Duas palavras sobre três vencedores do Oscar
"No Ritmo do Coração", "Encanto" e "Summer of Soul" levaram as estatuetas de melhor filme, longa de animação e longa documentário, respectivamente.
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O premiado como melhor documentário, Summer of Soul... Ou Quando a Revolução Não Pôde Ser Televisionada, é um grande resgate político e musical. Premiação merecidíssima. Já comentei o filme aqui na coluna.
A seguir, minhas impressões sobre os vencedores de melhor filme e melhor longa de animação. Ambos têm qualidades, mas estão muito abaixo da linha de grandes obras.
No Ritmo do Coração
Filmes europeus refeitos nos EUA são um nicho de mercado razoavelmente consagrado, mas com resultados em geral desapontadores. A reciclagem do amável francês A Família Bélier, intitulada CODA (sigla de Children of Deaf Adults, ou filhos de adultos surdos) e aqui No Ritmo do Coração, foge pouco à regra. A não ser por dois momentos tocantes no último ato e pelas anedotas escatológicas e sexuais atribuídas aos pais de Ruby, o filme da diretora Sian Heder limita-se a seguir um figurino de filme-família.
O original francês, de Eric Lartigau, também era um filme-família, mas se destacava da média pela graça e equilíbrio com que explorava as angústias da adolescência e os dilemas dos deficientes auditivos, sobretudo quando eles não se amofinam diante de suas limitações. Quando fui assisti-lo, em 2015, tinha expectativas muito baixas, que foram amplamente superadas. A Família Bélier não deixava ninguém ir pra casa sem um sorriso na alma e uma lágrima se armando em cada olho.
A refilmagem norte-americana pretende o mesmo, mas patina em lugares-comuns da descoberta do amor, do talento e da autossuficiência comercial, sem falar do bullying como tema onipresente hoje em dia. Ruby (a inglesinha Emilia Jones) é a única ouvinte e falante na família Rossi, que depende dela para vender seu peixe – literalmente, pois são pescadores. Mas Ruby também canta e encanta o professor de música da escola (Eugenio Derbez em performance burlesca). A ida para a faculdade de Música de Berkeley significaria deixar os Rossi sem intérprete. De certa forma, Ruby é uma escrava da família, e este é o ponto mais sensível do argumento.
No filme francês havia as canções anacrônicas de Michel Sardou, que ajudavam a contar a história e davam um charme especial, fora do tempo. Agora temos Joni Mitchel numa interpretação que enfatiza o lado doce de seu sabor doce-amargo.
Claramente superestimado desde a quádrupla premiação em Sundance, No Ritmo do Coração chegou ao Oscar com indicações a melhor filme, roteiro adaptado e ator coadjuvante. Faturou os três, mas o único merecedor, a meu ver, foi o de Troy Kotsur, veterano ator surdo de nascença, que está impagável como o pai desbocado em linguagem de sinais. O trio de atores surdos se completa com Marlee Matlin (premiada com o Oscar por Filhos do Silêncio em 1986) no papel da mãe e Daniel Durant como o irmão.
>> No Ritmo do Coração está na Amazon, Google Play, AppleTV e Looke.>> A Família Bélier está na GloboPlay, Telecine Play, Google Play, AppleTV e Microsoft.
Encanto
Embora já tivesse lido algumas opiniões pouco estimulantes, eu esperava encontrar em Encanto um pouco do que me agradou tanto em Coco, da mesma Disney. Do México para a Colômbia, quem sabe as referências latinas mantivessem a mesma graça e inspiração. Só que não. De colombiano só tem ali o nome do país e o idioma espanhol em uma das canções. Nem um cafezinho, sequer.
Os tais dons possuídos pela família Madrigal parecem mais super-poderes de super-heróis do que pendores relacionados a alguma magia latino-americana. A história está centrada numa espécie de patinho feio, a menina Maribel, vítima de bullying familiar por não ser dotada de nada especial. O roteiro cria soluções atravancadas para levar Maribel à superação e acaba por deixar sérios buracos na compreensão da trama. As canções de Lin-Manuel Miranda são medíocres como sempre (à exceção de Hamilton).
Dito isso, não deixo de recomendar o filme pela excelência da animação. Vale a pena relevar todas as deficiências para apreciar a exuberância das cores, a perfeição nos movimentos de dança, roupas, cabelos e expressões. Isso faz com que, isolados, os ingredientes e os bons momentos compensem um pouco a insipidez do conjunto. Está mesmo na técnica o encanto de Encanto.
O filme está na plataforma Disney Plus.
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