Farsa para prender Lula levou apenas 569 dias; julgamento da suspeição de Moro está pendente há 800 dias

"Esta é uma evidência claríssima do modo de 'funcionamento normal das instituições'", aponta o colunista Jeferson Miola sobre a perseguição política que ainda vigora contra o ex-presidente Lula

Lula e Sérgio Moro
Lula e Sérgio Moro (Foto: Ricardo Stuckert | Reuters)


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Transcorreram apenas 569 dias entre [1] a tarde em que Deltan Dallagnol e seus comparsas da República de Curitiba apresentaram o power point com as infames imputações criminais a Lula, e [2] a noite em que o ex-presidente foi arbitrariamente encarcerado em Curitiba, onde permaneceu injustamente durante 580 dias.

O espetáculo midiático do Deltan anunciando Lula como “comandante máximo da corrupção”, transmitido em tempo real pela Rede Globo, foi executado em 14 de setembro de 2016.

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A prisão política do Lula foi consumada em 7 de abril de 2018, depois da execução célere e sumária da farsa jurídica, feita a toque de caixa e em tempo recorde nas 1ª e 2ª instâncias do regime de exceção por meio de toda sorte de atropelos e falsificações processuais.

Lula não teve direito a um julgamento imparcial e justo. Ele foi alvo de uma monstruosa operação jurídica e midiática planejada nos EUA para condená-lo de qualquer maneira, sem nenhuma prova.

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O caso Lula guarda enorme semelhança com o famoso caso Dreyfus, que inspirou os estudos de Hannah Arendt sobre as origens do nazismo e do totalitarismo, conforme artigo de 19/1/2018, reproduzido ao final deste texto.

Se a brutal injustiça promovida contra Lula andou na velocidade da luz, o mesmo não se pode dizer sobre a promoção da justiça com a restauração da verdade e a reparação dos direitos civis e políticos do Lula, que anda a passos de tartaruga numa corrida cheia de obstáculos interpostos.

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No dia 5 de novembro de 2018, quando Lula ainda estava arbitrariamente preso, a defesa dele protocolou um habeas corpus no STF pedindo a suspeição de Sérgio Moro, então recém indicado ministro bolsonarista da justiça; a nulidade dos processos julgados por ele contra Lula, e a liberdade do ex-presidente.

Desde o ingresso do habeas corpus no Supremo, em 5/11/2018, até este 15 de janeiro de 2021, já terão transcorrido, portanto, exatos 800 dias sem que o STF julgue a suspeição do Moro.

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Neste período, fomos brindados com explicações estapafúrdias acerca dos sucessivos e injustificáveis adiamentos deste julgamento.

Enquanto a farsa executada a jato para prender Lula levou apenas 569 dias, o julgamento da suspeição do Moro, que corrompeu o sistema de justiça e violou o Estado de Direito por interesses particulares e partidários, está pendente há 800 dias.

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Esta é uma evidência claríssima do modo de “funcionamento normal das instituições” no regime de exceção que tenta aniquilar o maior líder popular do país para remover do caminho os entraves à guerra de ocupação que a oligarquia e militares promovem para pilhar e saquear as riquezas e a soberania nacionais e destruir os direitos do povo brasileiro.

O julgamento da suspeição do Moro, que tem como desdobramento obrigatório a restauração dos direitos civis e políticos do Lula, é um requisito essencial para que o país possa iniciar uma trajetória de restauração do Estado de Direito e de interrupção da escalada fascista e ditatorial que avança a passos largos no Brasil.

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Caso Lula e caso Dreyfus: qual a reação ao arbítrio?

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Jeferson Miola, publicado em 19/1/2018

Lula não está sendo julgado; ele está sendo condenado sem provas, num processo enviesado e carente de fundamentos jurídicos.

A condenação arbitrária do ex-presidente no TRF4 são favas contadas. O regime de exceção perpetrará esta violência jurídica mesmo que a falsa acusação, forjada pela Lava Jato para condená-lo – a suposta propriedade de um apartamento triplex – tenha sido totalmente desmanchada em decisão recente da juíza Luciana Corrêa Tôrres de Oliveira, da 2ª Vara de Execução de Títulos Extrajudiciais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

A juíza determinou a penhora do imóvel para a empresa Macife S/A, credora da OAS que ajuizou a empreiteira para cobrar dívidas. A penhora comprova cabalmente que o apartamento pertence, de fato e de direito, à empreiteira OAS – e não ao Lula. Este fato soterra a acusação fraudulenta, e, portanto, o processo contra Lula deveria ir para a lixeira.

O Brasil e o mundo assistem não a um julgamento justo e legal do maior líder popular do país, mas sim a um processo kafkiano, no qual a condenação foi concebida de antemão, num quadro de guerra jurídica permanente [lawfare], perseguição midiática e emprego do direito penal do inimigo.

A narrativa da Rede Globo e da mídia hegemônica, que reverbera as vozes fascistas da Lava Jato e da oligarquia golpista, cinicamente busca confundir o direito do Lula a um julgamento justo e honesto com a defesa da sua impunidade.

Defender o direito de todo cidadão a um julgamento justo e legal – desde que existam, de fato, razões materiais para qualquer pessoa ser processada judicialmente – é o mínimo que se deve fazer para proteger a democracia e o devido processo legal.

Lula não está nem acima nem abaixo das leis e da Constituição do Brasil. Com este julgamento de exceção, porém, a classe dominante coloca Lula à margem das leis e da Constituição; subtrai dele o direito inerente a todo ser humano, de não ser condenado sem provas.

A farsa jurídica montada para condenar Lula é um passo em direção ao totalitarismo. Nos estudos sobre a gênese do nazismo, do anti-semitismo e dos processos totalitários, Hannah Arendt analisou o Caso Dreyfus, ocorrido no final do século 19 – que guarda semelhanças com o Caso Lula.

Alfred Dreyfus foi perseguido por ser o único oficial do exército francês de origem judaica, e foi acusado de alta traição por supostamente colaborar com os alemães durante a guerra franco-prussiana na disputa pelas terras da Alsásia-Lorena, ricas em carvão.

Num processo baseado em documentos falsos e provas forjadas, como ocorre com Lula, Dreyfus foi condenado, por unanimidade, à prisão perpétua. Para o autor William Shirer, a condenação de Dreyfus “convencera grande parte da população de que os judeus [no regime de exceção, Lula e os petistas são os estigmatizados] eram responsáveis não só pela chocante corrupção nos altos círculos políticos e financeiros, como também por traírem segredos militares em favor dos odiados alemães, solapando com isso a segurança da nação, que ainda sofria com a recuperação após a derrota que lhe fora infligida pela Prússia em 1870” [A Queda da França: o colapso da Terceira República].

No livro As origens do totalitarismo, Hannah Arendt disserta que, “como eram judeus, tornava-se possível transformá-los em bodes expiatórios quando fosse mister aplacar a indignação do público. Os antissemitas podiam imediatamente apontar para os parasitas judeus de uma sociedade corrupta para ‘provar’ que todos os judeus de toda parte não passavam de uma espécie de cupim que infestava o corpo do povo”.

20 anos mais tarde, depois de verdadeiro e honesto julgamento, Dreyfus foi finalmente inocentado. Com Lula não será diferente. Em breve tempo esta farsa monstruosa, montada para impedir seu retorno à presidência do Brasil, também será escancarada.

Exigir o direito de um julgamento justo para o ex-presidente Lula não é sinônimo de privilégio e de impunidade; é uma dever para a defesa do Estado de Direito e da democracia.

Lula será vítima do arbítrio e de uma violência jurídica monumental. É preciso, por isso, se perguntar: qual a reação democrática e popular diante deste arbítrio anunciado de antemão?

Uma realidade é inescapável: as instituições, o judiciário e o congresso estão totalmente dominados pelas lógicas fascistas e golpistas.

A soberania popular, a desobediência civil e o direito à insurgência contra toda tirania e arbítrio são dispositivos democráticos do Estado de Direito que precisa ser urgentemente restaurado no Brasil.

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