Enigmas da morte do miliciano ligado aos Bolsonaro
"Sérgio Moro 'desconhecia' o pedido de captura de Adriano em qualquer parte do mundo; mas, curiosamente, sabia da operação montada para matar Adriano – não para prendê-lo – numa propriedade rural no interior da Bahia", escreve o colunista Jeferson Miola
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A morte do miliciano Adriano da Nóbrega está cercada de enigmas. Os muitos pontos obscuros, as contradições e dúvidas sobre o episódio animam as suspeitas de execução.
As suspeitas sobre a queima de arquivo ganham veracidade porque Adriano não era um bandido trivial. Ele chefiava o Escritório do Crime, milícia especializada em assassinatos por encomenda com matadores de aluguel, e privava da intimidade nos negócios do clã Bolsonaro na política.
Por intermédio do sumido Fabrício Queiroz, a mãe e a esposa de Adriano ficaram contratadas pelo gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembléia Legislativa do RJ até dezembro de 2018. Elas só foram demitidas depois que começaram as investigações sobre as “rachadinhas” e os crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa contra Flávio Bolsonaro.
A morte do miliciano, envolta em enigmas, está longe de ser esclarecida:
1. Adriano era alvo de uma ordem de captura internacional da Interpol desde janeiro de 2019. Apesar disso, Moro não incluiu o perigoso miliciano na lista de bandidos mais procurados no Brasil, publicada em janeiro passado pelo seu Ministério [ler aqui a respeito];
2. Sérgio Moro “desconhecia” o pedido de captura de Adriano em qualquer parte do mundo; mas, curiosamente, sabia da operação montada para matar Adriano – não para prendê-lo – numa propriedade rural no interior da Bahia;
3. a execução do miliciano ligado aos Bolsonaro em alegado “confronto” com a polícia de um Estado governado por petista não deixa de ser um ótimo álibi para a alegação de “isenção” policial, não de queima de arquivo;
4. o filho presidencial Eduardo Bolsonaro coincidentemente estava em Salvador justo no dia da execução do miliciano. Segundo ele avisou em rede social, estava em Salvador pela 1ª vez. E não escondeu sua “Satisfação [em] conhecer Salvador com @alexandrealeluia”. Incrível coincidência [ler aqui].
5. Adriano foi morto na chácara de Gilsinho de Dedé, vereador do PSL de Esplanada, uma pacata cidadezinha interiorana distante 155 km da capital Salvador. A curiosidade é que a Câmara de Vereadores de Esplanada, composta por 13 vereadores, tem 12 partidos representados no Legislativo. Por outra daquelas incríveis coincidências que rondam os Bolsonaro, o miliciano fugiu para se esconder justamente no sítio do vereador do PSL e não na propriedade de nenhum vereador dos outros 11 partidos do Legislativo de Esplanada;
6. chama atenção o silêncio ensurdecedor dos Bolsonaro em relação à morte de Adriano, a quem no passado recente Jair e Flávio devotaram discursos de homenagem nas tribunas da Assembléia do Rio e da Câmara dos Deputados. Flávio elogiou a “dedicação e brilhantismo” de Adriano, e Jair declarava o miliciano como um “brilhante oficial”, talvez por associação do adjetivo com o nome do seu ídolo e inspirador, o também bandido morto Brilhante Ustra.
7. Maurício Teles Barbosa, o Secretário de Segurança da Bahia, alega que Adriano foi morto [não executado] durante tiroteio. Entretanto, vídeo e fotografias da cena da execução mostram que houve de fato uma execução, não um tiroteio.
8. Adriano era um alvo fácil para ser capturado com vida. Estava numa chácara isolada, sozinho, sem comparsas, sem munições, com arsenal bélico inexpressivo [1 revolver, 1 pistola 9 mm e 2 espingardas enferrujadas] e sitiado no interior de uma pequena casa. Este cenário da operação mostra, portanto, que a prioridade nunca foi prender Adriano, mas sim matá-lo. O advogado de Adriano, aliás, confirmou que o próprio miliciano sabia que não queriam prendê-lo, mas sim matá-lo. Ele sabia que era alvo de queima de arquivo.
9. Um estranho mistério ronda o corpo de Adriano da Nóbrega. Até o momento, nada se sabe sobre o paradeiro do defunto. O corpo do Adriano já está ficando tão sumido quanto Queiroz e tão inverossímil como a facada em Bolsonaro. Afinal, cadê o corpo do morto? Ou este é um caso raro de morte sem cadáver?
10. E, quando o cadáver aparecer, é preciso confirmar cientificamente que pertence à pessoa física do Adriano da Nóbrega. E é preciso que uma autopsia confiável mostre quantos tiros foram disparados em Adriano e quais partes do corpo dele foram alvejadas. Com a autopsia, o Secretário de Segurança da Bahia poderá então comprovar a tese de que não houve execução.
11. Aliás, outra coincidência é que o Secretário de Segurança da Bahia é do Rio de Janeiro e delegado da Polícia Federal. Na descrição da concessão da Comenda 2 de Julho ao Secretário de Segurança, que fora proposta pelo deputado do PSL [outra vez o PSL!] Delegado Deraldo Damasceno em 2015, a biografia de Maurício Teles Barbosa apresenta credenciais importantes que permitiriam que a caçada a Adriano tivesse desfecho bem distinto do havido. No seu currículo, o Secretário Maurício tem “Cursos de inteligências – ABIN, Ações Táticas – PF, Operações de Inteligência – Polícia Federal, Operações Especiais – Polícia Federal, Gerenciamento de Crises – Polícia Federal e participou de cursos em outros países de Inteligência Anti sequestro – Colômbia, Inteligência em Terrorismo – Israel”.
Não menos enigmáticos são os silêncios tanto do Ministro Sérgio Moro, como do governador da Bahia, Rui Costa, sobre a morte do miliciano ligado ao clã dos Bolsonaro.
É enigmático, aliás, que tenha sido Witzel/RJ e não Rui Costa/BA o governador que, até o momento, se pronunciou sobre a execução de Adriano da Nóbrega – e, naturalmente, para sustentar a falsa tese do “confronto”.
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