Explode a crise de refugiados na Grécia: Alemanha, faça o correto e salve vidas!
Eu desde o início fui e continuo sendo completamente a favor do acolhimento dos refugiados, afinal não há o que discutir: receber refugiados significa salvar vidas
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Desde 2015, quando ocorreu a crise migratória na Europa e a Alemanha se tornou o país que mais recebeu refugiados no continente, este tema vem sendo discussão constante no cenário político e social do país. Eu desde o início fui e continuo sendo completamente a favor do acolhimento dos refugiados, afinal não há o que discutir: receber refugiados significa salvar vidas. Vidas inocentes que sofrem com guerras, governos autoritários e todos os tipos de problemas sobre os quais os países europeus colonizadores têm culpa histórica. Assim, estima-se que entre 2015 e 2016 cerca de 1,3 milhão de pessoas da Síria, do Afeganistão, do Iraque e outros países receberam asilo na Alemanha.
Tenho muitas críticas a Angela Merkel, mas a respeito e até admiro. E no que diz respeito à política imigratória dos refugiados, ela foi e continua sendo ótima. Não sou seu eleitor, mas em 2017 excepcionalmente votei para sua reeleição, pois mesmo com todas as críticas, ela bateu o pé, enfrentou a ascensão sem precedentes do Neonazismo e manteve sua política. “Wir schaffen das!” (“Nós conseguiremos!”) foi sua frase histórica de motivação ao povo do país. E de fato tudo vêm dando certo. A esmagadora maioria das histórias dos refugiados é de sucesso. Eu tive e tenho o prazer de ver e conviver com eles e presenciar seu desenvolvimento, sua integração no mundo ocidental e a contribuição que suas culturas trazem à Alemanha.
Cabe ainda lembrar que Merkel não abriu suas fronteiras unicamente em nome dos Direitos Humanos. A Alemanha é um dos países com maior deficit em termos de produção e mão de obra. Falta força de trabalho em todos os setores e a população – que é uma das mais idosas do planeta – não cresce o suficiente para acompanhar a necessidade da economia. Assim, ela uniu o útil ao agradável, salvando pessoas e melhorando esta situação problemática.
Para mim, conviver com os refugiados é duplamente interessante, pois além de ser um cidadão do ocidente que agora tem a oportunidade de viver em um país europeu mais diversificado e rico culturalmente, sou judeu e tenho a valiosíssima oportunidade de conhecer árabes. E por que isto é tão valioso? Pois posso frequentemente confirmar aquilo que sempre acreditei: judeus e árabes não são inimigos. Pelo contrário, são povos primos, culturas irmãs. Os desentendimentos, a inimizade, as guerras, o terrorismo são plantados pelos monstros que estão no poder em todos os lados, judeus, árabes, norte-americanos, europeus, russos e por aí vai.
Agora mesmo, enquanto lhes escrevo este artigo, acabo de voltar da loja de especialidades árabes de um amigo tunisiano. Quando vou lá, afetuosamente nos cumprimentamos em hebraico e em árabe, falamos das semelhanças de nossas culturas, culinárias, idiomas, e aproveitamos para xingar Netanyahu, Trump e cia. Inclusive hoje para minha surpresa soube que ele tem conhecimento a respeito do monstro que preside o Brasil. Ele me disse “Não pensei que pudesse haver alguém pior que Trump, mas o presidente brasileiro parece ser”. E eu confirmei que sim.
Mas enfim, vamos ao ponto principal do artigo. A crise do momento diz respeito aos refugiados no campo de Moria, que se localiza próxima à cidade de Mitilene, capital da ilha grega de Lesbos. Moria é o maior campos de refugiados na Europa e carrega também a maior quantidade de problemas. O Human Rights Watch o descreveu como “uma prisão a céu aberto”. O Médicos sem Fronteiras reportou à BBC que este é “o pior campo de refugiados da Terra”. O campo deveria abrigar três mil pessoas, mas em 2020 foram registradas 20 mil, das quais cerca de um terço é formado por menores de idade.
O motivo desta catástrofe é duplo: econômico e geográfico. Econômico porque a Grécia realmente foi um dos países mais afetados pela crise de 2008 e desde então não se recuperou. Não vou me adentrar aqui nesta questão, pois não é o tema do artigo, mas deixo claro que as tensões sociais que esta crise imprimiu no país refletem diretamente no investimento ao tratamento dos refugiados. E o motivo geográfico é: grande parte dos refugiados entrou na Europa (e na União Europeia) justamente pela Grécia, passando pela Turquia e até mesmo enfrentando o Mar Egeu buscando uma vida segura e digna. Desta forma, muitos que entraram, foram recebidos pela Grécia, mas não conseguiram lá asilo permanente e nem em outros países europeus, permanecendo “presos” nestes campos. E há ainda os que continuam a chegar, uma vez que as guerras na Síria e no Iraque e as perseguições políticas no Irã e na Turquia estão longe de acabar.
Pois bem, toda esta história obviamente piorou quando foi detectada a primeira infecção do vírus COVID-19 em Moria. As medidas de contenção da pandemia propostas não agradaram o povo, já tão ferido e desgastado. E a situação se degradou derradeiramente no último dia oito de setembro, quando ocorreu um grande incêndio que destruiu praticamente todo o campo. Felizmente não houve fatalidades neste incidente. Há inclusive a hipótese de que o fogo teria sido iniciado intencionalmente, justamente para que o pesadelo do campo de uma forma ou de outra chegasse ao fim. Seis supostos incendiários foram presos.
Pois bem, ao que parece, funcionou. Agora as autoridades europeias terão de agir. Os números são incertos – inclusive estima-se que muitas pessoas “fugiram” para dentro da Grécia –, mas acredita-se que há cerca de treze mil refugiados que necessitam de asilo imediato. Por enquanto eles estão em um campo provisório.
A Alemanha, como país-cabeça da União Europeia, se dispôs a aceitar cerca de 400 famílias, priorizando crianças, o que corresponde a cerca de 1600 pessoas. França, Grécia e Luxemburgo timidamente se dispuseram a aceitar mais algumas centenas. E o problema não pára por aí. Há ainda uma quantidade considerável de menores desacompanhados, sem família, ou seja, que necessitarão de assistência específica.
Enfim, no momento os políticos alemães estão discutindo (e se digladiando) acerca de uma maior aceitação de refugiados. A divisão dos partidos nesta contenda é óbvia: os partidos de Esquerda e Centro-Esquerda, SPD (Social Democrata), Grüne (Verde) e Linke (Esquerda) são a favor do acolhimento. O CDU (união cristã) de Merkel se divide entre os mais e os menos conservadores. E os de direita e extrema-direita, incluindo o neonazista AfD, é radicalmente contra a entrada de mais “não-alemães” no país.
Uma interessante pesquisa realizada na semana passada (instituto Moma) indicou que 87% dos habitantes da Alemanha acreditam que o país deve receber mais refugiados, mas metade destes aceitam isso com a condição de que outras nações da União Europeia também os acolham. A outra metade vota por recebê-los independentemente dos outros países. E logicamente 10% vota por não receber ninguém (esta é a parte plenamente nazista da população), enquanto 3% não opinaram.
Cabe também mencionar que ocorreu ontem em Berlim uma belíssima marcha de aproximadamente cinco mil pessoas que defendem o acolhimento dos refugiados. Os manifestantes, de máscaras sanitárias, carregavam cartazes convidativos que diziam “Temos espaço!”. Outras placas diziam “Unidos contra o racismo” e “Solidariedade ao invés de fronteiras”.
Para concluir o artigo deixo aqui minha opinião, que não surpreenderá o leitor. Penso que se os outros países não erguerem suas mãos em solidariedade, a Alemanha deveria receber todos os treze mil refugiados. Nós temos de fato suficiente espaço, há suficiente dinheiro, precisamos de força de trabalho e, sobretudo, precisamos sempre de mais diversidade. A melhor parte da Alemanha – e só vivo aqui por causa desta realidade – é a diversidade do povo que a habita. Hoje uma a cada quatro pessoas no país é estrangeira, e isso é maravilhoso. Nas ruas se escuta diversos idiomas e se vê diferentes cores de pele, vestimentas e comportamentos. Se a Alemanha fosse inteira alemã, branca, cristã, ariana, tenho certeza de que em algum momento o nacionalismo disruptivo que vive latente no submundo da sociedade ascenderia novamente. E as consequências disso sabemos quais são.
Refugiadas e refugiados, sejam bem-vindas e bem-vindos. Cheguem, instalem-se tragam o seu colorido à sociedade alemã. E que cresçam suas crianças, se tornando os rostos do futuro que nós humanistas queremos para a Alemanha: repleta de diversidade e de respeito e contrária àqueles que a querem somente para si e para seus pequenos desejos egoístas.
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