Épica popular malograda
O escritor, poeta e dramaturgo Ariano Dantas Vilar Suassuna é um personagem emblemático daquilo que se chama "cultura popular"
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O escritor, poeta e dramaturgo Ariano Dantas Vilar Suassuna é um personagem emblemático daquilo que se chama "cultura popular". Isto porque tendo nascido no Palácio do governo estadual da Paraíba, apresenta-se como um arauto da poesia e do teatro popular do Nordeste. O veio cultural ao qual se liga o escritor paraibano é o barroco da Península Ibérica (Gil Vicente, Calderón de Lá Barca).
Mas a característica mais marcante é a influência da literatura picaresca de Lazarillo de Tormes, Camões, D. Quixote e os romances de cavalaria, como os 12 pares de França e o romance picaresco italiano de Boccaccio. Segundo Suassuna, essa característica literária exerceu forte influência sobre o imaginário popular nordestino e a literatura de cordel, tanto quanto a tradição oral dos cantadores e repentistas nordestinos.
Ariano teve a oportunidade de aprender com esses artistas populares, em sua terra natal. Assistindo tripés e circos mambembe que percorriam o interior do país. E confessa que gostaria de ser um deles. A questão que se coloca é que esta tradição popular é reelaborada pela cultura erudita do autor. De forma que ela não se apresenta em estado puro, mas devidamente embalada numa forma superior a que Suassuna deu o nome de ARMORIAL, uma forma de nobreza popular nordestina feita a partir de brasões de família. A nossa nobreza é composta de vaqueiros, fazendeiros, bailarinas do pastoril, das cavalhadas etc.O rei é sempre o encantado, o encoberto, que ainda vai voltar e vencer a República. Regime ateu, cuja moeda não tem o nome de Deus e sim um ramo de café. Há algo curioso nessa cosmogonia armorial. O seu messianismo e a negação dos movimentos seculares, baseados em interesse de classe ou ideologias seculares.
Para Ariano, o modelo é o messianismo português, o movimento da Pedra Bonita e Canudos. A vertente literária de Suassuna é Silvio Romero e seu branqueamento, Euclides da Cunha e o enaltecimento dos nordestinos sertanejos e Guimarães Rosas e seu sertão mágico. 0 escritor coloca -se ao lado dos povos sensitivos, intuitivos, irracionais ao invés dos Apolíneos intelectuais. Nós. Somos o povo do sertão contra a elite cosmopolita do litoral. Não somos comerciantes e burgueses. Somos picarescos e românticos.
Tradicionais. Isto define a natureza do anticapitalismo rural de Ariano. Personificado no personagem de João Grilo (ou o amarelinho da zona da mata). Que vence todos e todas pela lábia, a esperteza, o jogo de cintura. Mas o escritor defende que o seu herói é positivo, não negativo como Jeca Tatu ou Macunaíma. Essa criação literária e social é eminentemente picaresco. Vem do romance ibérico, de Pedro Malasartes. Neste ponto, ele se opõe a cultura puritana do trabalho e animada pela ética do aventureiro.
Tese importante na criação de Ariano é a miscigenação racial, herdada de Freyre e responsável pela ambiguidade constitutiva do nosso caráter A síntese dos contrários. Nem branco, , nem preto. Branco e preto e indígena (casamento de judeu com mouro (ou etiope) e indígena. Raça. Singular nos trópicos, que se completa na paisagem árida e desértica do sertão.
Daí é possível entender a aversão a Revolução de 30, ao comunismo e a civilização urbana e industrial, como influência estrangeira e colonizadora. Tudo que não for rural, sertanejo, messiânico e monárquico é colonialismo estrangeiro, importação de fora, inautetuco. Aversão que só acabou quando a Rede Globo comprou os direitos de adaptação da obra de Ariano para a televisão. Suassuna, que sempre se mostrara refratário à indústria cultural moderna, deixa -se levar pela mão de Guel Arraes para os tentáculos da cultura de massa. O picaresco vira artigo da cultura de massa e é consumido por milhões de espectadores. Curiosamente a obra romanesca é menos conhecida. Oprincipal livro onde aparece exposta esta visão - a Pedra do Reino é pouco conhecida. Lá está exposta a visão de mundo do autor. Suassuna torna-se mais conhecido pelo teatro burlesco, as farsas, onde os aspectos da cultura popular são mais aceito e apreciados como pitorescos, cômicos, risíveis.
Ariano Suassuna mudou muito. Até se aproximar da cultura pop urbana ele se aproximou. Também dos comunistas do PC do B. Tornou-se secretário de Cultura de Arraes e foi promover o que ainda restava da cultura popular ( mestre Salustiano, Lia de Itamaracá, jjm.Borges). Mas não teve tempo de reescrever a sua obra, como gostaria.
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