Eduardo Bolsonaro: incitação e apologia ao crime contra professores
Um ponto importante que pouco foi explorado pela imprensa e pelos formadores de opinião é anotar onde foi feito o discurso
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O discurso de Eduardo Bolsonaro que compara “professores doutrinadores” a traficantes evidencia o quanto o pensamento da extrema direita sobre a educação é fútil e superficial, e passa longe dos reais problemas que existem nas escolas, a evasão escolar, a falta de infraestrutura, os baixos salários de professores, para atacar o que considera um risco, uma criação que só existe na cabeça de terraplanistas.
Para a extrema direita, dentre outras dezenas de exemplos, se um professor disser a alunos que todos devem andar armados é liberdade de expressão. Contudo, se disser que todos precisam respeitar a orientação sexual do outro é um caso de doutrina, por se tratar de “ideologia de gênero”, que atenta contra os valores familiares e com capacidade de influenciar a homossexualidade entre crianças, e outras bobagens da mesma espécie.
Esse tipo de concepção tosca foi o que originou o debate da Escola Sem Partido, com um Projeto de Lei (7180/2014) apresentado e discutido na Câmara dos Deputados, e outros espalhados pelas assembleias legislativas e câmaras de vereadores do país, que na verdade intentam impor uma mordaça ao livre debate nas escolas, tratando de garantir a hegemonia da perspectiva conservadora, ao invés de fazê-la dialogar com visões diferentes para se construir uma educação mais democrática, neutra e verdadeiramente livre.
Mas o que de fato importa no discurso do filho nº 03 do ex-presidente inelegível não é constatar o óbvio, mas o que vai ser apurado pela Polícia Federal: se ele pode ter cometido crimes. E nesse ponto voltarmos para o dilema da contemporaneidade: quando se pratica liberdade de expressão e de opinião, e quando ela foi extrapolada. O equívoco de achar que a palavra no ambiente público, sobretudo a de agentes públicos, pode ser absoluta e despida de qualquer controle social.
Um ponto importante que pouco foi explorado pela imprensa e pelos formadores de opinião, e que faz muita diferença na análise do fato, é anotar onde foi feito esse discurso que disse que “professores doutrinadores” são tão ou mais perigosos que traficantes”: em um ato pró-armas!
Os armamentistas afirmam seu direito de possuir armas para se defenderem de bandidos, atirando, ferindo, matando se necessário. Ora, Eduardo Bolsonaro usou sua fala para identificar quem seriam esses bandidos: traficantes e “professores doutrinadores”, sendo os últimos, segundo sua fala, iguais ou piores que os primeiros.
O crime de incitação é descrito no Código Penal brasileiro como aquele que consiste em incentivar, estimular publicamente que alguém cometa um crime. Apologia, por sua vez, é o ato de fazer a defesa, promover ou incitar a prática de um crime. A jurisprudência dos tribunais tem entendido que a apologia ao crime é de perigo abstrato, significando que não é necessário que haja uma lesão concreta para a sua configuração e ocorre mesmo que o autor não tenha a intenção de cometer o crime.
É evidente que para enquadrar alguém em um como no outro tipo penal se deve avaliar cada caso individualmente, levando em conta o contexto e as circunstâncias envolvidas, para garantir observância do princípio da proporcionalidade e que a liberdade de expressão seja preservada, sem comprometer a segurança jurídica.
É desse modo que não há como analisar a fala do deputado Eduardo Bolsonaro sem inseri-la no contexto de que ele se pronunciou em defesa do uso de armas, em ato específico sobre o tema, fazendo a identificação dos “inimigos perigosos” a serem abatidos. E que sua fala não é de um cidadão qualquer, mas de uma figura pública conhecida e reconhecida, cuja voz tem impacto em amplos setores da sociedade, e que ganha especial destaque diante dos recentes ataques a escolas no Brasil.
Ao identificar e apontar o professor como “inimigo” em um discurso a favor de armas, o deputado direciona a ele o uso da violência letal como defesa de um imaginário “sequestro ideológico” das crianças em prejuízo de suas famílias. É uma legitimação, uma autorização velada para hostilidade, agressão e morte.
Não pode ser tratado como discurso padrão, de conduta normal e tolerável sem questionamento jurídico.
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