Eduardo Galeano, 8 anos depois
Ele estaria especialmente atento ao que acontece no Brasil, que dizia ser sua segunda pátria
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Nesta quinta-feira, 13 de abril, se cumprem oito anos da morte de Eduardo Galeano. E nessa data, como costuma acontecer nesses anos todos, sinto ainda mais forte a mesma imensa falta dele que dia após dia habita a minha alma.
Presumo que ele estaria especialmente atento ao que acontece no Brasil, que dizia ser sua segunda pátria. E também o que acontece nesse mundo cada vez mais transtornado e confuso.
Há poucas semanas terminei de traduzir uma série de artigos escritos por Galeano numa temporada também especialmente tumultuada que o mundo viveu, tempos de tensão permanente: os anos entre 1989 e 1992.
Os textos foram reunidos num livro chamado “Ser como eles”, que a L&PM deve lançar daqui a pouco.
Galeano aborda desde a derrubada do muro de Berlim até o que se vivia tanto nos Estados Unidos como na América Latina. Tempos do fim do muro de Berlim, da reviravolta nos países do Leste Europeu, de turbulências pelas nossas comarcas.
E o que me chamou a atenção, além da boa escrita de sempre, salpicada de indignação e esperança, é que apesar de trazerem no final a data em que foram escritos, os textos desse livro são estranhamente atuais. Trazem data mas não são datados.
Costuma acontecer que, com o passar do tempo, a lembrança de escritores que se foram para sempre acabe se esvaziando. Não é o caso de Galeano. Seus livros continuam sendo devorados por leitores em tudo que é canto.
Acho que isso acontece não apenas pela qualidade do texto e pela permanência de seu olhar sempre tão certeiro e afiado, mas pela forma com que Galeano encarava o seu ofício.
Registro aqui uma explicação dele relacionada ao sistema em que o mundo vive:
– Um sistema que quebra tudo o que toca. O sistema que separa a alma do corpo, o passado do presente, o discurso público do privado, a emoção da razão. Enfim, que separa as pessoas entre si, divorcia o tempo presente do tempo passado e cada pessoa de todas as demais. Dentro de cada um de nós, habitantes do nosso tempo, é muito difícil reconstruir a unidade do olhar. Tudo tende a romper essa unidade.
E mais adiante:
– Acontece a mesma coisa quando nos ensinam história. O que nos ensinam é a história do desvínculo, ou seja, uma história que aconteceu na Europa ou na América ou até mesmo dentro de nossos país, mas sem nenhuma conexão com aquilo que estava rocorrendo ao mesmo tempo no resto do mundo. Ou com o que havia ocorrido antes com o que ocorreria depois. Existe uma desconexão no espaço e no tempo, no ensino da história, na transmissão da memória. E não se trata de uma desconexão casual: ela corresponde à necessidade de desconexão de um sistema cultural do desvínculo.
– Para lutar contra isso eu recolho, ou tento recolher, os pedacinhos dessa memória quebrada, dessa identidade esquartejada, e recuperá-los com a ideia de integrá-los numa estrutura de conjunto que esteja viva.
Pois aqui no Brasil de hoje ele teria para recolher milhares e milhares de pedacinhos dessa memória que foi quebrada ao longo de tortuosos quatro anos. Anos tenebrosos, que, de alguma forma, ele teve a sorte de não ver...
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