado e do Plano Real recém-chegado ao time, André Lara Resende. É pela via do crescimento financiado deficitariamente e com redução da taxa de juros sobre a dívida pública, num país que emite sua própria moeda, que se reduz o déficit fiscal, levando ao aumento sistêmico da receita pública, sem necessidade de aumento dos impostos.

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A Previdência pode se ressentir de ajustes, mas não por razões financeiras. No plano dos Estados, ao contrário das promessas oportunistas de Guedes, a solução está na restituição de uma dívida paga indevidamente desde 1997, da ordem de 300 bilhões de reais. Os governadores devem rejeitar qualquer tipo de esmola que lhes sejam oferecidas para, em troca de privatização de empresas de água, desistirem dessa exigência, assim como do pagamento das retenções da Lei Kandir e da DRU.

Qual seria a lógica dessa restituição do ponto de vista macroeconômico? Trata-se de um programa de ampliação temporária dos gastos públicos de estilo keynesiano, um New Deal brasileiro, que pode ser eficazmente financiado pelo governo por emissão de títulos públicos em tranches anuais. Claro, o Congresso terá de aprovar uma lei autorizando a emissão desses títulos, à margem da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Emenda 95. O Brasil fez um programa desse tipo, em menor escala, nos anos de 2009 e 2010, rendendo crescimento de 7,5% do PIB nesse último ano, com gasto deficitário de R$ 200 bilhões do Governo através do BNDES.

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Ao lado dessas questões de fundo, a exposição de Paulo Guedes agride a inteligência e a boa fé das pessoas quando trata de regime de capitalização. Esta, aliás, é o objeto de desejo dele, porque atende essencialmente ao apetite da comunidade financeira que ele representa e serve, fingindo-se de funcionário público. Trata-se na verdade de uma patifaria. Quando faz a analogia do jovem que vai escolher entre capitalização e a Previdência, Guedes tem o cinismo de alegar que isso é muito bom para o jovem porque ele aprende desde cedo a escolher formas de investimento. E quem lhe dá o dinheiro? O pai desempregado pela política de Temer e continuada por Guedes?

O modelo de capitalização, como já escrevi, é o túmulo da Previdência pública. Segundo Guedes, os novos contribuintes da Previdência escolherão entre um modelo e outro. Acontece que já conhecemos da história o que significa opção, como foi o caso da troca forçada da estabilidade no emprego (10 anos) pelo FGTS. Roberto Campos, que patrocinou a mudança, tinha corretamente em vista um fundo em favor do trabalhador coletivo financiado por contribuições do patrão, e destinado a financiar também o desenvolvimento. Foi um sucesso até hoje. Guedes, com sua capitalização, tem em vista um fundo para o patrão financiado pelo trabalhador individual.

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Vamos resumir a parte do depoimento de Guedes que ouvi: 1) ao contrário do que diz, o Brasil teve performances espetaculares de desenvolvimento no passado, sem relação com déficit fiscal; assim foi com Getúlio, com Juscelino e com os militares; 2) o desequilíbrio que nos atingiu duramente foi o externo, no início dos anos 80, pelo qual não tivemos culpa porque havíamos tomado crédito externo em condições favoráveis, e os EUA alteraram discricionariamente as condições dos juros; 3) daí para frente tivemos desequilíbrios inflacionários, resultante sobretudo de condições cambiais; 4) no governo Lula, graças à explosão de preços e quantidades vendidas de commodities, fizemos um confortável colchão de reservas internacionais; 5) só a estupidez da política econômica interna nos impede de voltar ao ciclo de uma das dez maiores economias do mundo, sem qualquer sacrifício dos beneficiários atuais e futuros da Previdência Social.

A reforma previdenciária proposta por Guedes é uma afronta à sociedade brasileira, desde os aposentados (que por sua regra não mais terão seus proventos corrigidos anualmente) aos novos contribuintes. Deve ser rechaçada. O Congresso, independentemente de partidos e ideologias, tem o dever e o poder de mandar a reforma para o lixo e Guedes para atender aos interesses próprios em casa. No ponto essencial da reforma, a palavra de ordem deve ser: Ou você destrói a capitalização, ou a capitalização destrói a Previdência pública!

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