Entre cidadãos e robôs

Pessoas estão se transformando em transmissores de conteúdos fragmentados. Dá-se notícia sobre tudo, mas nem sempre demonstram conhecimento mais aprofundado sobre os assuntos



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O Brasil saiu da roça para ver televisão na cidade e da televisão saltou, num átimo histórico, para a internet, para o ciberespaço. Não passou pelo livro, a voz da imaginação e do pensamento.

Essa síntese, um tanto simplória, talvez ajude a pensar como tudo foi tão rápido.

Evidentemente a população brasileira não foi apenas ver televisão na cidade. Foi à procura de emprego, de escola e de melhores condições de vida porque, no campo, a pobreza extrema permanecia como herança da colonização, da escravidão dos afrodescendentes e da espoliação das nações indígenas.

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A privação do direito ao acesso à terra, à educação, aos trabalhadores rurais, e as condições de trabalho semi-escravo e degradante, conjugado com o novo ciclo de industrialização do país, entre outros fatores, resultou no maior fluxo migratório para as cidades nos anos 1960, 1970 e 1980.

Segundo o IBGE, na década de 1940, o percentual da população residente no campo era de 70%. Em 1980, o percentual se inverteu, 70% das pessoas já estavam vivendo nas cidades, amontoadas nas periferias em condições subumanas.

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Em 2000, apenas 22% residiam no espaço rural. Em 2015, essa população passou para 36%.

Houve, portanto, uma inversão do fluxo, tendo em vista a geração de empregos e renda na zona rural e a melhoria das condições de vida dos camponeses que passaram a ter acesso a direitos e a uma vida melhor. A TV e a internet chegaram lá.

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O Brasil ultrapassou 200 milhões de habitantes, os grandes centros urbanos ficaram mais adensados e parecidos com o filme de ficção científica, Metrópolis, produzido em 1927, na Alemanha, pelo cineasta austríaco Fritz Lang. Uma obras-prima do expressionismo alemão, à frente do seu tempo.

O filme mostra o futuro, em 2026 (100 anos após a produção do filme), ricos industriais governando a grande cidade, Metrópolis, das torres de complexos arranha-céus, enquanto a classe trabalhadora e moradores subterrâneos trabalham em turnos de revezamento para operar as máquinas que fornecem cada vez mais poder aos proprietários-governantes.

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Em Metrópolis, as pessoas são dominadas e exploradas, transformadas em peças a mais das máquinas. Afinal, sem os trabalhadores as máquinas não se movem.

Essa observação feita por Karl Marx, quando ele escreveu sobre a alienação, ajuda a compreender os tempos modernos e como o Brasil está inserido nele.

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A imensa massa de pessoas, que vaga de suas casas para o trabalho e do trabalho para casa, no rítimo ditado pela cultura das máquinas nas cidades cidades brasileiras, conectada nos celulares, com fones enfiados nos ouvidos, experimenta uma forma de socialização intermediada também pelas maquinetas de comunicação.

O Brasil, segundo o IBGE, é o país onde mais cresce o acesso à internet no mundo. No final de 2014 chegou a 108 milhões de internautas. Superou o Japão.

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É também o 6º país com o maior número de smartphones. Isso quer dizer que os conteúdos estão na palma da mão e não mais na banca de revista ou na tv da sala. Isso é uma conquista extraordinária.

Porém, as maquinetas de comunicação unem e ao mesmo tempo separam as pessoas, as tornam meio catatônicas, robotizadas, diria, cada uma no seu mundo, acessando e repassando automaticamente um volume gigantesco de conteúdos das mídias, como verdadeiros processadores.

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O mesmo fenômeno de apropriação de indivíduos pelas máquinas na sociedade industrial se intensifica agora com as novas maquinetas de comunicação (celulares e outras).

Pessoas estão se transformando em transmissores de conteúdos fragmentados. Dá-se notícia sobre tudo, mas nem sempre demonstram conhecimento mais aprofundado sobre os assuntos.

Com o conteúdo na palma da mão, a escola está sendo repensada porque não consegue acompanhar as transformações que estão acontecendo. Aprende-se mais fora da escola do que na sala de aula. Isso não é de agora, mas atingiu níveis inimagináveis.

Muitos acadêmicos no Brasil e no mundo afora estão estudando o impacto cultural, social e econômico da veloz expansão dos meios de comunicação e das novas tecnologias, na sociedade.

O tempo de ocupação com entretenimento, a mecanização e a fragmentação da informação tem merecido maior atenção dos pesquisadores. Não se sabe ainda aonde vai dar isso.

Como o Brasil "não passou pelo livro" e a grande maioria da população foi direto para a tv e depois para a internet, a fim de obter informação e entretenimento, fica a dúvida se as gerações mais recentes estariam desenvolvendo capacidade de pensar, de imaginar e de criar ou se essas habilidades estariam sendo prejudicadas.

Evidentemente, não é só o livro que desenvolve essas habilidades, mas, livros são vozes, são expressão de pensamentos, ideias e imaginação.

As pessoas estão muito informadas, mas informação não é conhecimento. Informação se acessa e repassa automaticamente.

Conhecimento requer sensibilidade, desenvolvimento da percepção, intuição, observação, interpretação, capacidade de análise, maturação, habilidades que se contrapõem à instantaneidade, velocidade e senso de urgência provocados pelas maquinetas de comunicação e o enorme volume de conteúdos na rede.

Uma pesquisa do Youtube sobre o perfil da chamada "geração Z", pessoas nascidas de 1995 para cá, indicam que mais de 60% dos jovens se informam pelo Youtube, por vídeos, ou seja, por imagens e áudios. Será que não precisa imaginar, sendo que a mensagem já vem com todos os elementos?

Imaginar, segundo os dicionários, é criar imagem mental, conceber, fantasiar, idear, inventar, projetar.

É possível que o livro, seja ele em papel ou digital, sobreviverá, assim como sobrevive o teatro, que superou o surgimento do rádio, do cinema, da televisão, da internet e continua convivendo bem com as demais mídias, proporcionando um encontro entre dramaturgos, atores e o público.

A literatura também é um encontro de quem escreve com quem lê plano da imaginação. A arte em todas as linguagens também interage com quem vai ao encontro dela. O que seria da humanidade sem os artistas?

Na Europa, que antes passou pelo livro, educadores, depois do deslumbre com os novos equipamentos de comunicação, amplamente acessível aos estudantes, estão recuando, valorizando a sala de aula com estímulo ao debate e à relação com as linguagens artísticas.

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