França e Israel unidos no golpe do Líbano

Policiais franceses estão atuando no Líbano para "investigar" e punir os culpados pela explosão em Beirute, enquanto aumenta a pressão contra o governo e o Hezbollah

Benjamin Netanyahu (Israel) e Emmanuel Macron (França)
Benjamin Netanyahu (Israel) e Emmanuel Macron (França) (Foto: Stephane Mahe/Reuters)


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Por Juca Simonard

Durante o final de semana, antes da queda de setores do governo libanês, escrevi uma reportagem sobre a situação no Líbano, falando sobre o aproveitamento da explosão trágica em Beirute pelo imperialismo, principalmente o francês - mas também norte-americano -, para modificar o regime político. O que foi dito naquele momento se confirma cada vez mais. 

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A pressão aumentou contra o governo, que tem apoio do Hezbollah, partido político nacionalista, de caráter anti-imperialista. Ministros e parlamentares renunciaram, no momento em que protestos tomaram conta de Beirute. As manifestações, elogiadas pela imprensa capitalista internacional (inclusive a brasileira), têm o apoio dos franceses, dos Estados Unidos e de Israel, principal foco de controle político do imperialismo no Oriente Médio - a força fundamental de contenção e perseguição ao nacionalismo árabe.

Atos de direita apoiados pelo imperialismo

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Os atos são claramente de direita, uma vez que dirigentes do Hezbollah e o presidente Michel Aoun apareceram simbolicamente enforcados nas manifestações. O Hezbollah - para que não haja dúvida sobre isso - é um gigantesco partido político armado que lidera até hoje o processo de resistência contra a dominação estrangeira sobre o país. Em sua coluna no Diário Causa Operária, Eduardo Vasco lembra que “em 2006, quando Israel tentou novamente invadir o país, foi o Hezbollah quem travou o combate e expulsou novamente os sionistas de seu país”.

A agressividade que tomou conta das manifestações revela um crescimento do fascismo no país. Não pela violência, que abstratamente é justificável em determinadas ocasiões, mas pelo fato demonstrado da radicalização da direita libanesa, que invadiu ministérios e combateu ativamente o governo.

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Um golpe para mudar o regime político e derrotar o Hezbollah

As manifestações, além do mais, ocorrem em um momento em que o imperialismo pede “reformas” no país, culpando a “corrupção” dos governantes pela explosão no porto da capital. Este tema também foi abordado no outro artigo, mas cabe reforçar novamente. 

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O presidente francês, Emmanuel Macron, visitou o país e prometeu ajudar financeiramente com a reconstrução da cidade… na condição em que o Líbano se submete a um “novo pacto” determinado pelos franceses que mudará seu regime político.

A mesma política foi defendida pelo porta-voz dos banqueiros, o Fundo Monetário Internacional (FMI). "O FMI está explorando todos os caminhos possíveis para apoiar o povo libanês. É essencial romper o impasse nas discussões sobre reformas cruciais e criar um programa significativo para recuperar a economia", estimou, em comunicado, a diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva.

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Percebe-se, então, que trata-se de uma campanha mundial pela mudança do regime e da política econômica do Líbano, hoje em dia muito menos alinhada com o neoliberalismo desenfreado apoiado pelos banqueiros do FMI. A mudança do regime libanês passa necessariamente pela derrota do Hezbollah, força popular mais influente no país. Por isso, fortaleceu-se a campanha de difamação contra a organização.

Apoio da imprensa capitalista ao golpe

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Artigo do jornal Aurora de Israel afirma: “Hezbollah é responsável do desastre em Beirute”. A acusação é feita sem nenhuma prova. Simplesmente propaganda política para atacar a organização. E o pior de tudo é que, do ponto de vista político, a explosão no porto da capital foi muito mais proveitosa para a política do imperialismo e de Israel do que para o Hezbollah e o governo. Portanto, se há de ter desconfianças sobre uma ação política premeditada no incidente, os principais suspeitos são os que hoje acusam o partido libanês.

A propaganda que é feita na imprensa capitalista mundial é a mesma que foi realizada por Macron no dia de sua visita à Beirute. A direita atua sempre com diversas cartas na manga e no dia em que o presidente francês foi ao Líbano, começou a circular uma petição na internet pedindo que o país fosse colocado sob controle da França - uma volta à época do colonialismo.

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O jornal alemão Deutsche Welle informou, no dia 7 deste mês, que “quase 60 mil pessoas assinaram uma petição online que pede que ‘o Líbano seja colocado sob um mandato francês pelos próximos dez anos’. O número é do início desta sexta-feira (06/08), e as assinaturas começaram a ser recolhidas no mesmo dia da visita do presidente da França, Emmanuel Macron, à capital libanesa”.

Outro artigo publicado na Aurora israelense mostra nitidamente o apoio do país às manifestações e à dominação francesa. “Os liberais têm a esperança que a explosão de Beirute, a visita de Macron ao Líbano e as manifestações de jovens contra o governo do país dominado pelo Hezbollah precedem uma nova unidade popular e melhor dias para todos os cidadãos libaneses”, afirma.

No Brasil, a imprensa golpista também está favorável. E, como sempre, repetindo, palavra por palavra, a campanha do imperialismo, culpando a “corrupção” do governo pela tragédia. Matéria publicada na Folha de S. Paulo diz que “a negligência criminosa que resultou na explosão é interpretada como evidência trágica da falência do sistema: uma elite política clientelista que distribui benesses a seus apaniguados em detrimento da população”. 

Em seguida, a Folha mente sobre a situação do país, que vive numa situação de crise econômica e política permanentemente por conta do boicote e da ofensiva imperialista na região, e culpa o governo pela situação de calamidade. “O Estado não consegue prover serviços fundamentais, como luz e saneamento básico, sendo também culpado pela crise econômica e financeira que levou à desvalorização da lira, a moeda local, resultando em uma queda brutal do poder de compra e aumento da pobreza (cerca de 50% da população vive atualmente abaixo da linha de pobreza)”.

E defende a interferência da França na soberania do Líbano, ao afirmar que o discurso de Macron, “assim como as manifestações a favor da mudança política, demonstram mais uma vez o caráter paradoxal da política libanesa: para alcançar seus objetivos políticos do momento (seja a independência, seja mudanças estruturais ou reforma política), é necessário recorrer a alianças com agentes externos”.

Uma investigação internacional

Ademais, para “investigar” a causa da explosão e punir os “culpados”, grupos de direitos humanos ligados ao imperialismo e o próprio presidente francês se colocaram contra o Judiciário libanês em defesa de uma investigação internacional.

Um diretor da Amnistia Internacional no Oriente Médio Lynn Maalouf afirmou ao jornal árabe Al Jazeera que “não estamos em uma posição hoje que nos permita de dar uma chance para o judiciário [libanês]”. “Quando se olha para o histórico do judiciário em relação à justiça, em geral, e todas as graves violações que o povo libanês aguentou, não há confiança”, reforçou.

Segundo a ministra da Justiça libanesa, Marie-Claude Najem, que faz coro com a política da direita ao deslegitimar o Judiciário do próprio país, a investigação no Líbano já tem a participação de “especialistas internacionais”, como policiais franceses (!!!). A informação foi confirmada pelo embaixador francês no Líbano, Bruno Foucher, que destacou a atuação de 46 oficiais franceses como “uma garantia de imparcialidade e rapidez nas investigações”.

Aumento de tropas francesas no Oriente Médio e israelenses no Líbano

Dito isso, não há dúvidas da participação ativa da França na tentativa de mudança do regime libanês. Isso foi denunciado pelo próprio primeiro-ministro, Hassan Diab. Chama atenção o fato de que os franceses estão aumentando sua ofensiva no Oriente Médio. Segundo a Al Jazeera, a França está reforçando a presença de tropas militares na região do mediterrâneo diante de conflitos da Turquia e da Grécia na exploração de gás em águas disputadas. Naturalmente, a posição dos franceses é para impedir o favorecimento da Turquia.

O movimento representa o avanço do imperialismo francês no Oriente Médio de forma geral, mas pode muito bem também ter a ver com o golpe no Líbano. De qualquer forma, o jornal Al Mayadeen informou que na terça-feira, 11/08, três tanques israelenses adentraram em território libanês desejado por Israel. Isto é, enquanto realiza-se uma verdadeira operação golpista no país, os israelenses aproveitam para adentrar no território do Líbano para anexar regiões há muito tempo disputadas - em Meiss El Jabal, dentro da linha azul. 

Neste sentido, a explosão em Beirute foi muito conveniente àqueles que defendem o aumento da dominação sobre os países árabes. 

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