Gilberto Carvalho rejeita “entrevista a jornal que articulou o golpe"
"Estes espaços só servem para legitimar a brutal distorção diária que Estadão, Globo, VEJA fazem, massacrando um projeto popular, que cometeu erros, é verdade, mas que salvou milhões de pessoas. Essa imprensa que planta o ódio e a nossa criminalização é a grande arma contra nós, fingindo um verniz de democracia e pluralidade. Portanto, agora que estou desobrigado de ser governo, não posso contribuir com essa farsa", disse Gilberto Carvalho, ao explicar por que não fala mais com veículos da imprensa oligárquica; coluna de Paulo Moreira Leite
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A partir de agora você vai ler um diálogo por email entre Gilberto Carvalho, ministro nos primeiros doze anos de governo Lula-Dilma, e uma repórter do Estado de S. Paulo, cujo nome será preservado. Preparando uma reportagem a jornalista enviou um email a Gilberto:
– Oi, ministro. Conto com o senhor para uma entrevista?
– Não posso dar a entrevista. Nada com você, respondeu Gilberto Carvalho. E acrescentou: "Um jornal que nos desmoraliza e articulou o golpe não é espaço em que a gente deva se expressar. Espero sua compreensão."
A jornalista respondeu:
– Poxa, que pena. Lamento. O jornal está abrindo espaço pro senhor. Em seguida, qualificou: "um espaço privilegiado." Continuando, a jornalista disse: "Mas enfim, sua decisão. Respeito."
A tréplica de Gilberto Carvalho foi mais longa e merece se lida na íntegra:
– Obrigado. Mas estes espaços só servem para legitimar a brutal distorção diária que Estadão, Globo, VEJA fazem, massacrando um projeto popular, que cometeu erros, é verdade, mas que salvou milhões de pessoas. Essa imprensa que planta o ódio e a nossa criminalização é a grande arma contra nós, fingindo um verniz de democracia e pluralidade. Portanto, agora que estou desobrigado de ser governo, não posso contribuir com essa farsa. Portanto, nada contra você, que está convidada a refletir sobre o papel que você e suas matérias têm neste processo. Boa sorte.
Em mais de 40 anos de jornalismo, já li e ouvi muitas críticas ao trabalho de repórteres e editores. Mas poucas vezes li algo tão implacável como o comentário de Gilberto Carvalho – por escrito, por email, com as consequências que é possível imaginar.
Num país onde os grandes meios de comunicação sobrevivem em regime de monopólio, a reação mais comum é uma postura de submissão contrafeita, de quem conhece muito bem os males que o pensamento único causa à vida em sociedade mas tem esperança de aproveitar as raras brechas abertas e salvar a própria pele com um tratamento amistoso e compreensivo. Gilberto deu um grito de dignidade e inconformismo.
A lamentar, apenas o comentário profissional que se gaba de oferecer aquilo que considera "um espaço privilegiado." Mesmo considerando que a afirmação tem um elemento de verdade – o espaço de nossa mídia é realmente destinado para poucos – cabe reconhecer que o problema reside aí. É dessa forma que jornais e jornalistas se enxergam.
Nascida na sociedade industrial, palco de interesses diversos e conflitantes, séculos antes de Bill Gates, Steve Jobs e Mark Zukerberg, aquilo que nos tempos de Gutemberg se chamava de imprensa nascia para construir a democracia e o diálogo entre os homens e mulheres, derrotando o mundo de privilegio, dos bem nascidos e escolhidos.
No Brasil de 2016, aquele em que ocorre o massacre de "um projeto popular, que cometeu erros mas salvou milhões de pessoas," como escreveu Gilberto Carvalho, assiste-se a um novo esforço de concentração do monopólio da mídia, pela intervenção do governo Temer na Empresa Brasil de Comunicação. Pela destituição de Ricardo Melo, diretor-presidente da empresa, com um mandato legítimo de quatro anos para ser cumprido, o que se quer é colocar a EBC na linha dos grandes monopólios, aqueles que consideram seu espaço "um privilégio" e não um direito da cidadania.
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