Getúlio colocou presidente na chefia das Forças Armadas
"O presidente comanda ou nomeia quem comande as tropas do país em tempos de guerra. Em tempos de paz, portanto, o presidente não tem como atribuição qualquer ingerência sobre Exército e Marinha. O dispositivo foi modificado na constituição seguinte, a de 1934, promulgada por Getúlio Vargas sob pressão do estado de São Paulo", escreve Alex Solnik
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A primeira constituição da era republicana, promulgada pelo marechal Deodoro da Fonseca, em 1891, dizia o seguinte no artigo 48 inciso 3o. acerca de uma das atribuições do presidente da República:
“Exercer ou designar quem deva exercer o comando supremo das forças de terra e mar aos Estados Unidos do Brasil quando forem chamadas às armas em defesa externa ou interna da União”.
Ou seja: o presidente comanda ou nomeia quem comande as tropas do país em tempos de guerra.
Em tempos de paz, portanto, o presidente não tem como atribuição qualquer ingerência sobre Exército e Marinha.
O dispositivo foi modificado na constituição seguinte, a de 1934, promulgada por Getúlio Vargas sob pressão do estado de São Paulo.
Eis o que diz o inciso 7o. do artigo 56 no capítulo das atribuições do presidente da República:
“Exercer a chefia suprema das forças militares da União, administrando-as por intermédio dos órgãos de alto comando”.
Tendo em mente permanecer no poder por um longo período, chamou para si o comando das tropas, das quais precisou para dar o golpe do Estado Novo, em 1937.
A ”polaca”, como ficou conhecida a constituição de 1937, confirmou o dispositivo da anterior, apontando no inciso g do artigo 73 qual é uma das atribuições do presidente:
“Exercer a chefia suprema das forças armadas”.
A constituição seguinte, promulgada em 1946. finda a ditadura Getúlio, manteve a redação, provavelmente porque seus autores, os deputados constitucionalistas, entenderam que um presidente civil no controle das forças armadas impediria novas ditaduras militares.
Não impediu.
Prova disso foi que João Goulart, mesmo amparado pelo inciso XI do artigo 87 da constituição de 1946 que lhe garantia o comando das forças armadas, foi derrubado por elas.
Não há dispositivo, na constituição, que impeça traições – militares ou civis.
A constituição da ditadura militar de 64, promulgada em 1967, conservou o presidente na chefia das forças armadas no inciso XII do artigo 83, o que parecia lógico, visto que pressupunha longo período de generais – e de quatro estrelas – na presidência da República.
Também pareceu adequado, aos deputados que escreveram a “constituição cidadã”, em 1988, conservar esse dispositivo, como está no inciso XIII do artigo 84, talvez mais uma vez entendendo que o controle civil sobre os militares evitaria novas ditaduras. Emendado em 1989, o artigo permitiu maior interferência ainda no Exército, na Marinha e na Aeronáutica, estendendo as atribuições do presidente:
“Exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais generais e nomeá-los para os cargos que lhes são privativos”.
Estamos vendo, entretanto, que um presidente com aspirações a ditador, como ocorre com Bolsonaro, pode usar essa cláusula a seu favor. Ganha o direito de determinar, inclusive, em caso extremo, que tropas o protejam em caso de se recusar a deixar o Palácio do Planalto se derrotado nas urnas em 2022.
Os exemplos históricos mostram que presidente comandar as Forças Armadas é mais nocivo que benéfico à democracia. Não impede que presidentes civis sejam golpeados, mas permite que presidentes autoritários deem golpes.
Nem o presidente da República deve interferir nas Forças Armadas, nem as Forças Armadas na Presidência da República. E tanto um quanto outro devem se comportar dentro dos limites de poder estabelecidos na constituição em vigor.
Prefiro a redação da primeira constituição republicana, que só facultava ao presidente comandar as forças armadas “quando forem chamadas às armas em defesa interna ou externa da União”.
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