É só uma chuvinha
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Rio - Segundo astrólogos, 2022 será regido por Mercúrio.
Graças a Deus! Ninguém aguenta mais Bolsonaro.
O sofrido povo brasileiro vai tirar as últimas horas do ano para tirar as passas do arroz e agradecer a chegada dos últimos 12 meses do pesadelo bolsonarista.
Na verdade, ninguém aguenta mais Bolsonaro. Até o pessoal do Departamento de Recuos e Desmentidos do governo (DRD), está atulhado de trabalho.
Desde que assumiu a presidência, por diversas vezes Bolsonaro ameaçou a democracia, depois recuou, depois ameaçou novamente. Defendeu a ditadura, depois recuou, depois defendeu novamente. Aconselhou remédios sem eficácia, depois recuou, depois defendeu novamente.
Para o DRD, recuar e desmentir as ações e declarações do presidente e sua prole, dá muito trabalho. Tá todo mundo exausto.
Até, pasmem, o próprio presidente.
Bolsonaro pegou o telefone vermelho e chamou o secretário de comunicação da presidência às pressas.
Em menos de dois minutos o secretário já estava na porta do gabinete presidencial:
- Chamou, presidente?
- Chamei, sim. Pega meu jet-ski e manda botar no avião da FAB, taokey?
- Que legal, presidente! O senhor vai ajudar o pessoal da Bahia?
- Que pessoal da Bahia, tá louco? Eu vou tirar férias em Santa Catarina com a primeira-dama.
- O senhor vai passear de moto aquática pelas praias de Santa Catarina enquanto as cidades da Bahia estão alagadas, estradas e pontes estão destruídas, milhares de pessoas ilhadas, desabrigados e dezenas de mortos!?
- Qual o problema nessa ‘cuestão’ daí? Eu estou cansado. E depois isso daí é só uma chuvinha.
O secretário pensou em perguntar: cansado de quê? Mais recuou.
- Não é mole presidir um país como o Brasil, taokey? Eu só aceitei ser presidente porque eu pensei que ia poder dormir durante o trabalho, como eu fazia lá na Câmara dos Deputados. Preciso descansar. Vamos aproveitar que ninguém está falando mais do cheque de R$ 89 mil da Michelle pra gastar ele na praia - continuou o presidente.
- Presidente, a imprensa vai cair de pau no senhor. Já estou até vendo sua foto na praia, nas primeiras páginas dos principais jornais do país, com a hashtag ‘BOLSONARO-VAGABUNDO’.
- E qual o problema nisso daí? Eu não faço demagogia. Todo mundo já sabe como eu sou. Eu não vou enfiar meus chinelos lá na lama da Bahia. Meus seguidores sabem que eu não vou largar minhas férias para desatolar ninguém.
O secretário não quis comentar a fala do presidente e seu ostensivo desprezo pelo povo que governa e pela dor dos outros.
- E depois, eu já mandei um carro cheio de ministros que não estavam fazendo nada por aqui pra cuidar do povo lá. Foi a Damares, foi o Queiroga e outros dois que eu nem conheço direito - concluiu.
- Mas, presidente, seria bom que o senhor como líder máximo da nação estivesse presente. O povo gosta de saber que o presidente se importa com seu povo.
- Outro dia, eu sobrevoei a área de helicóptero. Tá tudo muito molhado. Eu posso pegar uma micose. Você não vai querer que seu presidente pegue uma micose, vai? E depois, se essa imprensa esquerdista me fotografar dentro daquele aguaceiro, vão logo vir com aquela piadinha infame de que bosta não afunda.
O secretário teve que conter o riso.
- Vou fazer o seguinte: chama o Paulo Guedes, vou lançar o programa ‘Bolsa Bote’.
- Bolsa Bote? Como vai ser isso, presidente?
- A idéia é que cada família receba um bote salva-vidas. Assim, diminuem as mortes no Estado e minimizam o trabalho do Corpo de Bombeiros. Mas só para quem tiver cadastrado no programa ‘Auxílio Brasil’, do governo Federal.
- Mas, presidente e quanto as outras famílias?
- Eles que nadem. Baiano tem preguiça até de nadar.
O secretário, irônico, pensou em gritar: mito! mito! Mas se conteve.
- Boa idéia, não é? Depois dessa, eu já posso até entrar com pedido da minha canonização no Vaticano, não posso? - indagou o presidente.
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