Impeachment de Crivella também é golpe
O jornalista Ricardo Bruno questiona os fundamento do processo de impeachment do prefeito do Rio, Marcelo Crivella: "A alegação apresentada é desprovida de fundamento legal. Não fosse a fragilidade política do prefeito seria desprezada no lixo das peças burocráticas sem utilidade. Não se refere à corrupção, malversação de recursos públicos, favorecimento pessoal ou algo da mesma gravidade"; e compara o caso dele com o golpe contra Dilma: "A exemplo do fizera a Câmara federal com Dilma Roussef, a Câmara de Vereadores do Rio agiu com requintes de perfídia e com motivação puramente política"
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A administração do prefeito Marcelo Crivella tem problemas. A máquina não tem conseguido dar respostas efetivas às exigências cada vez maiores da sociedade. Fala pausada, semblante sereno, ora compenetrado ora contemplativo, Crivella não tem obviamente o “physique de role” do carioca. Faltam-lhe malemolência e gosto por estereótipos símbolos da vida na cidade, resumidos em samba, cerveja e futebol. A origem de seus problemas é difusa: tanto pode ser a herança de compromissos demasiadamente inflados por conta da Copa e dos jogos Olímpicos quanto a sua incapacidade de encontrar saídas num cenário adverso. O fato é que existem ,sim, muitos problemas na administração. Não há, contudo, nada, que nem de longe justifique o pedido de impeachment, aprovado pela Câmara de Vereadores.
A alegação apresentada é desprovida de fundamento legal. Não fosse a fragilidade política do prefeito seria desprezada no lixo das peças burocráticas sem utilidade. Não se refere à corrupção, malversação de recursos públicos, favorecimento pessoal ou algo da mesma gravidade. Administrações públicas, Brasil a fora, fazem e renovam concessões, como a do mobiliário urbano carioca, sem qualquer risco de questionamento, pois fundamentam-se em jurisprudência de reconhecimento inquestionável. As controvérsias sobre o caso justificariam se tanto uma comissão parlamentar de inquérito. Mais, seria ultrapassar o limite do bom senso e usar o dispositivo legal em desrespeito à soberania do voto popular.
A exemplo do fizera a Câmara federal com Dilma Roussef, a Câmara de Vereadores do Rio agiu com requintes de perfídia e com motivação puramente política. Esperou pacientemente o prefeito se desidratar até a percepção de uma espécie de estado de coma político - após os desgastes da intervenção nas linhas do BRT, das ameaças de interrupção dos bondinhos do Centro e dos tropeços na harmonia do financiamento do carnaval. Para, então, garroteá-lo em público. Debilitado, Crivella tornou-se presa fácil da Gaiola de Ouro, onde alguns notórios vereadores, de práticas nem sempre republicanas, buscam espaços na administração, com métodos bastante heterodoxos.
Os edis exibem suas digitais ao tentarem mudar a lei orgânica para, em caso de afastamento definitivo do prefeito, subtrair da sociedade o direito de escolher o sucessor. Em resumo, querem retirar Crivella para eles próprios assumirem o poder num movimento que visa tão somente a partilha do butim.
Se abertura do processo de impeachment de Crivella tem pouco ou quase nada de fundamento legal, sobram suspeições de que os objetivos não sejam republicanos e guardem em seu bojo o desejo inconfesso de manietar o chefe de executivo em busca de vantagens pessoais. No Brasil de hoje, governos politicamente fracos não conseguem se manter de pé se, a exemplo de Michel Temer, não entregarem parte do poder ao Legislativo. O impeachment deixou de ser regra excepcional para sanar casos de gravidade ética extrema. Foi banalizado para atender interesses escusos e em desfavor do estado democrático de direito. Tal qual vem sendo utilizado, o impeachment é um despautério. Ético e legal. Assim como o de Dilma, o impeachment de Crivella também é golpe. O golpe da Gaiola de Ouro.
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