Inquérito do STF: os mercadores do golpe e o garantismo de ocasião

Presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes
Presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes (Foto: REUTERS/Adriano Machado)


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No dia 07 de setembro do ano de 2021 na cidade de Brasília, capital da República, fileiras e fileiras de ônibus de luxo vindos dos mais diversos lugares do país eram estacionados na Esplanada dos Ministérios e em locais próximos. Deles desciam pessoas vestidas de verde e amarelo que passavam a se aglomerar no gramado em frente ao Congresso Nacional. Várias portavam faixas com frases pedindo a “volta do AI-5”, fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF), além de vários ataques a ministros daquela Corte. Em horários específicos, era possível ver pessoas distribuindo marmitas de alimentação aos “militantes”.

O presidente da República lá esteve e, em um discurso inflamado sobre “uma pessoa específica” que estaria “barbarizando” a população, afirmou que não aceitaria mais “prisões políticas”.

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Das diversas perguntas possíveis sobre o ato autointitulado democrático que pedia o fim da democracia, farei apenas uma: quem pagou por isso? 

A decisão do ministro do STF, Alexandre de Moraes, na última terça-feira (23), estipulando uma série de medidas cautelares contra os oito empresários bolsonaristas que foram alvos de notícia-crime protocolada pela Coalizão para Defesa do Sistema Eleitoral, por defenderam um golpe de Estado em caso de vitória do ex-presidente Lula nas eleições, em mensagens de grupo de WhatsApp, causou grande polêmica sobre a legalidade da ação. 

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Além de mandados de busca e apreensão, Moraes determinou quebra de sigilo e bloqueio das contas bancárias dos empresários, de suas contas nas redes sociais e tomada de depoimentos. Os procedimentos atendem à investigação que apura o financiamento da disseminação, nas redes sociais, de ataques às instituições, ao Estado de Direito e à democracia.

Informações sobre esse grupo começaram a ser levantadas nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos. E são hoje um dos pilares do Inquérito 4.874/DF, que investiga as milícias digitais. Delegados da Polícia Federal (PF), que respondem diretamente a Moraes, apontaram a existência de quatro núcleos: o primeiro voltado para produção de notícias falsas, o segundo de divulgação desse material nas redes, um terceiro composto por políticos, e um quarto por financiadores, onde se situam os empresários ora investigados.

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Parte curiosa do debate é ver membros/as do Ministério Público Federal (MPF), incluindo o próprio Procurador-Geral da República, Augusto Aras, se insurgindo contra as medidas tomadas. Isso porque a investigação sobre a existência de uma organização criminosa que atente contra o Estado de Direito, as instituições e a própria democracia deveria ser de interesse do Ministério Público (MP), aliás de impulso do próprio, vez que faz parte de suas atribuições constitucionais é de velar pela defesa da ordem jurídica e dos interesses indisponíveis da sociedade, pela fiel observância da Constituição e das leis.

Ao invés disso, membros do MP se somam a uma fala que tenta desqualificar o Inquérito, minimizando a gravidade das conversas no aplicativo WhatsApp em que empresários defendem a possibilidade de golpe no Brasil. Uma procuradora e ex-coordenadora da operação Lava Jato que, como é de conhecimento geral, nunca se importou com o cumprimento de qualquer norma processual penal ou constitucional, chegou a dizer, em uma entrevista, que os empresários são “senhores de idade” sem qualquer capacidade para articular um golpe de Estado. Uma afirmação bizarra, pra dizer o mínimo. Sobremaneira, porque a idade dos empresários, mesmo se idosos fossem, não entra em questão. Suas gordas contas bancárias e como podem usá-las para finalidade ilegal, sim.

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O número de apoiadores lavajatistas que aplaudiram conduções coercitivas sem qualquer intimação prévia, o espetáculo das delações premiadas de réus presos, prisões preventivas ilegais produzidas por um juiz e procuradores que se comportavam como pop star, e que agora apontam o dedo para as medidas adotadas por Alexandre de Moraes, suscitando possíveis ilegalidades, é impressionante. Faz quase parecer que temos uma maioria de juristas garantistas no país, preocupados com o direito de investigados, buscando evitar excessos. Seria a prática do óbvio, se o óbvio não atendesse pelo nome de hipocrisia.

Estamos, como sociedade brasileira, diante de desafios históricos. Dentre eles, a existência de coletivos, compostos por cidadãos que ocupam cargos públicos e outros com alto poder econômico, com intenção de utilizar dos instrumentos a que têm acesso para desestabilizar a democracia, questionando o resultado das eleições de 2022, sob o forjado argumento de fraude nas urnas eletrônicas.

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Evidentemente, a solução jurídica a ser buscada pelos órgãos judiciários, seja o STF ou qualquer outro, deve ter por base as garantias de investigados e réus e guiar-se pelos valores constitucionais da dignidade da pessoa humana, que são fruto de uma longa evolução histórica.

Por outro lado, as conversas que vieram a público, divulgadas por um membro do grupo de WhatsApp, não podem ser interpretadas de forma leviana como vêm sendo por alguns atores. 

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Tanto pela identificação social de seus interlocutores, quanto pelo seu conteúdo, os diálogos merecem uma abordagem séria e firme. Não se trata de um bate-papo informal entre estudantes ou amigos jovens, tampouco sobre temas banais. São cidadãos com altíssimo poder econômico falando em golpe com todas as letras, pregando de maneira direta o afastamento da democracia representativa, com o retorno do Estado de Exceção, deixando de reconhecer o resultado das eleições livres e diretas que serão realizadas em outubro próximo.

São cidadãos que podem mobilizar altos recursos para viabilizar suas intenções. O que guarda total pertinência com o objeto investigado no inquérito das milícias digitais. O que precisa se verificar é, a partir dos indícios, o que está em operação.

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Não há qualquer dificuldade em alinhavar a defesa dos princípios garantistas à defesa da própria democracia, sem a qual eles não podem subsistir. O que implica, na prática, a necessidade de atingir o coração da arquitetura da aventura golpista de Jair Bolsonaro e seus asseclas, que é o financiamento dos atos.

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