Governo não pode criar caos
O advogado e ex-deputado federal constituinte Vivaldo Barbosa escreve sobre Bolsonaro e sua capacidade de contradizer a função precípua de um presidente da República e construir o caos a cada instante
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Por Vivaldo Barbosa
Ao longo da história dos povos e dos Estados, observa-se que os governos procuram manter ordem interna e estabilidade para evitar caos que pode levar à erosão da sua própria autoridade. Em momentos, é feito por meio do funcionamento das instituições, em outros até pela força bruta. Não há exemplos nem situações de os próprios governos procurarem criar o caos. Seria o sumo da insensatez. As grandes revoluções, sim, podem ser geradas em meio ao caos que muitas vezes as alimentam para atingir as transformações que pretendem.
No Brasil de hoje, o governo de Bolsonaro e seus filhos fabrica caos a todo momento.
Noticiou-se que Bolsonaro viu, de madrugada, uma manifestação insensata de alguém contra a vacina chinesa por ser chinesa, seria uma vacina comunista. No dia seguinte, Bolsonaro decreta que não vai comprar a vacina chinesa. Transforma manifestação de um insano em política pública, em decisão de governo. Isto, depois de seu Ministro da Saúde tê-lo avisado que acabara de ordenar a compra de milhões dessa vacina. E o povo brasileiro aguardando ansioso, como todo mundo, a salvação pela vacina, vê seu presidente tomar atitude dessa natureza.
Bolsonaro ataca governadores e prefeitos a toda hora, gerando desencontros e ausência de entrosamento administrativo. Nem no momento que o Brasil e o povo brasileiro mais precisavam de entrosamento entre todas as esferas administrativas diante da eclosão do corona vírus, o Presidente procurou articular uma política nacional de enfrentamento da pandemia. Ao contrário, ele e seus filhos ficaram dando cotoveladas a toda hora até em Ministros. Os próprios Ministros vivem trocando cotoveladas. Dois Ministros da Saúde foram defenestrados. E, agora, para culminar, o General Ministro da Saúde, de tantas estrelas, disse que não conhecia o SUS. Um General dizer que não conhece a Constituição brasileira, pois o SUS está lá, é estarrecedor! Sempre foi da formação do oficialato brasileiro o estudo do País, do povo, da nossa cultura, do nosso território, nossas riquezas, nossos interesses, das nossas instituições. Com a conquista do poder político e administrativo, com o golpe em 1964, passaram a se interessar mais por cargos e nomeações. Outro dia, um general chefe foi flagrado tentando nomear a filha para alto cargo em Brasília. É preciso reconhecer que em mais de treze anos de governos de esquerda, não se procurou retomar a orientação nacional das nossas Forças Armadas.
É impressionante verificar que os generais que estão no Palácio e no comando de tanta coisa aceitem que o capitão presidente seja o maior criador de caos no País. O capitão foi jogado pra fora cedo, não pôde fazer os estudos necessários, mas os generais de muitas estrelas deveriam ter estudado as questões fundamentais da sobrevivência dos Estados e do funcionamento dos seus governos. Outro dia o General que já foi porta voz e hoje é crítico referiu-se que deveriam ser menos bajuladores e conhecer as lições das batalhas, como das Guerras Púnicas de Roma contra Cartago, lembrou. Vale a pena relembrar outro exemplo de um dos maiores generais de todos os tempos, quando feito governante, estadista: Napoleão Bonaparte. Todos os generais certamente estudaram muito Napoleão, ou deveriam.
Napoleão, feito Cônsul após o 18 Brumário, procurou pacificar as correntes internas que vinham em atritos desde a Revolução de 1789, para evitar atritos e tensões. Das primeiras medidas foi pacificar as relações com a Igreja Católica, que tivera terras expropriadas e distribuídas pela Revolução, igrejas fechadas, bispos e padres submissos ao Estado. Procurou o Papa de então (o anterior havia sido preso pelas forças de Napoleão e morto na prisão) e celebrou com ele uma Concordata. E fez entendimentos até com grupos monarquistas, procurou se acertar com áreas mais radicais. Como General, Napoleão havia combatido batalhas. Como estadista, governante, sabia que precisava governar, fazer a administração pública funcionar para atender às necessidades do povo. Sabia que não podia criar caos. Ao contrário, o governante deve procurar propiciar estabilidade. Os generais do Palácio deveriam saber disto.
Nossas aflições ficam maiores quando vemos os presidentes da Câmara e do Senado concentrados em procurar contornar as regras proibitivas de suas reeleições e em aprovar as medidas neoliberais de desmonte do Estado, retirada de direitos e desnacionalização da nossa economia. Anularam o Congresso Nacional, sem Plenário, sem comissões, sem debates. Ambos do DEM, partido que apoiou a ditadura e, juntamente com o PSDB, constituem o mais forte grupo político neoliberal. E boa parte dos Ministros do STF transformados em atores nos meios de comunicação a dar respaldo aos acontecimentos. Nossas instituições de contenção não desempenham seu papel.
Faltam só dois anos. Ainda bem.
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