Em abril, mídia brasileira comemorava “derrota” da “Ley de Medios” na Justiça

A regulação dos meios de comunicação eletrônicos na Argentina vem assustando a igualmente concentrada mídia brasileira



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Chegou ao fim, na Argentina, uma guerra judicial que já durava mais de quatro anos: a Corte Suprema de Justiça do país considerou constitucional a lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, a dita "Ley de Medios", ou "Lei da Mídia". Aprovada em 2009 pelo congresso, de lá para cá não vigorou devido a liminar obtida pelo Grupo Clarín (a Globo argentina), que suspendeu os efeitos daquele marco regulatório.

Com a queda da última barreira à execução da nova lei argentina, os grupos de mídia que detêm controle acionário de uma multiplicidade de plataformas, tais como rádios, jornais, revistas, emissoras de tevê a cabo ou aberta, portais de internet e empresas de telefonia, terão que se desfazer da grande maioria delas, muitas vezes tendo que optar por uma ou duas em detrimento das outras.

Essa regulação dos meios de comunicação eletrônicos daquele país, então, vem assustando a igualmente concentrada mídia brasileira, que chega a igualar ou a superar a congênere argentina como oligopólio.

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Com efeito, isso ocorre porque as concessões de rádio e televisão no Brasil estão –praticamente todas – concentradas nas mãos de algumas poucas famílias e, tal qual no país vizinho, seriam passíveis de dissolução se a comunicação, neste país, tivesse regras como as que vigoram para tantos setores de nossa economia regulados pelo CADE, que atua contra a formação de monopólios, oligopólios e carteis.

O risco que a concentrada grande mídia brasileira enxerga em regulamentação de seu setor ocorrendo tão próxima de nós, portanto, foi o que gerou a reportagem do Jornal Nacional sobre a vitória do governo de Cristina Kirchner na Corte Suprema de Justiça, o que explica as artimanhas que o telejornal usou para tentar desmoralizar o marco regulatório agora em vigor no país vizinho.

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A reportagem da edição do JN de 29 de outubro de 2013 colocou a questão como produto de "ataque à liberdade de imprensa" que o governo argentino estaria praticando. O relato do telejornal sobre a briga judicial do Grupo Clarín contra a lei aprovada pelo Legislativo do país ainda tentou fazer parecer que fora imposta pelo governo de forma ditatorial. Além disso, escalou um "especialista" simpático à sua opinião para criticá-la.

Mas o pior mesmo foi o âncora principal do JN, Willian Bonner, insinuar que a maioria dos juízes da Corte Suprema argentina teriam atuado de forma política por terem sido indicados pelo ex-presidente Néstor Kirchner, antecessor – e, então, marido – da hoje presidente Cristina Kirchner, apesar de que lá, como aqui, sempre foi o presidente da República quem indicou os ministros das Supremas Cortes.

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A insinuação do Jornal Nacional sobre o judiciário da Argentina e a escolha que o telejornal fez de só exibir a opinião de "especialista" favorável à sua opinião são os pontos que revelam com maior vigor a necessidade de o Brasil ter também seu marco regulatório de forma a extinguir de vez o oligopólio que temos no setor de comunicação, o qual jamais seria tolerado em qualquer outro setor de nossa economia.

A família Marinho, por exemplo, NÃO PODE usar uma concessão pública de tevê para vender suas teses políticas e ideológicas enquanto censura as de outros setores da sociedade que, tanto quanto quaisquer outros, também são DONOS daquela concessão.

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Mas vamos aos pontos destacados – a insinuação contra o judiciário argentino e a escolha do "especialista" concordante.

Há pouco mais de seis meses, por exemplo, não havia insinuações em nossa mídia sobre a idoneidade do judiciário argentino. Muito pelo contrário, ela comemorava "derrota" do governo argentino na justiça por esta ter considerado "inconstitucional" os mesmos artigos da "Lei de Meios" que, agora, a cúpula do judiciário do país considerou constitucionais.

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Entre 13 e 18 de abril deste ano, os jornais Folha de São Paulo, O Globo e Valor Econômico publicaram matérias comemorando a "derrota" do governo Kirchner na mesma justiça que, agora, a Globo – e, em breve, o resto da grande mídia – insinua que favoreceu indevidamente aquele mesmo governo.

Abaixo, as matérias dos três jornais comemorando o favorecimento que seus pontos de vista receberam da justiça argentina há cerca de seis meses.

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Folha de São Paulo

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13 de abril de 2013

Tribunal impõe derrota a Cristina, segundo jornal

Juízes consideraram inconstitucionais artigos da Lei de Meios, de acordo com 'La Nación'

Fontes da Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual da Argentina confirmaram ontem à noite ao jornal "La Nación" que um tribunal de Buenos Aires declarou a inconstitucionalidade de dois artigos da Lei de Meios do país, impondo uma derrota ao governo na briga com o grupo de comunicação Clarín.

Considerado um "monopólio" pelos kirchneristas, o Clarín é o mais poderoso grupo da imprensa local, contando com emissora de TV, empresa de cabo, portal de internet, jornais e rádios.

A Lei de Meios, promulgada em 2009, previa nesses dois artigos a proibição da propriedade cruzada de meios (empresas de cabo não poderiam atuar em TV aberta), limites de licenças por empresa e dava prazo de um ano para adequação à legislação.

O caso deve seguir para a Corte Suprema de Justiça do país, segundo fontes do jornal argentino e manifestações no Twitter da rádio pública, emissora estatal. O governo havia obtido uma decisão favorável na primeira instância do processo.

Em ato político à noite, a presidente Cristina Kirchner, sem se referir diretamente ao caso, criticou medidas cautelares que impedem efeitos práticos para leis: "Para os invisíveis e para os pobres não há cautelares nem inconstitucionalidades", afirmou.

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Valor Econômico

17 de abril de 2013

Cristina Kirchner sofre derrota na Justiça sobre lei de mídia

Por César Felício | Valor

BUENOS AIRES – O governo da presidente argentina Cristina Kirchner foi derrotado hoje em decisão de segunda instância da Justiça argentina sobre a "lei de meios", que restringe o tamanho dos grupos de mídia eletrônica na Argentina. A Câmara Federal Civil e Comercial declarou inconstitucional os dispositivos que estabelecem o limite de 24 licenças de televisão a cabo e do limite de 35% para a cobertura geográfica com serviços de televisão no país. Também caiu a norma que proibia a prestação simultânea de serviços de TV a cabo e de TV aberta.

A medida beneficia o grupo Clarín, maior conglomerado de mídia na Argentina, com quem o governo trava uma disputa política desde 2008. A decisão foi recebida com irritação pela agência governamental que regula o setor. "Declararam a inconstitucionalidade de todos e cada um dos incisos que afetam os negócios do grupo Clarín, eliminando o espírito antimonopólico da lei", disse em nota oficial o diretor da Autoridade Federal de Serviços de Comunicação(AFSCA), Martín Sabatella. Segundo ele, o governo irá recorrer à Suprema Corte

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O Globo

18 de abril de 2013

Lei de Meios: governo Kirchner sofre revés

Tribunal declara inconstitucionais artigos prejudiciais ao grupo Clarín

BUENOS AIRES – Um dia depois do Tribunal da Câmara Federal Civil e Comercial ter declarado a inconstitucionalidade parcial de dois artigos da polêmica Lei de Meios denunciados há mais de três anos pelo grupo Clarín, a presidente Cristina Kirchner voltou a questionar a atuação do Judiciário argentino.

Horas antes da realização de um panelaço em repúdio ao projeto de reforma do Judiciário que a Casa Rosada pretendia transformar em lei nesta quinta-feira, a presidente disse ter ficado "muda" pela sentença da câmara, da qual o governo pretende apelar.

Assim, a decisão final sobre a constitucionalidade ou não da Lei de Meios ficará em mãos da Corte Suprema de Justiça, que não tem prazo para anunciar sua decisão.

A sentença da Câmara estabelece que os artigos 45 e 48, que tratam de TV a cabo, são parcialmente inconstitucionais. Já os artigos 41 e 161, que limitam o número de licenças de TV e também considerados inconstitucionais pelo grupo Clarín, não foram anulados pela Câmara.

O grupo apelará da decisão, que, como no caso dos artigos 45 e 48, deverá ser ratificada ou não pela Corte Suprema. Até que o máximo tribunal ponha um ponto final à disputa, os artigos envolvidos na queda de braço judicial não serão aplicados.

A posição dos membros da câmara representou um revés para o governo Kirchner, já que o tribunal confirmou pontos dos artigos 45 e 48 que, se fossem aplicados, significariam um duro golpe para o Clarín. A câmara defendeu, por exemplo, o direito do grupo de fornecer o serviço de TV a cabo em todo o país e não apenas em 24 municípios, como estabelece a lei.

Também foi autorizada a possibilidade de operar, numa mesma cidade, um canal de TV aberta e outro de TV a cabo. O governo pretendia impedir esta sinergia. Por fim, a restrição que limitava o raio de ação dos canais a 35% da audiência nacional também foi considerada inconstitucional pela câmara.

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Acima, a evidência de que a mídia brasileira confia ou não na justiça argentina de acordo com a ocasião.

Mas não é só aí que fica claro que a comunicação, também no Brasil, precisa mesmo ser desconcentrada. O Jornal Nacional escolheu para comentar o fato no país vizinho um "especialista" favorável ao seu ponto de vista, o presidente da Associação Internacional de Radiodifusão, Alexandre Jobim, que fez críticas à lei de meios da Argentina.

Diz Jobim:

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"Essa lei está com um direcionamento. Ela quer derrubar um suposto oligopólio de alguns grupos independentes que são opositores ao governo Kirchner, e por outro lado o governo vai estar fazendo um movimento contrário, ou seja, um movimento de fazer uma verdadeira colonização dos meios mediante publicidade oficial nos meios aliados com essa situação. Nenhuma lei, o parlamento maioria governista, e quer quebrar os contratos pela metade, segurança jurídica, o ato jurídico perfeitos de que são princípios não só da constituição na Argentina, como da Casa Interamericana de Direitos Humanos"

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O telespectador do Jornal Nacional deve ter ficado pensando – ou a Globo quis que ficasse pensando – que é ponto pacífico que estaria havendo alguma violação de direitos e cerceamento à liberdade de expressão na Argentina, promovido por um governo "ditatorial". Contudo, se houvesse interesse da emissora em fornecer informação e não, tão-somente, defesa de seus próprios interesses – em detrimento dos direitos da quase totalidade da sociedade, diga-se –, ela deveria ter apresentado um especialista tão ou mais eminente e representativo que Jobim, mas com opinião diametralmente contrária.

Ou as pessoas não devem ter acesso aos dois lados da moeda?

Isso, claro, é o que mandaria a pluralidade opinativa que, aliás, a Globo diz que adota em seu jornalismo – mas que, como se vê, não cumpre.

Poderia, a emissora da família Marinho, ter ido ouvir, por exemplo, o Relator Especial da ONU sobre Liberdade de Expressão e Opinião, Frank La Rue, que, ao site da organização sediada em Nova Iorque, deu declaração diametralmente oposta da que deu o "especialista" eleito pela Globo para concordar consigo.

Leia, abaixo, trecho do que diz o relator da ONU sobre a lei de meios argentina:

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"(...) A lei foi levada a cada província, onde foram feitas consultas. (...) A lei da Argentina faz um balanço equitativo nas telecomunicações entre interesses comerciais, comunitários e públicos, que na minha visão deveriam ser independentes. E os meios comunitários não são meios comerciais e não podem entrar na mesma lógica (...)"

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Por fim, leia na íntegra, abaixo, a matéria do Jornal Nacional citada neste texto. E tire as suas conclusões.

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JORNAL NACIONAL

29 de outubro de 2013

Governo argentino defende Lei de Meios, que vai limitar o Grupo Clarín

Lei é considerada constitucional e juízes aprovam limite de concessões de rádio e TV. Com decisão, governo vai limitar o tamanho do Grupo Clarín.

A Corte Suprema da Argentina considerou constitucional a Lei de Meios, aprovada em 2009 pelo Congresso. A lei estabelece novas normas de concessão de rádio e de televisão na Argentina.

A decisão desta terça-feira (29) é mais um capítulo na guerra de quase seis anos travada entre a presidente Cristina Kirchner contra o Clarín, maior grupo de comunicação da Argentina e uma das poucas vozes críticas ao governo.

A posição da Suprema Corte representa uma vitória para o governo, que vai conseguir limitar drasticamente o tamanho do grupo de comunicação, considerado seu inimigo número um.

Quatro dos sete juízes que participaram do julgamento desta terça-feira (29) foram indicados por Nestor Kirchner, marido e antecessor de Cristina, morto há três anos.

Seis juízes consideraram a Lei de Meios constitucional e aprovaram o limite de concessões de rádio e TV. O artigo que possibilita o fim imediato das concessões, mesmo de longo prazo, teve o placar mais apertado: quatro a três.

Na sentença de quase 400 páginas, os juízes cobraram ainda a transparência nas políticas de subsídio e propaganda oficial.

Com a decisão da Corte, o Grupo Clarín terá que se desfazer de grande parte dos canais de rádio, TV, TV a cabo e internet. Serão pelo menos 150 de suas 200 concessões. Além de edifícios e equipamentos, onde funcionam suas emissoras.

O governo explicou nesta terça-feira (29) que o prazo para o cumprimento voluntário da lei já venceu e que, a partir de agora, seguirá com o processo de forma unilateral. As empresas terão que manter os funcionários e os serviços até a total transferência para os novos donos. Se alguma empresa se sentir prejudicada em relação à indenização, poderá entrar na Justiça.

Em nota, o Grupo Clarin declarou que respeita a decisão da Justiça e não descarta entrar com uma ação em cortes internacionais. O grupo considera que a decisão não respeita os direitos adquiridos para concessões de médio e de longo prazos, e que a lei afeta claramente a liberdade de expressão e quer silenciar os meios que exercem o jornalismo crítico.

O presidente da Associação Internacional de Radiodifusão, Alexandre Jobim, fez críticas à lei de meios da Argentina.

"Essa lei está com um direcionamento. Ela quer derrubar um suposto oligopólio de alguns grupos independentes que são opositores ao governo Kirchner, e por outro lado o governo vai estar fazendo um movimento contrário, ou seja, um movimento de fazer uma verdadeira colonização dos meios mediante publicidade oficial nos meios aliados com essa situação. Nenhuma lei, o parlamento maioria governista, e quer quebrar os contratos pela metade, segurança jurídica, o ato jurídico perfeitos de que são princípios não só da constituição na Argentina, como da Casa Interamericana de Direitos Humanos", declara Alexandre Jobim, presidente da Associação Internacional de Radiodifusão.

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