Exclusivo: Como a Polícia registrou o tiroteio em Paraisópolis, que Tarcísio explorou politicamente

Soldado à paisana, escalado para proteger Tarcísio, atirou no motociclista, encontrado sem arma; relato descarta hipótese de atentado contra o candidato

Tarcísio durante a visita a Paraisópolis e Rafael, que teria atirado contra policiais
Tarcísio durante a visita a Paraisópolis e Rafael, que teria atirado contra policiais (Foto: Rede social/Reprodução de ficha criminal)


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Caso queira investigar para valer o tiroteio em Paraisópolis, que Tarcísio de Freitas tentou explorar politicamente com a versão do “atentado”, a Polícia Civil já tem uma pista importante.

O homem que estava na garupa da moto em que o piloto foi baleado e morto é Rafael de Almeida Araújo, que tem endereço em Paraisópolis e é procurado pela Polícia desde 2018, quando, após saída temporária, não retornou ao sistema carcerário.

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Rafael Almeida Araújo também tem mandado de prisão expedido por assalto a uma residência da Vila Andrade, nas proximidades de Paraisópolis, em julho de 2021. Rafael, de 32 anos, tem condenação por roubo, tráfico e também por corrupção de menores.

O que causa estranheza é que, mesmo tendo mandado de prisão, ele se dispôs a circular de motocicleta nas imediações do Polo Universitário, onde Tarcísio de Freitas fazia campanha, nesta segunda-feira, 17 de outubro.

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Em Paraisópolis, o PCC está instalado, fato que é conhecido da Polícia Civil, e uma ação do tipo da que ocorreu durante a visita de Tarcísio de Freitas é incoerente com a forma como o chamado crime organizado atua.

Uma ação espontânea de criminosos, para intimidar Tarcísio de Freitas, também seria improvável, levando-se em consideração os interesses do próprio PCC. Sobra a hipótese de que seria armação a partir do própria campanha de Tarcísio de Freitas.

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Ou que, mesmo sem combinar com bandidos, a campanha calculou o risco de ação policial durante a visita do candidato. O boletim de ocorrência elaborado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa mostra que havia um eficiente esquema de segurança durante a visita de Tarcísio de Freitas.

"Depreendendo-se das oitivas colhidas, de forma sinteticamente organizada cronologicamente, que, cientes de que o candidato a governador do estado de SP Tarcísio de Freitas estaria em um evento de campanha de inauguração de uma universidade no local dos fatos, o Ten. Ronald chegou para reconhecimento do local por volta das 09:45h, após o que determinou que viaturas do 16º BPM/M realizassem o patrulhamento pelas imediações, na parte externa da comunidade. Por volta das 10h, os policiais militares Sgt Ed Carlos e Cb Clovis, componentes do reservado do mesmo 16°BPM/M, chegaram ao local de inauguração do "Centro Universitário Ítalo Brasileiro", estacionaram a viatura descaracterizada em frente ao local e permaneceram no interior do veículo até por volta das 10:30h, período durante o qual perceberam a movimentação de duas motocicletas Honda PCX, com dois indivíduos em cada, que passaram diversas vezes pelo local. Nesse interim, os policiais militares Cb Valmir e Sd Henrique, pertencentes ao 'comando do QG da PM, atuando na área da inteligência/P2', chegaram ao local e estacionaram a viatura ao lado, tendo funções apenas de levantamento de informações, e aguardaram até a chegada do candidato e sua equipe, que ocorreu às 10:30h, importando salientar que todos estavam 'à paisana’”, escreveu o escrivão Léo Lopes da Silva, da equipe do delegado Kaue Danilo Granatta, que atendeu à ocorrência.

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Boletim de ocorrência
Boletim de ocorrência(Photo: Reprodução)Reprodução


As duas esquipes de policiais à paisana se dividiram. O soldado Carlos e o cabo Clovis entraram no prédio onde Tarcísio cumpriria agenda, enquanto o cabo Valmir e o soldado Henrique permaneceram no carro descaracterizado.

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Por volta das 10h45, segundo relato dos policiais, a moto com Felipe da Silva Lima e Rafael de Almeida Araújo voltou a circular pela rua. 

Prossegue o boletim: "Passaram ao lado da viatura descaracterizada, filmando o interior do veículo com um celular, o que também foi gravado pelo policial Cb Clóvis, que comunicou o fato ao policial Sgt Ed Carlos, que conseguiu observar que os indivíduos pararam a moto atrás da viatura por alguns instantes e estariam armados, quando este se comunicou com o Ten. Ronald, que determinou que Ed Carlos e Clóvis saíssem do local, por terem sido ‘plotados’”.

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"Por volta das 11h, após a saída dos policiais Clovis e Ed Carlos, os mesmos dois indivíduos da motocicleta XRE teriam descido a via pública novamente, registrando imagens pelo celular, quando pararam e interpelaram o Sd Henrique Gama sobre quem teria autorizado o evento, saindo em seguida do local, tendo o policial comunicado o fato ao Cb Valmir, que saiu do prédio e se juntou ao Sd Henrique, até que minutos depois ouviram uma rajada com tiros seguidos intermitentes, vinda da Rua Manoel Antonio Pinto com a Rua Iratinga. Aproximadamente 15 minutos após ouvirem a 'rajada' os mesmos indivíduos retornaram com outros dois, em outra motocicleta, com armas longas, acompanhados de outros indivíduos a pé e armados com armas curtas, todos vindo no sentido da Rua Ernest Renan para o local em que estavam os policiais Cb. Valmir e Sd. Henrique, começaram a atirar na direção de ambos, que permaneceram atrás de um veículo Jeep Compass blindado, que estava estacionado em frente ao prédio da universidade, momento em que apenas o Sd. Henrique passou revidar, efetuando disparos contra os criminosos, enquanto estavam abrigados pelo veículo, o que foi justificado pelo fato de que tinham que poupar munição até a chegada de reforço, que chegou no momento em que o confronto já havia acalmado ou cessado, após a equipe de segurança ter entrado em contato com o Cb. Clovis que, por sua vez, alertou o Ten. Ronald, que se dirigiu ao local com equipe de policiamento ostensivo, em companhia do policial condutor Sgt Leoneti”, registra ainda o boletim de ocorrência.

O soldado Henrique teria acertado o tórax do piloto de uma das motocicletas, Felipe da Silva Lima, que viria a falecer. Os demais fugiram.

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Entre os objetos apreendidos pela Polícia Civil no local dos fatos, há munição, disparada e intacta, coldre e um telefone celular. Mas não consta nenhuma arma. 

A Polícia Civil registrou assim o fato: "restando a justificativa provável da ausência de localização de arma junto ao corpo de Felipe de que seus comparsas e demais criminosos, que recuavam e chegaram a tentar resgatar de Felipe, podem ter conseguido recuperar a arma utilizada pelo mesmo.”

O caso será investigado como homicídio, na modalidade “morte decorrente de intervenção policial (Res. SSP 05/2013), alterado pela Res 02/2015 do MJ/PF/CSP de 13/10/15 para homicídio decorrente de oposição à intervenção policial”.

Em Paraisópolis, os moradores não tem conversado com a imprensa. Nesta terça-feira, o presidente da União do Moradores e do Comércio de Paraisópolis, Gilson Rodrigues, divulgou nota para deixar claro que não foi comunicado da presença de Tarcísio de Freitas na comunidade, o que é inusitado — autoridades costumam comunicar a ele visitas à comunidade. 

Diz o texto divulgado por Gilson, que se encontra em Salvador, em eventos do G10 Favelas, entidade que defende os interesses dos moradores de comunidades como Paraisópolis.

"Lamentamos pelo ocorrido em Paraisópolis nesta segunda-feira (17) durante a visita de um dos candidatos ao governo do estado. Paraisópolis tem uma tradição em receber políticos, autoridades, artistas e personalidades sendo reconhecida como uma comunidade pacífica e organizada.

É importante ressaltar, contudo, que nenhum representante do G10 Favelas ou da União do Moradores e do Comércio de Paraisópolis (UMCP) - entidade que representa a comunidade, tinha conhecimento de qualquer agenda de candidatos na comunidade nesta data. Tampouco foi feito nenhum tipo de convite a nenhum dos nomes que concorrem a cargos eletivos neste pleito. 

Paraisópolis possui uma população trabalhadora e honesta que precisa de investimentos para transformar sua realidade. A comunidade quer participar da política e fazer com que os representantes do poder público possam ajudar a transformar as vidas de todos os que aqui residem, com respeito às diferentes visões partidárias e estando abertos ao debate nas mais amplas esferas.”

O tiroteio em Paraisópolis precisa ser esclarecido, sobretudo a respeito de sua motivação e confirmada ou descartada a hipótese de um evento sob medida para exploração política.

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