Em movimento e fitando o horizonte

Lula
Lula (Foto: Ricardo Stuckert)


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Já escrevi que as eleições de 2022 foram vencidas por uma grande coalizão, não foi possível a nenhuma força política, do campo democrático, vencer sozinho a eleição.

Contudo, vencemos Bolsonaro, mas não a extrema-direita, sua existência toxica, sua ignorância e ressentimento.

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O que se espera dos democratas, da direita à esquerda? Penso que a tarefa é apoiar uma transição.

A tarefa de Lula – Se âmbito internacional cabe a Lula colocar o Brasil na liderança do Sul Global, internamente a tarefa de Lula, nessa quadra da história, é conduzir o país até um novo pacto político.

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Lula é o caminho da transição, mas não é o futuro.

A transição democrática - Temos que olhar o passado, ele nos ajuda a compreender o presente e a planejar o futuro; quem sabe um porvir com menos erros.

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Meu olhar alcançou o longínquo 1985 - vão-se quase quarenta anos -, tempo em que o Brasil vivia em permanente tempestade; com um Sarney - que emergiu para presidente da república após a tragédia da morte de Tancredo Neves -, cercado de desconfiança de todos os lados, conduziu o país numa transição delicada, do autoritarismo para a construção de um Estado de Direito. 

O próprio Sarney escreveu que “...a transição é a tarefa mais difícil da política. Ela tem sido o túmulo de grandes estadistas. Transforma heróis em vilões, santos em demônios, mártires em inquisidores, democratas em ditadores e reduz a cinzas grandes lideranças”; ler o texto “A Transição Democrática no Brasil”, dele próprio, é uma viagem no tempo para quem, como eu e tantos outros, então muito jovens, não compreendíamos nada e tínhamos certeza de tudo.

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Se Sarney conduziu o país à democracia e garantiu um novo pacto político, através da constituinte e materializado na constituição, a Lula cabe fazer a transição para um novo tempo; Lula é grande, enorme, lega ao mundo uma grande, rica e maravilhosa história, contudo, o país precisa de uma nova esquerda, de novas lideranças e novos olhares, pois, todos os partidos e líderes que se apresentam de esquerda, são nada além de lideres de seus próprios interesses e privilégios, cooptados pela lógica do sistema.

O ornitorrinco – As velhas lideranças não têm espaço no futuro, porque eles, que se julgavam a “vanguarda do proletariado”, tornaram-se garantidores do mercado financeiro. Pode parecer um delírio meu, mas apesar de sua sensibilidade social, Lula tornou-se um conservador, assim como a elite do sindicalismo nacional.Chico de Oliveira, professor emérito da USP, afirmou que “... o grupo dirigente do PT, passou a constituir uma nova classe social” ao ocupar posições nos conselhos de administração das principais fontes de recursos para investimentos no país: o BNDES e os fundos de pensão das empresas estatais.

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Essa nova classe social ocupa espaço onde o capital privado busca recursos para acumular: os fundos estatais, de um lado, e os fundos institucionais, de outro. 

São uma nova classe, com interesses específicos e a boa gestão financeira do capital é a principal; defendem interesses que são legítimos, do ponto de vista deles, mas que nem sempre interessam à sociedade, aliás, a sociedade sequer foi consultada quando da constituição dos fundos de pensão, para os quais contribuem compulsoriamente. 

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É a essa situação estranha que Chico de Oliveira chamou, numa entrevista à FOLHA, em 2003, de ornitorrinco; um “bicho estranho - mamífero, ovíparo e com bico de pato-, o ornitorrinco é a alegoria da sociedade brasileira atual, em que setores dinâmicos da economia se alimentam da miséria para funcionar...”. Vou desenvolver essa reflexão noutro momento. Voltemos à transição - Vencer Bolsonaro fez com que aqueles que cerraram fileiras pela defesa da democracia, se julguem no direito a uma fatia maior do bolo, mas o bolo não existe, ele tem que surgir do movimento da sociedade, que indicará o caminho.

Lula, o condutor da transição, deve movimentar-se para que a democracia, meramente representativa, dê mais um passo e deixe de ser uma palavra e transforme-se num estado de espírito.

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Cabe a Lula, enquanto condutor da transição, garantir a liberdade, abrir os olhos da sociedade para a importância da igualdade e da urgência de constituir-se uma sociedade fraterna.

Em 1985 o Brasil venceu o dilema entre autoritarismo ou democracia; 2023 tem seu próprio dilema: seguiremos sob a lógica de um Estado que foi apropriado pelo liberalismo - ideologia que corrói a humanidade que nos resta -, ou buscaremos um outro caminho, um caminhar diferente, um Estado de Bem-estar?

Repito: vencemos Bolsonaro, mas o bolsonarismo, o olavismo e o lavajatismo seguem vivos e assanhados; precisamos desnudá-los e derrotá-los, pois eles representam o que de pior existe: fascismo, hipocrisia, ressentimento e aporofobia. 

Com esses lordes Voldemort em ação: o jogo democrático não é único, eles aceitam o arbítrio; há oposição conspirativa; há grupos de ação extremista e a sombra golpista, ressuscitada em 2016, voltou a assombrar.

Penso que, para vencê-los, precisamos da liderança de Lula, desde que ele esteja de olho na construção de um pacto político para as próximas gerações e não apenas nas próximas eleições.

Para onde vamos? Não sei exatamente, mas o povo, com seu enorme poder criativo e criador, nos levará ao lugar certo.

Eu sinto que os ventos sopram do centro para a esquerda, contudo, o caminho para o país alcançar o consenso de um novo pacto político, reside em dois “pês” fundamentais, o da Política e o do Povo, sempre em movimento e fitando o horizonte.

Essas são as reflexões.

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