Eduardo Campos tinha a certeza da vitória

Criador de consensos, ele enxergava uma vereda. Previa ataques sangrentos entre tucanos e petistas, que lhe abririam o caminho para a presidência da República

Criador de consensos, ele enxergava uma vereda. Previa ataques sangrentos entre tucanos e petistas, que lhe abririam o caminho para a presidência da República
Criador de consensos, ele enxergava uma vereda. Previa ataques sangrentos entre tucanos e petistas, que lhe abririam o caminho para a presidência da República (Foto: Leonardo Attuch)


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Conheci Eduardo Campos no dia 31 de outubro de 2011. Era uma segunda-feira e Recife recebia o lançamento de um livro-reportagem sobre 30 anos do jornal Movimento, um dos principais veículos de resistência à ditadura militar, criado pelo jornalista Raimundo Rodrigues Pereira.

Naquele momento, Eduardo era o governador mais popular do País, reeleito com quase 90% dos votos, e sua candidatura à presidência da República já era uma hipótese nem tão remota. Quando Raimundo e outros grandes nomes do jornalismo, como Fernando Morais, discorriam sobre o Movimento, Eduardo e sua companheira Renata chegaram, sem nenhum aparato especial, ao evento. A ele foi passada a palavra, que falou com grande entusiasmo sobre um jornal que foi apoiado diretamente por seu avô Miguel Arraes.

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"Nossa leitura essencial naqueles duros anos", disse o governador pernambucano.

O jornal Movimento criava uma conexão circular e especial entre alguns personagens da nossa história. Segundo relatos de quem viveu os anos de chumbo, o destino de parte dos recursos obtidos no famoso roubo do cofre do ex-governador paulista Adhemar de Barros foi a guerrilha na Argélia, onde estava exilado Miguel Arraes. Uma ação espetacular conduzida pela Vanguarda Popular Revolucionária, a VPR, que tinha nos seus quadros a jovem Dilma Rousseff. Eis a magia da história e também do dinheiro. Surrupiados por um político que colaborou com a ditadura e se tornou símbolo da corrupção, os recursos do cofre do Adhemar, ou do "Dr. Rui" (como era o apelido de sua amante), viajavam à Argélia, de onde, administrados por Arraes, ajudariam exilados brasileiros na Europa e, quem sabe, financiariam, em parte, esforços de resistência à ditadura, como o jornal Movimento.

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Ontem, ao falar da morte de Eduardo Campos, a presidente Dilma, emocionada, lembrou Arraes, "referência de um geração". Morto de forma trágica no mesmo 13 de agosto em que faleceu seu avô, Eduardo nos revela a fragilidade da vida e seus mistérios insondáveis, que parecem reger nossa história política. Que segredos ainda estão guardados? Haverá segundo turno? Marina será candidata? Como bem disse a ex-senadora, visivelmente abatida, não é hora de falar de política.

Naquele primeiro encontro com Eduardo, em 2011, o que me impressionou positivamente foi sua imensa gratidão a Raimundo Rodrigues Pereira, que foi amigo pessoal de seu avô, o que fez com que crescesse minha simpatia por ele. Outro bom amigo de Eduardo, o também jornalista Evaldo Costa, havia sido secretário de comunicação de Arraes e foi mantido no mesmo cargo por ele.

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Campos, dizia Evaldo, era um político raro, capaz de criar consensos e convergências à primeira vista impossíveis. Num estado marcado por grande concentração de renda, foi capaz de vencer resistências ideológicas e implantar um projeto popular, que, anos depois, conquistou a adesão da própria elite pernambucana - ela mesma beneficiária do ciclo de crescimento e de grandes obras no estado nos últimos dez anos.

Ele acreditava firmemente que poderia repetir a experiência no plano federal, quebrando a polarização PT-PSDB, que rege a política brasileira há praticamente vinte anos. Quando o encontrei há poucos dias, num shopping-center em São Paulo, ele chegava acompanhado de um único assessor para um almoço e me explicou por que havia decidido fazer uma campanha mais propositiva, focada em temas como escola em tempo integral e passe livre para os estudantes no transporte público. "Meus amigos tucanos querem que eu bata na Dilma. Meus amigos petistas esperam que eu ataque o Aécio. Não vou fazer isso, porque não é isso o que o povo brasileiro espera de mim".

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Havíamos combinado uma grande entrevista, que seria realizada nos próximos dias. Eduardo estava convencido da vitória. Não agia como quem planta em 2014 para colher em 2018 ou mesmo depois. Ele previa que ataques sangrentos entre petistas e tucanos lhe abririam o caminho para a vitória.

De Eduardo, fica uma imagem simpática, mas apenas um traço de seu caráter que me assustava: uma imensa vontade de poder. Mais do que qualquer outro político brasileiro, ele parecia desejar a presidência da República e ter traçado sua conquista como meta desde os primeiros anos na vida pública.

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À presidente Dilma, por exemplo, o poder chegou como fruto de uma série de circunstâncias favoráveis, o que não tira o mérito de quem soube agarrar as oportunidades. Aécio Neves, por sua vez, parece ter mais estrela do que propriamente vontade de poder e jamais transformou a presidência no foco central de sua vida. Por fim, Marina Silva, cuja história de vida já é prova de superação, talvez se veja agora como predestinada ao cargo mais alto da República.

Na véspera da morte, Eduardo Campos talvez tenha tido a melhor noite de sua vida. Havia concedido duas ótimas entrevistas ao Jornal Nacional e à Globonews, onde seu desempenho foi muito bom. Na manhã seguinte, ele se despediu da companheira Renata, que voou para Recife, e de Marina Silva, que não participaria da agenda de campanha em Santos e no Guarujá.

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Na manhã de ontem, mais do que nunca, ele tinha pressa e também a certeza da vitória.

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