Golpe mostra aos jovens a que veio: desemprego e miséria

O diabo é que boa parte dessa juventude que hoje é vítima do golpe, isto é, da crise econômica, foi às ruas quando o Brasil vivia pleno emprego e saúde de boi premiado



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A juventude vai descobrindo o real motivo do impeachment de Dilma Rousseff, o golpe de Estado em 31 de agosto de 2016: a criação de desemprego e a ampliação da miséria no país.

Reportagem neste domingo (25) do espanhol El País, em tom de ironia, diz que “a primeira crise a gente nunca esquece” ao abordar que a juventude brasileira nascida na prosperidade está enfrentando pela primeira vez uma recessão econômica.

Grosso modo, entende-se por “recessão” a concentração do consumo nas mãos da parcela mais rica da sociedade. A outra fica com o desemprego e a miséria.

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O diabo é que boa parte dessa juventude que hoje é vítima do golpe, isto é, da crise econômica, foi às ruas quando o Brasil vivia pleno emprego e saúde de boi premiado. Note que tudo começou em junho de 2013…

Aliás, os franceses se perguntavam na época por que os jovens brasileiros protestavam — não era por vinte centavos! – haja vista o cenário de pleno emprego, políticas de inclusão para as universidades, aumento real nos salários, enfim, tudo que o resto do mundo sonhava ter.

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Leia a matéria do EL PAÍS:

Novatos na crise: jovens brasileiros enfrentam por primeira vez uma recessão e um impeachment

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Com o fantasma do desemprego batendo à porta, brasileiros entre 20 e 30 anos, que fazem parte da chamada geração milênio, estão reavaliando prioridades e adiando sonhos

Heloísa Mendonça/María Martín

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A primeira crise a gente nunca esquece. E a deles está sendo dupla. Acostumados com a prosperidade econômica da última década, jovens brasileiros nascidos no final da década de 80 ou 90 – que fazem parte da chamada geração milênio – estão enfrentando, pela primeira vez, um cenário de forte recessão econômica em meio a uma turbulenta crise política. Muitos eram pequenos quando Fernando Collor saiu por impeachment em 1992, e outros só tinham ouvido seus pais falarem a respeito dessa passagem da vida brasileira até então.

A maioria deles viveu boa parte da vida em um país com a inflação baixa, renda e consumo em alta e a escassez de gente para preencher postos de trabalho. Viveram a fase do pleno emprego. Porém, diante de um cenário inverso, esses jovens, que até então priorizavam a realização pessoal ao procurar um trabalho e não pensavam duas vezes antes de se arriscar em novos projetos, estão reavaliando prioridades e adiando alguns sonhos. Pior, começaram a se deparar com o fantasma do desemprego.

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A paulista Fernanda Lensky, de 23 anos, faz parte do grupo que viu seus planos serem alterados pela crise no mercado de trabalho. No ano passado, ela e o pai ficaram desempregados. Mãe de um menino de quatro anos, ela teve que trancar a faculdade e optou por ficar em casa para cuidar do filho e economizar nos gastos da escola do garoto, que já não estuda em tempo integral. O mesmo caminho tomou o estudante de história Nickolas Valverde, de 24 anos, que após ter sido demitido de uma empresa terceirizada teve que sair da faculdade já que a família não podia ajudar financeiramente a pagar a mensalidade. “Meus sonhos não vão mudar, infelizmente só vou ter que esperar um pouco mais para me transformar em um cientista social e professor de história”, explica.

Casos como o de Fernanda e Nickolas estão se tornando cada vez mais comuns. Só no ano passado, de acordo com dados o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desocupação entre jovens entre de 18 a 24 anos chegou a 16,8% e foi a que mais cresceu entre as faixas etárias. Segundo uma pesquisa da agência Consumoteca, nos últimos dois anos foram exatamente esses jovens os que mais adiaram ou abandonaram planos e, particularmente, os da classe C são os que mais sentem o efeito da crise econômica no Brasil. “O que preocupa é que teremos uma geração menos escolarizada e menos preparada para o mercado de trabalho. Todos esses nem-nens (que não estudam e nem trabalham) podem encontrar uma nova dificuldade de inserção quando a crise passar”, afirma Michel Alcoforado, antropólogo e sócio fundador da Consumoteca.

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O especialista explica, no entanto, que a crise atinge os milênios de maneira diferente. No outro extremo, entre os mais ricos e escolarizados, a recessão afeta menos mas os assusta mais. “Eles são os mais temerosos porque já possuem diversas obrigações, como a de pagar o aluguel, estão sobrecarregados e temem perder o emprego”, explica. Embora esses jovens não tenham cultivado muitas aspirações de bens de consumo como os da geração passada, eles estão acostumados a um estilo de vida em que se gasta muito com viagens, bons restaurantes, bares e festivais de música. “Não querem perder esse estilo de vida e, por isso, procuram empregos que estejam à altura dos seus padrões de vida, como o de concursado”.

O mineiro Gustavo*, de 25 anos, que trabalha na área de Tecnologia da Informação (TI), chegou à conclusão que para manter o estilo de vida almejado por ele, sem ter uma vida profissional estressante, o caminho é prestar um concurso público. “Gosto do que faço, mas o ambiente corporativo está cada vez mais cruel e competitivo. Em novembro, vou dar meu aviso prévio e focarei em estudar para o concurso”, explica. Em tempos de vacas magras, Gustavo optou por voltar à casa dos pais para tentar diminuir os custos e se concentrar no desafio de se tornar servidor público.

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Preocupada com o desaquecimento do mercado, Cristina Jaber, de 31 anos, decidiu deixar de lado uma empresa que criou de mídias sociais e voltou a um emprego fixo de carteira assinada. “A possibilidade de estar empregada e com algumas garantias para enfrentar o cenário de crise atual foi decisiva para tomar essa escolha que não era a que eu pretendia”, explica.

A crise, no entanto, pode acabar gerando um lado positivo: o de tornar essa geração mais madura, segundo o doutor em comunicação Dado Schneider, que estuda há anos o comportamento das novas gerações. “Os jovens terão que engolir mais sapos no ambiente de trabalho. Antes, a maioria deles renunciava na primeira dificuldade ou desentendimento. Agora que não há tantas opções terão que lidar com chefes difíceis [mesmo contrariados]. A crise servirá para que finalmente essa geração amadureça”, argumenta. Hugo Machado, um jovem carioca de 23 anos, que no ano passado perdeu seu primeiro emprego, ilustra essa mudança: “Eu percebi que com a crise fiquei mais responsável, me espelho mais nos meus pais na hora de cuidar da casa e não fico mais jogando dinheiro fora com coisas desnecessárias. Eu saía bastante para beber, comprava muita roupa que não precisava e gostava muito de viajar”.

Schneider lamenta, no entanto, a falta de interesse da maioria dos jovens milênios na política brasileira em um momento tão decisivo do país. “Hoje vivemos um novo processo de impeachment, mas essa geração não tem lembrança do Collor e nem procura saber”, afirma.

Falta de representatividade política

Ainda que seja arriscado generalizar uma geração com jovens tão diferentes, um ponto em comum defendido por muitos deles é a falta de uma figura que possa representá-los na política. A maioria dos entrevistados pelo EL PAÍS para esta reportagem se diz contra o impeachment de Dilma Rousseff, mas afirma não se sentir representado por nenhum partido.

“Eu não acredito que a solução seja azul ou vermelha. O que a gente vive hoje é uma crise generalizada do sistema em que ambas cores estão inseridas. Não sou a favor do Governo, mas não consigo apoiar o impeachment e tampouco a oposição”, diz Cristina Jaber que não participou de nenhuma manifestação neste ano.

Essa pode ser, inclusive, uma das explicações para a pouca adesão de jovens registrada nos diferentes atos realizados neste ano, tanto contra como a favor do Governo. Segundo levantamento do Datafolha, no primeiro protesto contra a presidenta, que contou com 210.000 manifestantes na avenida Paulista, só 6% dos presentes tinham entre 12 e 20 anos de idade. Nos protestos contra o impeachment de Dilma, os sinais de engajamento dos jovens foram ainda menores. Numa manifestação contra a saída da presidenta realizada em agosto do ano passado em São Paulo, com 37.000 pessoas, e outra em dezembro, com 55.000 participantes, os mais jovens nunca passaram de 5%, segundo o Datafolha. Só no ato deste ano, que contou com a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a participação dessa faixa etária foi um pouco maior, chegando a 10% dos presentes.

Se comparado com atos ocorridos em 1992, que pediam o afastamento do ex-presidente Fernando Collor, o engajamento de hoje parece ainda menor. Naquela época, o estudante de “cara pintada” era o símbolo das manifestações contra Collor. “Hoje, os estudantes não se sentem representados por ninguém e se distanciam da política”, afirma o antropólogo Michel Alcoforado.

* O entrevistado preferiu não ter o seu nome publicado.

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