Impeachment à brasileira
Permitir que se demova de seu cargo legitimamente conquistado pelo voto soberano de 54 milhões de eleitores, um presidente da República, em função da desídia de um Parlamento cheio de réus, denunciados, investigados pela Justiça, é ajudar abrir a caixa de pandora de todos os malefícios, malquerenças, interesses escusos, antinacionais, antipopulares e antidemocráticos que hoje não ousam mostrar a sua cara
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O advogado geral da União, José Eduardo Cardozo, teve a oportunidade de ministrar uma excelente aula aos conspiradores presentes na Comissão Especial do Senado da República, que analisa o pedido de admissibilidade do processo de impeachment contra a Presidente Dilma Rousseff. Citando um autor argentino que estudou os vários processos de impeachment ocorridos na América Latina, ele chegou a uma constatação curiosa: esse instituto constitucional vem sendo empregado no subcontinente sul-americano como um remédio para resolver crises eminentemente políticas.
Ou seja, naqueles casos onde há "legislaturas beligerantes" contra o ocupante do Poder Executivo, o processo de impedimento contra o Presidente, substitui o clássico voto de censura, no regime parlamentarista, lançado sobre o governo, quando a maioria parlamentar e seu gabinete de ministros perde a confiança de seus pares e da sociedade. No Parlamentarismo, a figura do Chefe de Estado (o Presidente) é preservada, enquanto a crise política é resolvida pela convocação de novas eleições gerais.
Disse José Eduardo Cardozo que o uso que vem se fazendo do instituto do impeachment no Brasil, na ausência de amortecedores e para-choque para a crise, é absolutamente inadequado, inconstitucional, uma vez que na falta de crime de responsabilidade ou de tipos penais que justifiquem o processo contra Dilma, estão querendo usar o impeachment para tirar a presidenta da República, de qualquer jeito, por qualquer motivo ou justificativa.
Ingovernabilidade, falta de apoio, gestão temerária, impopularidade, enfim, crise política não é base legal para o impedimento de um ocupante da Poder Executivo Federal. O uso inadequado (para não dizer golpista) desse instrumento constitucional equivale a uma banalização do impeachment e a uma insegurança jurídica para qualquer governante que se sente na cadeira de presidente da República. O uso golpista do processo de impedimento permite que qualquer maioria eventual – produzida por uma união eventual de interesses na Câmara e no Senado – possa mover esse processo contra o governante de turno, seja de que partido for, tenha ou não cometido crime de responsabilidade.
Naturalmente, num ambiente como esse, onde a desinformação e a má-fé andam juntas, muito ajudadas pela ação reconstrutiva dos meios de comunicação de massa, a suprema corte judiciária do País teria a grande responsabilidade de fazer valer a Constituição, esclarecendo, através de seus pareceres e sentenças, o perigoso equívoco de se usar o expediente impeditivo como antídoto contra a eventual beligerância do Parlamento ou o revanchismo da oposição ou um meio diversionista daqueles que estão hoje na mira da Justiça (como o presuntivo futuro vice-presidente da República, Eduardo Cunha).
Os ministros são, por força da lei, os guardiões da Constituição, são os principais responsáveis pela chamada jurisdição constitucional, são eles que dizem a lei, não podem – por consequência – se omitirem diante desse possível estrupo constitucional, dessa ruptura constitucional, sob pena de serem acusados de coniventes, acovardados e omissos diante da crise que se avizinha. Permitir que se demova de seu cargo legitimamente conquistado pelo voto soberano de 54 milhões de eleitores, um presidente da República, em função da desídia de um Parlamento cheio de réus, denunciados, investigados pela Justiça, é ajudar abrir a caixa de pandora de todos os malefícios, malquerenças, interesses escusos, antinacionais, antipopulares e antidemocráticos que hoje não ousam mostrar a sua cara.
Mas uma vez consumado o golpe, não terão nenhum escrúpulo de aprovar no congresso, aquilo que negaram à Presidente da República, para dessangrá-la até a paralisia e a inação do Poder executivo.
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