Fala de Chris Hedges em comício 'Ira Contra a Máquina de Guerra'

A oligarquia dominante nos bloqueia num abraço da morte. Isso não pode ser reformado. Isso obscurece e falsifica a verdade

(Foto: Reprodução)


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Artigo de Chris Hedges. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

A idolatria é o pecado primitivo do qual todos os outros pecados derivam. Os ídolos nos tentam a nos tornarmos Deus. Eles exigem o sacrifício de outros na busca louca por riqueza, dama ou poder. Mas o ídolo sempre termina exigindo o auto-sacrifício, deixando-nos perecer nos altares ensopados de sangue que nós erigimos para outros.

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Porque os impérios não são assassinados, eles cometem suicídio aos pés dos ídolos que os extasiam.

Nós estamos aqui hoje para denunciar os não-eleitos e não-responsabilizáveis altos sacerdotes do Império, que enfiam os corpos de milhões de vítimas, juntamente com trilhões da nossa riqueza nacional, para dentro das entranhas da nossa própria versão do ídolo cananeu, Moloch.

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A classe política, as mídias, a indústria do entretenimento, os financistas e até as instituições religiosas latem como lobos pelo sangue dos muçulmanos ou dos russos ou dos chineses, ou seja lá quem for que o ídolo demonizou como indigno de ter vida. Não existiam objetivos racionais nas guerras no Iraque. No Afeganistão, na Síria, na Líbia e na Somália. Estes não existem tampouco na Ucrânia. A guerra permanente e a matança industrial são as suas próprias justificativas. A Lockheed Martin, a Raytheon, a General Dynamics, a Boeing e a Northrop Grumman ganham bilhões de dólares em lucros. Os vastos gastos exigidos pelo Pentágono são sacrossantos. A conspiração de especialistas, diplomatas e tecnocratas belicistas, os quais se esquivam presunçosamente da responsabilidade pela variedade de desastres militares que eles orquestram, são multiformes, mudando habilmente de acordo com as marés políticas, passando do Partido Republicano para o Partido Democrata e vice-versa outra vez, mutando-se de guerreiros da guerra fria para neocons e para liberais intervencionas. Julien Benda chama estes cortesãos do poder de “os autoconstruídos bárbaros da intelligentsia”.

Estes cafetãos da guerra não veem os cadáveres das suas vítimas. Eu os vi. Incluindo crianças. Cada corpo sem vida sobre o qual eu me vi como repórter na Guatemala, em El Salvador, na Nicarágua, na Palestina, no Iraque, no Sudão, no Iêmen, na Bósnia ou no Kosovo – mês após mês, ano após ano – expunha a sua bancarrota moral, a sua desonestidade intelectual, a sua doentia sede de sangue e as suas fantasias delirantes. Eles são marionetes do Pentágono, de um estado dentro do estado, e dos fabricantes de armamentos que financiam generosamente os seus ‘think-tanks’: Project for the New American Century, Foreign Policy Initiative, American Enterprise Institute, Center for a New American Security, Institute for the Study of War, Atlantic Council e Brookings Institute. Assim como uma cepa mutante de uma bactéria resistente a antibióticos, eles não podem ser vencidos. Não importa quão equivocados eles são, quão absurdas sejam as suas teorias de dominação global, quantas vezes eles mintam ou denigrem outras culturas e outras sociedades como incivilizadas ou quantas delas eles condenem à morte. Eles são adereços inamovíveis, parasitas vomitados nos dias de morte de todos os impérios, prontos a nos venderem à próxima guerra virtuosa contra seja quem for que eles tenham decidido que é o novo Hitler. O mapa muda. O jogo é o mesmo.

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Tenhamos pena dos nossos profetas, aqueles que perambulam pelas paisagens desoladas, chorando na escuridão. Tenhamos pena por Julian Assange, que está passando por uma execução em câmera-lenta numa prisão de alta segurança em Londres. Ele cometeu o pecado fatal do Império. Ele expôs os crimes deste, a sua maquinaria de morte, a sua depravação moral. 

Uma sociedade que proíbe a capacidade de falar a verdade extingue a capacidade de viver com justiça.

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Algumas pessoas que estão aqui hoje podem preferir pensar sobre si mesmas como sendo radicais, talvez até revolucionários. Porém, o que estamos exigindo no espectro político é, na verdade, uma demanda conservadora: a restauração do estado de direito. Isto é simples e básico. Isto não deveria, numa república funcional, ser incendiário. Mas viver a verdade num sistema despótico, um que o filósofo político Sheldon Wolin chamou de “totalitarismo invertido”, é subversivo.

Os arquitetos do imperialismo, os mestres da guerra, o legislativo, o judiciário e os braços executivos do governo e os seus obsequiosos porta-vozes nas mídias e nas academias controlados pelas corporações, são ilegítimos. Diga esta simples verdade e você será banido às margens, como muitos de nós o fomos. Prove esta verdade, como Julian fez, e você será crucificado.

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“Rosa, a Vermelha, agora também desapareceu...”, escreveu Bertolt Brecht sobre a socialista assassinada Rosa Luxemburgo. “Ela contou aos pobres do que se trata a vida. E, assim, os ricos a apagaram”.

Nós passamos por um golpe de estado corporativo, no qual os pobres e os trabalhadores, metade dos quais carecem de ter US$400 para pagar uma despesa emergencial, são reduzidos à instabilidade crônica. O desemprego e a insegurança alimentar são endêmicos. As nossas comunidades e cidades estão desoladas. A guerra, a especulação financeira, a vigilância constante e a polícia militarizada que funciona como um exército interno de ocupação são as únicas preocupações reais do estado. Nem mesmo o habeas corpus existe mais. Nós, como cidadãos, somos commodities para os sistemas corporativos de poder, usados e descartados. Todos os impérios morrem no mesmo ato de autoimolação. A tirania que o império ateniense impôs sobre outros – como Thucydides assinalou na sua história da Guerra do Peloponeso – no final ele acabou impondo a si próprio.

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Lutar de volta, estender a mão aos outros e ajudar os fracos, os oprimidos e os que sofrem, para salvar o planeta do ecocídio, para condenar os crimes domésticos e internacionais da classe dominante, para exigir justiça, para viver com verdade, para esmagar as imagens esculpidas, é carregar a marca de Caim.

Aqueles que estão no poder devem sentir a nossa fúria, o que quer dizer atos constantes de desobediência civil não-violenta, de ruptura social e política. O poder organizado pela base é o único poder que pode nos salvar. A política é um jogo de medo. É nosso dever fazer com que aqueles que estão no poder muito, muito temerosos.

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A oligarquia dominante nos bloqueia num abraço da morte. Isso não pode ser reformado. Isso obscurece e falsifica a verdade. Ela está numa busca maníaca para aumentar a sua obscena riqueza e o seu poder incontrolado. Isso nos força a nos ajoelharmos à frente dos seus deuses falsos. E assim, para citar a Rainha dos Corações – metaforicamente, é óbvio – eu digo: “Cortem as cabeças deles!”. 

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