Febre Maculosa: um alerta para além dos carrapatos e das capivaras

As pessoas, passado o surto da febre maculosa, deixaram de falar dela, mas o assunto é presente, atual e requer ação concreta

Febre maculosa
Febre maculosa (Foto: Jerry Wirkhart / Wikimidia)


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Em 13 de junho deste ano a EBC anunciou o registro de 49 casos de febre maculosa e, entre estes, 6 mortes. Mesmo quem não sente empatia pelo sofrimento do próximo foi levado a pensar: poderia ser meu filho, como aquele menino de 16 anos; poderia ter sido eu, aos 28 anos ou aos 52 anos ou como tantos outros que passaram a fazer parte da fria estatística de óbitos do Sistema de Informações de Agravos de Notificação(SINAN), que tem como função coletar, transmitir e disseminar dados gerados pelos Sistema de Vigilância Epidemiológica das doenças de notificação compulsória, febre maculosa, por exemplo. 

A febre maculosa não é uma doença nova, foi reconhecida inicialmente em 1896, no vale do rio Snake, no estado americano de Idaho, chamada à época de "sarampo preto" em tradução livre. No Brasil, os primeiros casos foram descritos no final dos anos 20 do Século passado. Temos, por aqui, dois tipos desta febre: uma provocada pela a Rickettsia rickettisii, que apresenta formas graves e alta letalidade, transmitida principalmente pelo carrapato-estrela ou micuim, e outra provocada pela Rickettsia parkeri, transmitida pelo amblyomma aureolatum, que parasita principalmente os cães, tem a forma menos grave e não tem apresentado picos da doença, sendo endêmica o ano inteiro. 

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Segundo dados do Ministério da Saúde, no período de 2007 a 2017 a população com maior incidência de febre maculosa no Brasil foi a rural, com 700 casos, seguido pela urbana, com 509 casos, e periurbana, com 215 casos. A maior quantidade de notificações no Brasil foi apresentada no ano 2017 (183 casos). Em artigo registrado pela Biblioteca Virtual de Saúde do Ministério da Saúde, tendo como fontes a Fundação Oswaldo Cruz e o Dr Dráuzio Varella, “cada fêmea de carrapato infectada pode gerar até 16 mil filhotes aptos a transmitir rickettsias. Deste modo, se você tem o hábito de levar o seu cão para viajar com você para áreas rurais, tome cuidado para que ele não se torne reservatório da febre maculosa quando você retornar para a sua cidade. Os cães, muitas vezes, não apresentam nenhum sintoma da doença”. 

Discute-se o número de casos por rickettsia no Brasil, que a meu ver, pelo fato de os pródromos da doenças, e mesmo os seus sintomas específicos, terem muita semelhança com os de outras doenças, temos, provavelmente, subnotificação, principalmente das formas leves que, muitas vezes, não são diagnosticadas, mas contribuem para o alastramento da doença. É imprevisível o que acontecerá, caso não sejam tomadas ações concretas pelas autoridades sanitárias e, mesmo, pela sociedade. 

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No caso do último pico da febre maculosa na região de Campinas, o hospedeiro foram as capivaras e a bactéria que levou a morte de algumas pessoas a Rickettsia rickettsii. 

Para além das ações de combate aos carrapatos, tanto o Ibama como as autoridades sanitárias deverão tomar medidas de manejo das populações de capivaras e de outros animais silvestres que convivem nas cidades e próximos das cidades. 

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Partimos da visão de que o ser humano deve manter o ambiente social e ecologicamente sustentado e combatemos qualquer tipo de abuso ou impressão de sofrimento aos animais. Mas já está consolidado na sociedade que temos de fazer dedetização, desratização, controle do crescimento da população de pombos, combate ao Aedes aegypti e tantos outros. É certo que muitos animais vivem em ambientes urbanos, porque seus habitats foram substituídos pelas cidades da população de Homo sapiens, que se expandiu de forma espetacular nos últimos milênios. Saltamos de centenas de milhares para alguns bilhões. E, mesmo os seres humanos, fazem voluntariamente um “manejo”, planejamento da sua própria população. A maioria absoluta das pessoas planeja se terá filhos e quantos serão, mesmo assim graças a medicina, ao avanço nas técnicas de produção de alimentos e na modificação dos habitats para proteção do ser humano, casas, roupas, ar condicionado, cidades, meios de transporte e etc, nós começamos a viver por mais tempo e melhor; isto levou ao aumento impressionante da população. A visão democrática exige que busquemos o equilíbrio entre a modificação do meio ambiente e a habitabilidade com a proteção do ser humano. Este é tema para outro artigo, voltemos à Região de campinas e às capivaras que são hospedeiras da febre maculosa. 

A Secretaria Municipal do Verde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SVDS) iniciou, na manhã de quarta-feira, 21 de junho, o inventário da população de capivaras, a ser feito em parques públicos de Campinas. Imaginem que neste Brasil afora não sabemos quantos e quais animais habitam as cidades, e imagine que eles têm contato direto ou indireto com os animais domésticos, principalmente os cães, que saem com ou sem os seus donos, cheirando dejetos e áreas que foram utilizados por outros animais. O contato dos seres humanos, mesmo de quem não tem animal doméstico, com todos estes animais é quase direito, pois os cães de criação e a população de cão de rua, não usam sapatos e pisam em todos os lugares, cheiram todos os lugares, daí a necessidade de mudança de hábitos da população e planejamento das autoridades sanitárias para tomar medidas para proteger o seres humanos, os animais domésticos e os silvestres. O SUS em suas discussões, em todos os níveis e ações, deve incorporar, cada vez mais, a relação do homem e o meio ambiente. 

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As capivaras da região de Campinas são nativas, mas naquele tempo, elas tinham predadores naturais que faziam naturalmente o manejo. Após o senso das capivaras, a autoridade sanitária deverá definir o número aceitável de cada animal em cada ambiente, como também deverá orientar a população sobre qual conduta deverá ter em cada um destes ambientes. Além do combate insano aos carrapatos, há um longo trabalho pela frente que trataremos em outro artigo. 

Quanto aos animais domésticos, muitas pessoas dormem com seus animais de estimação e muitos os tratam com carinho e cuidado sanitário, mas somente isto não basta. É comum uma parte da população deixar dejetos de animais pela rua, deixar seus cães andarem sem coleira e cheirar tudo por onde passam, ou mesmo se afastarem de seus donos sem controle, arriscados a contraírem doenças como leishmaniose entre outras. A sociedade precisa discutir normas para além das definidas atualmente de controle de zoonoses urbanas. Este é um nome impróprio, pois zoonoses, ressalvando-se as que atingem somente os animais, são doenças também humanas e o SUS deverá ser ampliado, ainda mais, para incorporar várias interações entre os animais e seres humanos . Recentemente visitei um bairro em São Paulo e soube por amigos, que o dono ou dona de uma determinada casa criava mais de 30 cães, não procurei apurar se a história era verídica ou não, mas situações assim requer orientação e vigilância sanitária. 

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A convivência entre os seres humanos e animais domésticos é milenar, bem como a criação de animais para consumo. Hoje temos espécies que não existem na natureza, evoluíram por seleção artificial fruto da criação humana. Esta atividade, hoje, é industrial e envolve o grande comércio, portanto tem um controle mais aceitável pela sociedade do que a criação de animais de estimação. 

As pessoas, passado o surto da febre maculosa, deixaram de falar dela, mas o assunto é presente, atual e requer ação concreta, neste artigo falei de alguns caminhos mas entendo que o debate é mais amplo e mais complexo. 

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“Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.” (Cecília Meireles)

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